Capítulo 12

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A chuva trilhando pequenos rios nas janelas de Ken. Sempre gostara de fechar os olhos e deixar-se levar pelo som das gotas cristalinas ou, simplesmente, observar as gotinhas a deslizarem pelo vidro. Os seus pensamentos eram uma miscelânea de emoções confusas. Estava preparado para deixar o passado para trás, mas não podia negar o que o seu coração lhe dizia.
E agora? Estava tão perdido. Não podia ser egoísta, tinha de deixar de pensar só em si. Não podia privá-lo de ser feliz também. Afinal, era ele que o estava a salvá-lo.

Pensou em Mark e sorriu. Tinha sorte em tê-lo na sua vida. Tinha sorte com todos os seus amigos, mas o loiro era especial. Afinal, era o seu melhor amigo. Sempre queria ter tido um irmão como Mark. Por vezes, bastava um olhar para perceberem o que sentiam. Qualquer que fosse a sua decisão, sabia que teria sempre o seu apoio.

Conseguia ouvir passos no quarto de hóspedes. O seu tio andava atarefado a preparar os últimos preparativos para a viagem. Troteava a típica canção de cowboys animado.

Observou o seu corpo. Apesar de toda a tortura conseguira ganhar algum peso e tinha uma forma arredondada pouco perceptível na sua barriga. Arrepiou-se quando pousou a sua mão em contato com a pele quente. Suspirou.
Puxou os lençóis para cima quando a porta do seu quarto foi aberta com violência. O seu tio tinha um sorriso estranho a emoldurar os lábios. Ken teve um mau pressentimento.

James sorria cada vez mais enquanto avançava para Ken. Tentou sorrir amorosamente para o sobrinho. Sentou-se na cama e pousou uma mão por cima do lençol. Observou as reações de Ken. O outro respirava pesadamente e estava tenso com o que poderia acontecer. Abriu ainda mais o seu sorriso velhaco.

Ken conseguia sentir o seu estômago revirar-se, mas desta vez por motivos diferentes. Estava entorpecido e enojado. Sentiu uma das mãos a mover-se para o meio das suas pernas cobertas pelo lençol e repousar na sua perna esquerda, afagando-a.

- Levanta-te, preciso da tua ajuda na casa de banho. - James piscou-lhe o olho e levantou-se. - Vem, Kenneth!

- Ninguém me chama assim!

- Mas eu chamo! Gosto de ser diferente. Agora importas-te de me seguir?

Ken continuava a olhá-lo desconfiado. Este comportamento do tio era muito estranho e estava receoso das reais intenções do seu tio.

- Importas-te de te levantar da cama? Eu não vou fazer nada que Big já tinha feito. Sou demasiado bom para ficar com os restos dos outros e, para além disso, nem mulher e nem homem és!

Ken abaixou a cabeça. Sentia-se um lixo e sentia-se usado. Se Big o amava tanto, então porque não estava aqui para defendê-lo? No fundo, sempre soube a resposta. Big nunca o amara. Ele só não queria acreditar nisso. Nunca fora bom o suficiente para a pessoa que amava.

James seguia-o com o olhar. Um sorriso velhaco emoldurava os seus lábios gretados. Não podia ser bom. Ken fechou os olhos rezando para que tudo não passasse de um mal entendido. Sabia que toda a casa tinha câmaras escondidas. Mas qual seria a probabilidade de alguém estar a visualizar as câmaras naquele momento?

O seu coração batia descompassado assim que adentrou na casa de banho. Os passos pesados das típicas botas de cowboy martelavam nos seus ouvidos e parecia-lhe que estava a ser seguido por um carrasco.

Estagnou no meio do tapete. Não percebeu o que estava errado. Estava tudo em ordem, porém sentia a ânsia de fugir crescer dentro de si e o pânico começara a instalar-se. James fechou a porta à chave e arrastou um pequeno fogão a gás.

Ken recuou e escorregou num pequeno sabanete batendo com a cabeça no tampo da sanita. James riu diabolicamente e puxou-lhe o cabelo com força.

- É isto que ganhas por ires ter com o teu amante e fizeres queixinhas como um covarde que és!

Ken respirava pesadamente e tentava proteger a pequena saliência na barriga. Tudo o que estava à sua volta rodopiava e tentava a todo o custo não vomitar para cima do tio.

- Ele não é meu amante...

- SILÊNCIO! QUEM FALA AQUI SOU EU! - berrou-lhe perto do seu rosto e esbofeteou de seguida.
Ken não conseguia aguentar mais. Chorava e chorava compulsivamente e era-lhe difícil controlar os soluços.

- Por favor, pára... Eu faço tudo o que tu quiseres mas não me faças mais isto. Eu imploro-te!

Ken levantou os braços com dificuldade e agarrou os ombros do seu tio. Precisava de apelar ao coração de James. Alguma coisa de bom ele teria de ter.

- Eu sou teu sobrinho... Somos família. Lembras-te? Porque me odeias tanto? Porquê? Desde pequeno, que me ignoravas e quando não o fazias, gritavas comigo. Sempre foste tão amável com os meus primos, mas comigo... Porquê?

- Porque era eu que deveria de ter casado com ela! Era mim que ela amava! Deveria de ser eu, percebeste?

James levantou-se bruscamente. Começou a andar em círculos enquanto puxava o seu cabelo para trás. Ao ver o tio assim, sentiu pena dele. Afinal, não eram parecidos? Estavam os dois corroídos por más escolhas e por mágoas do passado. Despedaçados por amores fracassados.

Ken perguntava se num futuro distante, também seria amargo como James. Todavia, sabia que tinha um motivo para mudar. Naquele momento, era imperceptível, uma pequena semente como as das histórias que os seus pais lhe contavam ao deitar, mas para si, tinha um significado gigantesco.

- Ele sempre fora o preferido! Era sempre tudo para o teu pai. Sabes o que é passar horas e horas debaixo de chuva a trabalhar no campo? Muitas vezes, para mim, nem direito a um prato de sopa tinha. - disse chorando e abanando a cabeça.
- Se eu queria brinquedos, tinha de ser eu a fazê-los enquanto que para o teu pai eles utilizavam as poupanças para comprá-los! Foi sempre tudo para ele e para os outros. Eu não passava de uma aberração, de um erro!

Apertou as bochechas do sobrinho com força forçando a encará-lo.

- Então ele roubou-me a mulher que eu amava, que era minha por direito!

De seguida, levantou o tampo da sanita e forçou Ken contra a água no fundo da sanita. Ken tentou agarrar-se contra o vaso, mas as suas mãos escorregaram. Gritava enquanto esperneava tentando se libertar.

James oprimia-o ainda mais e torcia-lhe o braço atrás das costas enquanto empurrava-o ainda mais contra a água. Os seus sentidos ficaram entorpecidos quando o autoclismo foi puxado e viu pontinhos escuros aparecerem no fundo branco até tudo escurecer.


BigKen - Depois da traiçãoWhere stories live. Discover now