•Silencenus•

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Marilia pov

Silencenus (n.): o intenso desejo de silenciar a própria mente.

Cambridge tinha, tradicionalmente, cheiro de café, croissants e natureza. Entretanto, em nenhuma outra estação do ano se podia sentir tão forte o cheiro das folhas queimadas que se misturavam ao vento gelado e corriam por toda a cidade. Era quase como uma ajuda da natureza para aumentar o encanto quase místico daquele lugar.

Aquele cheiro específico invadia o meu nariz, causando aquela sensação típica de congelamento que percorria todo o trajeto do meu pulmão, gelando o meu peito, enquanto eu, Lauana e Luísa, caminhávamos até o The Village.

- Você está bem? – Lauana perguntou, depois de me dar algum tempo de silêncio, enquanto caminhávamos, sem nem ao menos tentar me envolver na conversa com Luísa, coisa pela qual agradeci mentalmente.

- Perfeitamente. – respondi simplesmente, sem olhá-la e parando na calçada, ao lado do poste de semáforo, esperando a sinalização abrir para os pedestres.

Coloquei as mãos nos bolsos do moletom e fixei meu olhar no semáforo com o bonequinho vermelho brilhando do outro lado da rua.

- Tem certeza? – minha amiga questionou-me para confirmar. – O que Maraisa fez foi tão...

- Professora Pereira. – a corrigi, sem humor algum. – O assunto Maraisa morreu. – falei, sem tirar os olhos do bonequinho que nunca ficava verde.

- Morreu? – Lauana perguntou, demonstrando claramente que não havia entendido.

- Ela quis dizer que não é mais pra você falar sobre a “falecida” perto dela. – Luísa respondeu por mim e eu agradeci mentalmente a inteligência perspicaz da garota.

- Que falecida? – Lauana virou a cabeça que estava voltada para mim bruscamente, para poder olhar Luísa.

- A “morta”. – Luisa explicou outra vez, em um tom de obviedade.

- Que morta? Quem morreu? – minha amiga perguntou, mais uma vez e eu mal pude acreditar que ela estivesse sendo tão lenta em entender assim.

Luísa arregalou levemente os olhos, olhando estupefata para Lauana.

- Ela disse pra você não falar mais na Maraisa. “O assunto Maraisa morreu”. – ela falou, fazendo aspas com os dedos, usando um tom de tanta obviedade que eu quase tive vontade de sorrir, mas o gelo em meu peito rapidamente congelou a vontade.

- Ahhhhhhh! – Lauana exclamou, expressando sua compreensão e seguindo-me enquanto atravessávamos na faixa de pedestres. – Não podemos mais falar na Maraisa, mas aposto que não vão se passar cinco minutos até ela mesma falar da suposta “falecida”. – minha amiga falou, em um tom descontraído.

O simples fato de escutar o nome dela estava tornando o meu peito cada vez mais ártico. A cada menção do nome “Maraisa”, eu sentia-me dar um passo mais para dentro de uma geleira, para dentro do meu iceberg pessoal.

Virei-me, parando de frente para Lauana e Luísa, parando de costas para a porta de entrada do The Village. Cruzei os braços na frente do corpo para me proteger de um frio intenso que, aparentemente, só eu sentia e encarei as duas, principalmente a minha colega de quarto.

- Eu falei sério. – falei em um tom sério, porém sem ser rude. – Eu não quero mais falar nesse assunto. Não quero mais falar nela e nem ouvir o nome dela a não ser que seja extremamente necessário por questões da universidade.

Lauana me olhava com certo arrependimento no olhar e apenas balançou a cabeça em afirmação. A expressão de Luisa apenas reafirmava que ela já havia entendido. Dei-lhes um sorriso curto de agradecimento e virei-me de frente para a porta, empurrando-a e adentrei o local sem ao menos sentir vontade de olhar para o lugar onde ela costumava ficar.

Wonderfall - MalilaWhere stories live. Discover now