Capítulo I

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Desconhecido: Falo, mas não tenho boca. Eu ouço, mas não tenho ouvidos. Não tenho corpo, mas vivo com o vento. Quem sou eu?

A mensagem chegou como um arrepio inquietante na minha caixa de entrada, e eu franzi a testa ao lê-la. Não fazia ideia de quem estava por trás dessas palavras enigmáticas, mas elas haviam se tornado uma presença constante desde que a freira Deby me convocou para sua sombria sala e anunciou que minha partida estava se aproximando.

As mensagens começaram a aparecer quando completei quinze anos e recebi um celular de presente dos meus avós maternos, dois anos após minha chegada ao internato sombrio. Inicialmente, eram ocorrências esporádicas, acontecendo apenas uma ou duas vezes por ano, sempre em datas específicas: meu aniversário ou o aniversário da minha entrada no internato. Mas agora, um mês e meio depois de receber a notícia de que meu tempo no internato estava se esgotando, as mensagens do número desconhecido não paravam de chegar.

Todos os dias, durante as horas mais obscuras da madrugada ou no crepúsculo, o número misterioso me inundava com mensagens confusas e charadas sem sentido. Até então, eu havia resistido a qualquer tentativa de desvendar esse enigma, recusando-me a cair na teia do desconhecido que parecia obsedado por minha existência. No entanto, uma sensação sinistra de inevitabilidade começava a me envolver, enquanto eu mergulhava cada vez mais fundo no perturbador jogo de adivinhações que ele propunha.

Meus dedos martelaram a tela do celular enquanto eu digitava uma resposta repleta de frustração. Eu não estava no meu melhor estado de espírito. Minhas malas já haviam sido cruelmente depositadas do lado de fora dos dormitórios das meninas, onde aguardavam como testemunhas silenciosas do meu infortúnio. No pátio, a freira Deby segurava gentilmente a mão de uma mulher magra com cabelos tão vermelhos quanto o carmesim de um pecado.

Eu: Não enche!

— Tenho certeza de que Erin vai adorar a casa de campo. Nos verões, costumamos fazer viagens para o litoral também — A freira Deby sorri, seu sorriso aparentemente amigável não se estendendo aos olhos. Ela não parecia feliz em me entregar a esse casal, e eu compartilhava desse desconforto. Observando-os da minha perspectiva, nada neles levantava suspeitas alarmantes. Minha tia não me entregaria se houvesse qualquer indício de perigo. No entanto, eles eram estranhamente comuns, como uma típica família de comerciais de televisão. Essa normalidade me intrigava profundamente.

— Certamente. — Freira Deby acariciou meus cabelos com graça, afastando uma mecha indomável que se insurgia contra a ordem. — Vamos, minha querida. — Ela se voltou para mim com um sorriso pálido nos lábios. Eu sentia a melancolia envolver-me, a saudade já se fazia presente. — Sua tia partirá para uma longa viagem de carro; aproveite o esplendor deste dia ensolarado. — Meus olhos se elevaram na direção do céu sem nuvens, onde o sol resplandecia com suavidade. A temperatura amena, por volta dos vinte e dois graus, delineava uma primavera gloriosa. — É lamentável que não haverá bolo de aniversário neste ano. — Observei a umidade que se acumulava nos olhos dela, um elo silencioso de despedida.

O celular vibrou com suavidade na minha mão, anunciando a chegada de uma nova mensagem, uma resposta talvez inesperada. Perguntei-me se o remetente ficara surpreso pelo fato de eu finalmente decidir responder. Desde que compreendera que o número desconhecido me enviava mensagens zombando de mim, optara por ignorá-lo. Não parecia valer o esforço. Eu considerara, por um momento, que poderia ser uma brincadeira de alguma garota do internato, afinal, estas eram as únicas pessoas que eu conhecia, dado o meu isolamento do mundo exterior.

Desconhecido: Você é tão petulante, isso me excita.

A freira Deby me conduziu com delicadeza em direção ao carro de minha tia paterna, Meg. A semelhança entre ela e meu pai era notável: os mesmos olhos verdes reluzentes e o cabelo avermelhado, embora o dela estivesse tingido em um tom mais vibrante, em uma tentativa de disfarçar sua verdadeira idade. Meg e meu pai eram gêmeos, e, pelo que eu me lembrava, meu pai estava prestes a completar quarenta e cinco anos. Naquele momento, me questionei se, ao atingir a mesma idade, eu me assemelharia a eles, considerando que sou extraordinariamente parecida com meu pai.

Born to DieWhere stories live. Discover now