Capítulo 03

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Sarah Lee


Caminho para fora do cinema com as pernas indecisas, oscilando entre parecerem desconfortavelmente rígidas e descontroladamente moles.

Quero matar Theo, quero dizimar sua raça da face da terra. Quero apagar o calor de seu corpo contra o meu porque o mundo pode acabar no dia que eu admitir em voz alta que Theo é um filho da puta gostoso do caralho.

Engulo o pensamento atravessado, porque meu pai me mataria se soubesse que xingo dessa maneira, mesmo que seja, normalmente, só dentro da minha cabeça, e me irrita que Theo consiga se infiltrar nessa camada tão pessoal minha.

Só quando ouço a voz de Malu percebo que prendi a respiração desde que me levantei do colo de Theo e marchei para longe dele, sem nunca inspirar outra vez.

Diminuo o ritmo da caminhada para não parecer que estou em fuga e não controlo meus ouvidos atentos. Malu discute com quem suponho que seja sua mãe por algo que deu errado com o buffet da festa.

Ela caminha impaciente de um lado para o outro e quando me vê corre em minha direção.

— Preciso de ajuda — sussurra para mim e faz uma careta para o celular, ainda que seja uma ligação tradicional sem vídeo.

Não tenho tempo de pensar, Malu enfia o aparelho em minha orelha e sou obrigada a ouvir o sermão que sequer é direcionado a mim.

— Oi Rosa, tudo bem? — cumprimento constrangida, forçando a mãe de Malu a se calar quando reconhece minha voz.

— Oi Sarah, falei pra ela que não precisava envolver você na história, eu vou resolver.

— Mas já que eu tô aqui, o que foi que aconteceu?

Ela geme contrariada e finalmente me explica que o buffet está insistindo na contratação de pelo menos três serviços que Rosa não tem interesse em contratar porque já pesquisou outros mais baratos.

— Isso é fácil de resolver — sorrio cansada, imaginando que os meus problemas poderiam ser igualmente fáceis. — O IDEC já reconhece que venda casada é abusiva, tá no inciso I, artigo 39 do código de defesa do consumidor.

Malu me olha com olhos brilhantes e um sorriso orgulhoso, às vezes me questiono se é certo gostar ainda mais dela só porque frequentemente ela faz eu me sentir ainda mais inteligente com coisas que a essa altura me são irrisórias.

Oriento a mãe dela a como garantir seus direitos e ela encerra a ligação mais relaxada.

— Como cê sabe até número de artigo? Parece um desperdício não fazer faculdade de direito.

Faço o sinal da cruz, lhe arrancando uma risada. De todas as maneiras que meu pai poderia determinar o meu futuro, não me colocar para ser advogada é a prova de amor que eu precisava para sobreviver.

Não é como se Relações Públicas fosse o meu sonho. Bem longe disso, na verdade, mas desde que me entendo por gente fui treinada para servir o mundo corporativo de Sérgio Lee. E cuidar da minha imagem e conter crises é o que faço desde então. Acaba que no fim parece uma boa ideia ao menos ser paga para fazer isso em maior escala depois de uma graduação.

Percebo, tarde demais, que os olhos de Malu se arregalam para algo maior que eu, logo às minhas costas, e o esbarrão proposital me desestabiliza.

Theo passa por mim e envolve os ombros de Malu com um braço musculoso que exibe veias largas e pulsantes. O moletom cinza que momentos atrás cobria meu corpo agora está jogado causalmente por cima do ombro.

Eu não sou sua princesaWhere stories live. Discover now