Epílogo

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O único barulho que preenchia o local era o leve som de sucção. Até mesmo a respiração dos três parecia imperceptível enquanto se mantinham naquela tênue névoa familiar, uma cobertura que os abraçava cheia de amor, paz e felicidade. Nenhum dos dois acreditou, no passado, que teriam algo assim.

Nestha olhou pelo quarto, observando todos os itens de decorações e fotos de viagens. Ali estava um pedacinho de cada canto que conheceram, e não foram poucos esses lugares. Em todas as férias que Nestha tinha da academia, e posteriormente da sua escola de dança, os dois viajavam. Foi assim durante quatro anos, e teria continuado se não fosse por um pequeno contratempo.

O rosto feminino virou para baixo, observando o embrulhinho pequeno, nascido com três quilos e meio e sessenta e dois centímetros, que era o contratempo. Ela não tinha um mês ainda, mas segurava seu seio como se sua curta vida dependesse disso, a mão minúscula pousada no colo da mãe.

Eles estavam vivendo nesse pequeno casulo desde o nascimento dela. A bateria social de Nestha estava esgotada e ela gostava de passar seu tempo conhecendo sua filha, aquele serzinho tão delicado que ela e Cassian haviam feito.

Ao contrário do que teria acreditado, seu marido estava igual, expulsando qualquer um que passasse mais de meia hora na casa. Ele tinha esse lado ganancioso, e agora queria Nestha e sua filha só para si. Suas duas meninas.

Por consequências, as viagens desse ano seriam adiadas até Clarissa ter idade o suficiente para poder passear junto com os pais. E tudo bem, eles poderiam esperar, afinal, a maior espera já tinha sido superada. Nestha aguardou nove longos meses, ansiosa desde o dia em que havia visto aqueles dois risquinhos no teste de gravidez.

Era engraçado recordar aquele dia. Seu plano era contar para Cassian de alguma forma criativa, caso fosse positivo, mas a surpresa e ansiedade fizeram com que ela saísse do banheiro chorando, correndo até o quarto para se embolar no colo do marido.

Quando ele reparou e entendeu o que acontecia, seus olhos castanhos se arregalaram como se estivesse vendo o sol pela primeira vez.

— Nós vamos ter um bebê, Cass — sorriu entre as lágrimas, e ele somente se jogou sobre ela.

Cassian beijou sua testa, a ponta do nariz, lábios, bochechas e o queixo, descendo até a barriga ainda lisa.

— Calma — puxou ele para cima — Ele ou ela ainda é só uma coisinha pequena e estranha dentro de mim.

O homem respondeu com um sorriso brilhante, tão cheio de luz quanto seus olhos e também o coração deles. Se soltou das mãos de Nestha, voltando de novo para a barriga dela, seus dedos roçando a região.

— Eu já te amo, coisinha pequena e estranha.

E ele amou, desde o primeiro momento, com toda a intensidade que podia. Cassian nunca superou a forma como havia sido concebido, tendo sido forçado em sua mãe por uma pessoa vil e cruel. Esse era ele, nascido da violência, sem um pai, porque o seu era um monstro, sendo jogado nos colos de uma pessoa que não merecia aquele sofrimento.

Por algum motivo, ela conseguiu o amar, e Cassian retribuiu da melhor forma que uma criança poderia retribuir. Quando a perdeu tão novo, um pouco do seu mundo desmoronou. Foram anos carregando o medo de ser alguém como o pai e lidando com a falta eterna da mãe, mas ele sobreviveu, seguiu em frente e construiu uma rede de apoio e amor.

Agora construía também uma família, a última coisa que almejava e a que acreditava piamente que não teria. Ao fim, aquele garotinho havia ganhado tanto.

Tinha Nestha e, pelos céus, isso seria suficiente pelas próximas mil vidas. Ter aquela mulher, a que amava com tanta força e desejo, era realmente tudo, o ápice da vida de alguém nascido como um bastardo qualquer. Porque não, não era o dinheiro que o fazia ter o sucesso, embora ele nunca fosse hipócrita de se desfazer dele.

Call me by NesWhere stories live. Discover now