III - ódio como herança

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Falei fevereiro? Falei, mas dia 30 de janeiro e quase lá né? Enfim, não me aguentei e adiantei o lançamento oficial da fic! Espero que gostem 🥹🥹

O céu mais parecia uma pintura renascentista, pincelado em tons de laranja intenso e rosa, mesclando-se a mais breve lembrança de um roxo.

Cada partícula de seu corpo latejava em dor, mas tudo era concentrado sobre a perna ferida, onde todo o peso da garota sobre si cobrava seu preço de forma violenta.

Respirou fundo olhando ao redor, onde sua mão tentava se mover por debaixo, buscando pela ferida na coxa que parecia cada vez mais úmida.

O coração se mantivera descompassado, a sensação dolente ia crescendo cada vez mais, onde mesmo que tentasse fazer algo respeito, não tinha forças.

Letícia era pesada demais.

Casablanca reuniu toda força que pôde, bradando aos ventos enquanto a empurrava para longe de si, as lágrimas criavam um caminho desordenado pela lateral da cara, coçando para cacete.

O corpo da trevosa foi em total violência para o lado, onde a cabeça pendeu para o lado e os braços ficaram abertos, a explosão de vermelho era constante.

Não tinha escolha além de esperar.

Na maior dificuldade, se moveu arrastando o corpo na direção da namorada, afundando os dedos na grama e sentindo a textura da terra debaixo das unhas, a forma desgraçada com que ia se aproximando tanto, desesperado por um sinal.

Quando tocou sua face suja de sangue, percebeu que a temperatura estava morna, o que de fato lhe animou.

Durante trinta e oito dias seguidos, Casablanca acordou todo trabalhado no suor, no desespero e na mais pura sensação de remorso. Renan tinha lhe dito que o agiota sempre perguntava por Letícia Oliveira e quando recebia a resposta, tudo desmoronava.

Sinto muito — o homem do bisturi tinha lhe dito em todas as malditas vezes que Bernardo acordou de uma lembrança ruim.

Era estranho pensar que o agiota sempre tinha a mesma reação durante as manhãs, e pelo restante do dia permanecia aéreo a tudo que lhe rondava. Soares contou que as filhas de Bernardo ainda estavam viajando, que Helena não quis voltar tão cedo.

Tinha falado sobre os funerais, as visitas familiares e os noticiários, que tudo depois de duas semanas tinha se acalmado.

"As pessoas esquecem quando outra notícia surge", foi o que o cirurgião lhe disse em uma dessas vezes.

Quando Bernardo se recuperou cem por cento de todos seus ferimentos — como se a perna já não fosse problema o suficiente, o filho da puta ainda tinha a maldita facada e o trauma que o impedia de se recuperar rapidamente —, Renan teve que sentar para conversar.

Podia ser diferente, Bernardo — o homem tinha começado num longo suspiro, onde nem mesmo o café amargo conseguia o deixar mais energético — Cinquenta e cinco anos nas costas e você me faz uma irresponsabilidade dessa.

Estava desesperado e tinha cheiro de gasolina. O que caralho eu deveria fazer?

Respirou fundo procurando pelas palavras certas, mas como diabos ele poderia dizer que Casablanca tinha sido responsável por tudo que houve com Letícia depois? Que se tivesse aguardado a ajuda dentro da porcaria do carro, tudo poderia ter mudado? Que porra, como ele teve a audácia de tirar um corpo desacordado e fodido de machucado de dentro do carro na pior posição possível e ainda ter piorado o sangramento? Derrubado a garota no chão?

— Eu posso vê-la? — perguntou.

Ela não está mais aqui.

O cheiro típico ia crescendo ao redor, seus dedos se moviam aos poucos, onde toda a sensação lancinante de um pulso preso ia se tornando protagonista.

LETÍCIA VOL IIWhere stories live. Discover now