①①

232 31 225
                                    

A claridade da fogueira ficou para trás rapidamente. Aquele ponto da floresta estava submerso na mais densa escuridão. Eu podia imaginar a lua sendo encoberta pela copa das árvores. Até o vento parecia parado ali.

Tateei no escuro, esbarrando a mão nos troncos ásperos. O pânico dentro de mim gritava para que eu corresse, mas eu não fazia ideia de onde estava. Ainda conseguia ouvir o barulho das pessoas, mas não via uma saída.

E foi aí que veio o golpe.

Eu ouvi o som do tapa antes de senti-lo, porém, quando senti, não pude conter o grito. Caí com tudo no chão. O cascalho seco se quebrava sob o meu peso. A minha bochecha queimava, sangue escorria pelo canto do meu lábio inferior.

— A bruxa tem que morrer!

Isso de novo?

Arrastei-me pelo chão, fugindo de sei lá o quê, sem fazer ideia de onde estava vindo. Era impossível se defender quando não há um adversário palpável. Ele parecia mero vislumbre da minha imaginação.

— A bruxa tem que morrer! — Esbravejou novamente.

O sonho — pesadelo — do outro dia voltou com força total. Eu tinha perfeita consciência agora de que estava acordada. Não era um delírio. Aquela coisa estava mesmo ali, e esteve também na biblioteca...

— Merda! — Guinchei quando esbarrei em algo gelado. Seja lá o que fosse, começou a escorregar pelo meu braço, enroscando-se rápido demais ao redor dos meus ossos. — Não! Não!

Mal tive tempo de processar o que acontecia e fui agarrada pelos cabelos. Fiquei de pé na marra. Passos pesados cresciam atrás de mim e logo fui prensada contra um tronco. Uma mão de dedos gélidos apalpou o meu braço, arrancando dele aquilo que tentava — também — me ferir.

De relance, percebi o que era, ou acho que percebi... era uma cobra. O que não seria nada perto do que estava por vim. Talvez eu até quisesse que ela fizesse seu trabalho de uma vez.

Ao menos eu sabia que ela faria aquilo porque era de sua natureza. Ao contrário disso que me perseguia. Essa coisa que vivia nas sombras, sem rosto, sem corpo, mas que me prendia e falava coisas sem sentido. Uma presença que não era exatamente uma presença.

— A bruxa tem que morrer!

— POR QUÊ?! — O grito escapou de mim antes que eu pudesse me deter. O medo começava a se misturar à raiva. — O QUE VOCÊ QUER COMIGO? QUEM É VOCÊ?!

A minha resposta veio em forma de outra bofetada. Mas desta vez ele não me deixou cair. Fui empurrada com mais força contra a arvore. A parte de dentro da minha boca raspou nos dentes por causa do impacto brutal, logo o sangue começou a escorrer mais rápido, mais espesso, de um jeito alarmante.

— A bruxa tem que morrer! — Repetiu, suas mãos logo estavam na minha garganta, apertando-a, apertando-a, apertando-a....

Fechei os olhos e voltei a abrir. O ar não subia, meus pulmões reclamaram, ardendo. Parte do meu corpo esmoreceu, sem forças. Mas a minha mente não parava, negava-se a se entregar.

Juntei o que ainda tinha de forças e dobrei o joelho. Eu não sabia o que era aquilo, mas acertei uma joelhada; firme e potente. Fui solta abruptamente e cambaleei, prendendo os pés nas raízes altas.

Mesmo desequilibrada, comecei a correr.

Eu não queria olhar por cima dos ombros e constatar que a coisa estava atrás de mim, não precisava de mais uma dose de pavor. Eu já estava em overdose de medo. O desespero se dissolvia nas minhas veias, ameaçando me enlouquecer. Gritar parecia uma opção, mas a minha garganta ardia. Ainda era difícil respirar.

O Príncipe LoboWhere stories live. Discover now