Pé esquerdo

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— Tá tudo bem aí? — Uma voz, medrosa e fina, ecoou entre as paredes sujas e velhas do que sobrou de um laboratório abandonado; o lugar perfeito para uma criança explorar. A cabeleira loira espetada, junto a um par de olhos azuis cintilantes, era um intruso na paisagem cinzenta e quase morta ao seu redor.

Ingênuo e completamente apavorado, o garoto se viu caminhando a passos curtos que eram sustentados por pernas trêmulas que, apenas a favor da sua curiosidade, se moviam para frente, o aproximando cada vez mais de uma silhueta desconhecida. Definitivamente não esperava encontrar alguém vivo no meio de tantos destroços, mas também torcia para que não topasse com um defunto.

Lentamente a silhueta foi tomando a forma de uma garota, com longos cabelos brancos que quase tocavam o chão, o que dava um nó de confusão na cabeça do intruso que comparava o rosto jovem com as roupas antigas. Afinal, ela era velha ou não? Quanto tempo ela passou presa ali?

Aquele rosto sereno, enquanto parecia apenas dormir em paz, seduz o garoto e o traz mais confiança para tocar na cápsula de vidro que a cercava, a fim de descobrir se ela estava viva ou não.

O toque daquelas pequenas mãos criou uma corrente de chakra carmesim que se moldou na cauda de uma raposa e envolveu o corpo dela como fogo, queimando sem chamas por dentro, até quase romper a barreira da pele. Os olhos azuis, que estavam arregalados em pânico, acompanharam de forma hipnotizada o fino tecido da pele ficar cada vez mais transparente, deixando todos os vasos sanguíneos à mostra.

Todas aquelas ramificações transpassadas eram como as raízes de uma árvore que levavam a mistura dos líquidos azuis e vermelhos pelo corpo dela; o sangue e o chakra. O chakra que correu das pontas dos pés até o último fio de cabelo devolveu a ela o sopro da vida e ressaltou ainda mais a sua juventude.

O branco sem vida deu lugar a uma paleta de cores escuras. A mais bonita era a que estava entrelaçada nos seus fios de cabelo: o preto. Era um tom mais frio e intenso do que o céu da noite.

Assim que a última mecha escureceu, os vidros que cercavam a garota explodiram. Para se defender, a criança se abaixou no chão e cobriu a cabeça. Dos seus pensamentos deixava escapar sussurros de preces desesperadas, desejando do fundo do coração acordar de um sonho.

Ao levantar a cabeça, completamente em choque, reagiu a tempo de amparar a garota quando ela caiu, ainda desacordada, mas o leve levantar do seu peito comprova que estava viva, respirando fracamente.

A clara diferença de altura foi sentida pela criança que sustentava em seus braços alguém com o dobro do seu tamanho. Era clara a diferença de idade entre eles. Enquanto a jovem moça teria por volta dos seus 15 anos, o pequeno loiro tinha apenas 5.

Tomando alguns minutos preciosos para sua sobrevivência, o garoto se dedicou a admirá-la; perdeu-se no contraste do mundo cruel em que viviam e na beleza misteriosa, porém mansa, que tinha nos braços. O rosto aristocrático, era suavizado pelas feições delicadas e femininas, a pele pálida decorada pelos olhos com longos cílios grossos, o nariz reto e fino e os lábios finos e bem marcados.  

Em contrapartida, as coisas ao redor deles não estavam nem um pouco bonitas. Alguns tremores pelo chão se garantiam de lembrar ao intruso que eles estavam em perigo e completamente indefesos.

A explosão da cápsula fez com que a estrutura velha fosse se desmanchando, desaparecendo com o pouco que o tempo deixou.

Congelando o seu olhar no teto de onde vários estilhaços começavam a cair em sua direção, o garoto não conseguia se mover, mesmo pressionando todos os seus músculos. Tentava apelar para o otimismo irracional, mas o que se sobressaia a todas as tentativas era o medo real e coerente da morte. Não tinha nada que ele pudesse fazer.

Amor estilo UchihaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora