Capítulo 2

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 — Então, você é o meu pai? — Luísa perguntou depois que ocupavam uma das mesas pequenas do lugar, com os olhos azuis fixos no homem à sua frente

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 — Então, você é o meu pai? — Luísa perguntou depois que ocupavam uma das mesas pequenas do lugar, com os olhos azuis fixos no homem à sua frente. Reparou que os olhos dele não eram azuis, como os dela. Eram castanhos claros, do mesmo tom do bigode grosso acima da boca fina.

— E você é minha filha — Zé respondeu e notou que havia uma timidez no modo que a olhava, que falava com ela. Parecia envergonhado e deveria estar, afinal, diante dele estava a filha que tinha deixado na adoção. — Fiquei muito surpreso com a ligação, pensei que não ia querer conhecer o pai que a abandonou.

Antes que Luísa pudesse responder, Thiago se aproximou da mesa com a bandeja de queijos e com o vinho.

— Trouxe o vinho que ambos irão apoiá-los, conheço o gosto do seu Zé — sorriu para o homem que entendia tudo sobre o plantio de vinhas. E começou a servi-los.

— Você está servindo a mesa hoje? — Zé perguntou.

— Marisa teve um imprevisto e logo estará aqui — Thiago respondeu e virou-se para Luísa. — Então você é a filha do especialista em plantio das terras Bodini?

Ela deu de ombros.

— Parece que sim.

— Fiquem a vontade, então. Se precisarem alguma coisa é só chamar.

Luísa esperou o garçom se afastar para espetar um quadradinho de queijo, sentindo o olhar do pai sobre ela. Ele ainda estava esperando por sua resposta.

— Eu fiquei no orfanato até os dezoito anos — começou, e esperou que o olhar dele se encontrasse com o seu para continuar. — Teve pessoas interessadas querendo me adotar, mas eu nunca me adaptava, até que me convenci que não precisava de pais. E até poucos anos atrás, eu ainda acreditava que não precisava conhecer as pessoas que me abandonaram.

— E foi por isso que me ligou? Para me conhecer?

Sentindo a boca seca pelo nervosismo, bebeu um pouco de vinho.

— Fiquei em dúvida no começo, pensei que você talvez não quisesse me conhecer. Mas, como deixou todos os seus contatos no orfanato e pelo que a diretora de lá me informou, você parecia a aberto a me receber no futuro.

O olhar dele pareceu mais calmo, menos inseguro quando a olhou.

— E você estava certa. Pode não acreditar, Luísa, mas deixá-la naquele orfanato foi a coisa mais difícil que fiz em toda a minha vida.

— Bem — ela tentou sorrir — sei que compreende como tudo isso que acabou de dizer é um pouco contraditório. Desculpa por não conseguir acreditar.

Zé abaixou os olhos, em direção às próprias mãos.

— Eu no seu lugar também não acreditaria — respirou fundo e voltou a olhá-la. — Mas, você está aqui e eu queria...

— O quê? — perguntou quando ele deixou o voz morrer, inseguro novamente, perdido em pensamentos e anseios.

— Quanto tempo pretende ficar em Blumenau?

Luísa franziu o cenho, surpresa com a pergunta abrupta.

— Bem, não sei ainda.

— Então fique por um mês pelo menos. Nunca imaginei que minha filha, algum dia, entraria em contato comigo. Foi por isso que deixei meus dados no orfanato, Luísa. Pensei que quando você tivesse idade para entender as coisas, queria deixar claro que estava pronto para recebê-la.

Olhou bem para ele. Parecia muito sincero, honesto com ela e isso a deixou muito confusa.

— Eu não entendo. Não consigo entender.

— É por isso que estou pedindo para que fique. — Pediu ele. — Para compreender.

— Não pode simplesmente me contar?

Ele balançou a cabeça.

— Tem coisas que precisam de tempo certo para serem contadas. Se quiser, tenho um quarto vazio na minha casa. É bem-vinda lá.

Luísa estava surpresa com ele. Inicialmente, sua intenção era conhecer o homem que deveria ter sido seu pai e entender porque a tinha abandonado; nunca pensou que ele poderia oferecer uma segunda chance para eles. Para se conhecerem. Será que era isso que queria? Conhecer o pai não somente para conhecer sobre o passado, mas para também poder sonhar com um futuro?

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Thiago sempre fora curioso em relação às pessoas, gostava de imaginar que vida elas levavam, que segredos poderiam guardar e ali, detrás do balcão, observava a conversa de Luísa e seu Zé. O homem trabalhou a vida inteira nas terras Bodini, desde que ele e o irmão eram dois moleques que viviam correndo pelas vinhas; e mesmo assim, não sabia muito sobre a vida do homem que a família respeitava.

Nunca passou pela sua cabeça que ele poderia ter uma filha, nem sequer sonhou que pudesse ser casado, ou que tivesse sido. E pela tensão da linguagem corporal deles, soube que ele não criou a filha.

Luísa. O nome dela ecoou em sua mente como um feitiço. O sotaque paulistano dela era uma forte indicação que não foi criada em Blumenau e isso o deixava ainda mais curioso para saber qual era a relação dos dois. E também o deixava curioso para conhecê-la. De costas para ele, deliciou-se com a visão dos cabelos castanhos que caiam em ondas suaves pelas costas pequenas, que emolduravam um rosto delicado e sedutor. Do tipo de rosto que fazia um homem memorizar cada traço, cada expressão simplesmente pelo fascínio de desvendar os segredos contidos nas feições.

Seu olhar desviou-se das costas dela quando viu um movimento na porta da loja, estava pronto para encontrar a figura da Marisa, uma moça que o ajudava ali, quando percebeu que a figura estava longe de ser uma mulher. E ao reconhecer, um sorriso alargou em seu rosto.

— Quem é vivo sempre aparece, não é meu irmão?

	— Quem é vivo sempre aparece, não é meu irmão?

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Aquarela de Sabores (Série Bodini) | DEGUSTAÇÃO Where stories live. Discover now