1. The forth element

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O trânsito estava caótico, como era de se esperar. A qualquer hora do dia Seul parecia uma pequena amostra do inferno para os que precisavam por ali transitar, fosse em veículos ou mesmo a pé. Ninguém tinha paz numa cidade do tamanho e amplitude da capital da Coreia do Sul, um fato conhecido e jamais contestado por seus habitantes.

Sobre as engrenagens de uma moto negra muito cara e de design moderno, Seokjin bufava enquanto se sentia suar inteiro por dentro da roupa especial de pilotagem e do capacete. Não bastasse ter que lutar no caos da selva de pedra pela manhã, ainda tinha que enfrentar o calor que resolveu se abater repentinamente na cidade, contrariando as previsões dos meteorologistas e irritando a todos os que nelas acreditaram — incluindo a si mesmo. No entanto, pensava enquanto as gotas de transpiração inundavam a pele sob as vestes, era preferível dessa maneira do que no passado, quando estava na posse de um automóvel. Gastava menos tempo na direção quando montava em sua motocicleta, e tempo era essencial para Seokjin.

O veículo igualmente preto que agora residia na garagem de seu irmão mais velho lhe garantia conforto, clima ameno e a chance de fazer seus caminhos ao som das suas músicas preferidas, mas Seokjin era do tipo que preferia eficácia e rapidez, então, cerca de dois meses atrás, decidiu vender o automóvel ao seu hyung e, mexendo também em suas economias, juntou recursos e adquiriu a melhor moto que conseguiu achar. E precisava reconhecer que, apesar dos pesares, não se arrependia. Fazia em menos de meia hora o percurso que antes levava quase cinquenta minutos, em tempos de paz no tráfego. O que eram umas gotas de suor em troca da economia de tempo que, em sua profissão, costumava ser algo essencial?

Suado, porém adiantado, Seokjin enfim chegou ao estacionamento do Departamento de Crimes Violentos, onde exercia, há um bom tempo, o cargo de detetive. Não eram muitos os que, aos trinta e três anos de idade, podiam ostentar tal título. Ser promovido a detetive requeria muito tempo de atividade, ou reconhecimento precoce de habilidades, hipótese rara na qual ele se enquadrava. Logicamente, dependendo de para quem se perguntasse, os motivos pelos quais o homem exercia tal cargo mudavam; alguns diziam que tinha sido sorte, outros que, por alguma razão, caíra nas graças dos superiores — e nesse aspecto, as versões iam desde "esposa do patrão apaixonada" até subornos e demais ilicitudes. A verdade, claro, era mais simples e menos novelesca, mas não era ele quem iria tentar esclarecer coisa alguma. Deixava que cada um pensasse como tivesse vontade.

O fato era que Seokjin sempre tinha sido bom em qualquer coisa que se propusesse a fazer, desde muito jovem. Não exatamente por talento ou exagerada inteligência, mas por esforço e dedicação, além de uma bela dose de esperteza. Era claro que ser considerado um homem belo e bem educado poderia ser somado a tais qualidades, contudo, muito embora elas pudessem ter lhe ajudado a subir, jamais o manteriam, per se, no topo. No fim, era a sua capacidade o condutor que o levara ao cargo, e cedo ou tarde isso ficava evidente para os curiosos.

Estacionou a motocicleta na vaga habitual, bem no canto esquerdo da área, próximo à grade que rodeava o prédio. Desligou a moto, retirando o capacete e o colocando no compartimento dentro do assento do veículo. Os cabelos muito negros estavam parcialmente molhados e muito amassados, mas o sujeito não deu importância para o fato. Retirou a roupa especial, revelando, por baixo, calça jeans bem cortada num tom azul escuro e camiseta preta, um pouco maior do que seu tamanho real, de forma que ela ficava folgada e confortável. No pescoço, era possível ver uma fina corrente que terminava por dentro do tecido, impedindo que se visualizasse em que tipo de enfeite o adereço terminava, e nos pés, tênis cinza escuros, de boa aparência e visivelmente nada baratos. Era o visual básico do detetive, e não fazia surpresa a ninguém.

Com tudo devidamente guardado no bagageiro se aprumou melhor, retirando do bolso um pequeno aparelho e o conectando ao fone de ouvido, ligando e apertando o play, sem olhar para o letreiro, que indicava o nome da música que se materializaria dali. Sorriu quando percebeu o que estava tocando. Podia ser pelas lembranças que aquele tipo de música trazia, mas Garbage sempre seria uma das melhores bandas com a qual já tivera contato. O som tinha gosto de macchiato e cheiro de chuva no asfalto, as memórias mais fortes do tempestuoso final da adolescência e início da juventude adulta vividos em Nova Iorque. Jamais seria capaz de escutar aquilo sem se recordar de todas as aventuras, aprendizados e descobertas daqueles anos. O sorriso, contudo, se desfez assim que passou a caminhar em direção à entrada do prédio. Não era um comportamento forçado, mas plenamente natural. Poucas coisas o faziam sorrir, e o sorriso vinha por míseros segundos, quase sempre incompletos. Tal característica não se dava por ser amargo ou sisudo, mas por mera questão de personalidade. A seriedade lhe era o tom comum, e não havia nada que pudesse fazer quanto a isso.

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