Capítulo 2

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Luana



Por alguns minutos que mais parecem horas, fico segurando meu molho de chaves nas mãos, olhando para elas como se aqueles pequenos objetos pudessem me dar alguma resposta, uma luz talvez, sobre o vazio, a dor e tudo o que estou sentindo.

E assim, fico procrastinando na porta de entrada da minha casa com o olhar perdido, parada fixamente, olhando para a porta antiga de madeira, respiro fundo tentando me acalmar, conto entre inspiração e expiração... Um... Dois... Três...

Meu lar, local onde vivi tantas coisas, me lembro de cada detalhe da minha infância, muito feliz por sinal. Tá certo que eu era uma criança um pouco introvertida de gostos peculiares, e que de quebra sofria muito bullying na escola, mas tinha uma avó que me amava e me deixava sonhar livremente. Ah! Como é bom sonhar sem preocupações. Lembro de cada joelho ralado, de cada tropeção, de cada dedinho do pé enroscado na perna da mesa. Detalhes tão irrelevantes, mas mesmo assim maravilhosos da minha infância.

E agora, como uma garotinha assustada, tenho medo de abrir essa porta e me deparar com a triste realidade da minha atual e completa solidão.

Começo a me perguntar o que uma pessoa normal faria no meu lugar? Tem um normal para isso? Um roteiro a ser seguido, será?

Respiro fundo mais algumas vezes tentando me acalmar para não passar mal mais uma vez.

E enfio a chave no buraco da fechadura girando e abrindo a porta de uma vez como se aquilo pudesse me munir de coragem, mesmo que uma tola coragem! Abro os olhos que nem notei estarem fechados tão apertadamente e vejo o meu lar, uma casa simples. Mas cheia de lembranças alegres de cada momento que passei com uma senhorinha tão louca quanto eu, e tão divertida quanto uma melhor amiga e confidente.

A nossa casa é pequena no andar de baixo, uma pequena sala, um sofá com várias almofadas com capinhas de crochê coloridas, um tapete antigo no chão, uma mesinha de centro, alguns livros espalhados, a xícara do último chá com os óculos ao lado, ainda esperando ser levada para cozinha. Pequenos bibelôs de enfeite no centro da mesinha. Algumas samambaias espalhadas próximas à claridade da janela e um rack com a TV, tudo muito simples, mas aconchegante, pequenos detalhes enfeitam a cabeceira do sofá como toalhinhas de crochê e peças bordadas para todos os lados.

Nas paredes quadros com fotos da minha infância, aniversários e nós duas juntas em algumas brincadeiras ou aventuras. E do lado direito outra salinha que era para ser uma sala de jantar, mais parece uma biblioteca, ao lado esquerdo a porta que dá para cozinha, também bem simples, mas com tudo que nos dá conforto, um fogão, a geladeira, uma pequena mesa de madeira redonda com quatro cadeiras cada uma de uma cor e estilo diferente, mas que parecem que se completam, onde fazíamos nossas refeições. Em cima dela uma fruteira daquelas antigas que parece uma folha e algumas frutas no centro, armários de madeira antigos nas paredes e muitos potinhos com temperos e especiarias de vários tamanhos e formatos para todos os lados em prateleiras diversas, panelas penduradas, colheres de pau, parece até uma cozinha meio de roça, meio antiga, a vovó adorava essas coisas mais rústicas e eu também.

O andar de cima tem dois quartos e o banheiro que dividimos, subo as escadas de madeira da casa me apoiando no corrimão. Sentindo a textura da madeira me lembro de todas às vezes que subi e desci por ela, memórias reproduzidas como flashes aleatórios de uma vida feliz.

Sinto meu corpo pesado como se o cansaço de todos esses dias tivesse despencado de uma vez agora. Minhas pernas como se pesassem uma tonelada cada, sigo arrastada para o meu quarto, não tenho nem coragem de olhar o quarto da minha avó que se encontra fechado, não agora!

O Feitiço da Lua - Degustação Where stories live. Discover now