Templo de Karnak

13 5 78
                                    

Se o movimento do pequeno iate não foi suficiente para tirar Jacqueline do torpor do sono, os tecidos leves e macios alertaram-na de que algo estava errado. A última coisa de que se lembrava era de um enorme homem de pele escura lhe agarrando e aproximando uma agulha no seu pescoço.

Não camas e tecidos macios.

Levou a mão ao pescoço e sentiu o calombo causado pelo modo grosso pelo qual lhe nocautearam. Também vasculhou o restante do corpo, incluindo as roupas novas e limpas. Quem lhe vestiu? E onde estava Ignácio? Por um leve momento temeu por si mesma e no que os homens que lhe tivessem nocauteado teriam feito com ela.

Malditos.

Levantou-se da cama redonda de casal e procurou se situar. As janelas, que lembravam escotilhas, estavam abertas e ela sentiu o cheiro de água e o seu marejo. Estava sobre o Nilo, em um dos inúmeros barcos que fazia a travessia.

Até as calças jeans escuras e a blusa de botões de tecido fino de caráter social foram escolhidas com cautela. Ignácio. Aquela escolha tinha o dedo dele. Balançou a cabeça em negação, pegou um par de tênis branco qualquer e saiu cautelosamente do quarto, tentando fazer o mínimo de barulho possível.

Viu dois funcionários na cozinha, absortos, e poderia até tentar conversar com eles se não fosse o homem de tez bronzeada e sorriso de covinhas que a enlouquecia.

Ignácio abaixou um pouco os óculos de lentes azuis, olhando por cima deles por um momento. Ele indicou para que ela o seguisse até uma mesa repleta de quitutes onde ela poderia ver a cidade dos mortos. Luxor, Aswan e o Templo de Karnak eram visíveis da varanda do iate.

A camisa havaiana de gola aberta evidenciando a magreza era proposital. Sabia disso, mas o jeito relaxado e indiferente dele não faria o papo de azar colar. Ela iria ter as suas respostas.

— Vamos, desembucha. — Sentou-se em uma das cadeiras plásticas sobre o sombreiro do iate. — O que aconteceu desde que eu apaguei?

— Boa tarde para você também, meu amor. — Ignácio segurava uma xícara. — Quer? Chá de camomila.

— Ignácio, você tem uma audácia... — Ela levou a mão até o topo do nariz. — Não vou ficar brava, só quero saber o que você negociou para que possamos ter — ela abriu os braços — isso aqui.

— Cortesias de Santi Cortez. — Ele tomou um gole do chá — Os homens de meu irmão nos salvaram dos sequestradores. Acordei um pouco antes de você.

O jeito que Ignácio tecia uma mentira... Sim, o iate era incrivelmente do rico e proeminente empresário do ramo hoteleiro e não duvidaria dos favores que Santiago Cortez pediria a seu irmão salafrário. Entretanto era quase difícil, para não dizer impossível, o líder de uma família com ligações nobres saber os pormenores do trabalho de um de seus irmãos mais novos.

E ainda mandar uma equipe para auxiliá-los. Não havia mandado antes, por que mandaria agora? Embora Santiago tivesse os meios e poder para ajudá-lo, era difícil acreditar que o faria. Nada que uma boa e velha investigação para apurar a verdadeira.

Viu os lábios se curvarem sutilmente para cima e notou o alívio nas feições do homem, mal sabendo ele que, quando voltassem ao Cairo, ela desconstruiria todo aquele castelo de cartas que ele montou.

— Por sinal, por que estamos indo a Luxor? — Cerrou os olhos para ele. — Eu te disse explicitamente...

— Eu descobri uma inscrição interessante enquanto brincava com o cetro. — Jacqueline arregalou os olhos. Ela ouviu direito? Ele brincou com um artefato de mais de dois mil anos?

Ignácio jogou o cetro em cima da mesa e apertou algum botão. Para a sua surpresa, o cetro, que outrora cabia na palma da sua mão, se alongou e dobrou de tamanho.

PT-BR | O Cetro MalditoWhere stories live. Discover now