01. STANFORD

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O dia amanheceu em Dark Town, como sempre o clima agradável, vizinhos amigáveis, pássaros cantando, os jornais sendo entregues pelo jornaleiro pedalando sua bicicleta pelas ruas da cidade. As casas construídas uma ao lado da outra, enfileiradas perfeitamente, com suas paredes pintadas de cores pastel, suas cercas de madeira, belos jardins com as mais belas flores, o cheiro de grama sendo cortada, o ar tinha aquele frescor de cidade pequena, sem tanta poluição como nas cidades grandes, trabalhadores com seus carros indo tranquilamente para o seu trabalho sem se preocupar em sair mais cedo por causa do trânsito. As ruas calmas, pareciam aqueles bairros de condomínio fechado — claro que não era assim na parte de classe baixa da cidade —, tudo era bonito demais, perfeito demais, inacreditável demais. Porém, o que esperar da cidade perfeita? Tudo tinha que ser perfeito. 

Entre aquelas belas casas, morava o xerife com sua família. Ellie McCanny, filha adorada e Katherine, esposa fiel, amada e dedicada à família. Aquele tipo de casa de dar inveja, com um esplêndido jardim, um balanço sustentado por correntes envernizado e brilhoso, envolto de um cercado de madeira branco, a varanda feita de madeira, vasos nas janelas — orquídeas, para ser mais específica. A porta de entrada pintada de branco para combinar com as cercas, tão limpa que dava para lamber sem sentir-se enojado. 

O relógio marcou sete horas e o alarme tocou. Um som absurdamente alto e irritante para os ouvidos. Ellie cobriu a cabeça com o lençol tentando amenizar o som estridente e agudo, só queria dormir por mais uns dez minutos, ou talvez quinze. Mas aquele barulho era incômodo demais. Tirou apenas um braço para fora do seu cobertor e tentou desligá-lo, como uma caça às cegas para encontrar o objeto. Finalmente o acertou em cheio. Jogou o lençol para o lado e olhando para o teto suspirou com insatisfação. "Bom dia, está preparada para mais um dia incrivelmente chato, nesta cidade incrivelmente entediante?", pensou. Estava cansada da rotina de sempre, acordar, estudar, ter que demonstrar afeto e interesse no seu relacionamento, e voltar para dormir de novo. Tudo era monótono demais. Enquanto uns diziam "Nós temos a cidade perfeita", ela só pensava "Chaaaaato", revirando os olhos. 

Ellie McCanny, 17 anos, terminando o ensino médio. Filha perfeita, com pais perfeitamente casados. Eram 20 anos de casamento, que orgulho ela tinha dos pais. Aguentar alguém tanto tempo assim era algo admirável. Queria ter um futuro igual ao lado do seu namorado — claro que bem longe de sua cidade natal. Seu foco era Stanford, a tão sonhada universidade. Há meses que Ellie esperava respostas sobre uma bolsa de estudos. Desde muito nova sonhava em cursar artes, e que lugar seria melhor? Mesmo que seu pai tivesse um bom emprego na cidade e recebesse um salário consideravelmente bom, não teria como arcar com todas as despesas de estudar em um lugar assim. Era uma boa aluna, aquele tipo de aluna que sempre sabe a resposta de tudo, pensou no início que ia ser fácil, como tirar doce de criança, mas se enganou, e estava começando a perder as esperanças. 

Ellie finalmente levantou da cama, tomou um banho rápido, colocou uma roupa confortável, um vestido tamanho médio, nada muito curto, branco, estampado com margaridas, uma jaqueta jeans por cima e coturno nos pés. Em seguida sentou em frente a penteadeira escovando seus cabelos castanhos, ondulados e medianos, dividiu ao meio deixando solto. Depois passou uma maquiagem básica, rímel nos seus cílios volumosos, destacando os belos olhos arredondados castanhos chocolate, em seus lábios carnudos e rosados um gloss nada extravagante. Simples e linda, não precisava de muito. 

Após se arrumar saiu do seu quarto, e de longe já podia sentir o cheiro de ovos, bacon, café e... panquecas? Enquanto descia a escada podia ouvir a conversa dos seus pais, estavam rindo e falando sobre algo engraçado que aconteceu na infância ou recentemente, sempre era assim. Às vezes não tinham motivos para tanta felicidade, eles simplesmente só eram felizes. Isso bastava. Katherine preparava panquecas, com a frigideira em cima do fogão, o cheiro da massa recém-preparada ficando no ponto certo para comer. Charlie lendo o jornal, mesmo que tivesse a internet a sua disposição, odiava eletrônicos, tinha apenas um celular antigo para ligações. Gostava de sentir o cheiro do papel, a sensação de molhar a ponta dos dedos com saliva e virar a página, as imagens que mesmo não sendo iguais como a tela de um celular dava para entender tranquilamente, e claro sempre uma notícia sensacionalista que o fazia questionar onde o mundo ia parar.  

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