A campainha tocou enquanto eu me enrolava num roupão já fora do chuveiro. A voz grave dele ecoou para dentro tão forte que parecia que ele realmente já estava dentro do quarto.
-Juli... Você poderia, por favor, abrir a porta?
Permaneci em silêncio, aproximando-me devagar da porta. Eu não tinha intenções de abrir, mas a voz feminina de Carol murmurou algo para ele. Algo que não pude identificar.
-Julie, por favor, só nos diga se está bem, estamos preocupados - Carol foi quem gritou.
A campainha foi tocada firme mais uma vez.
-Eu vou arrombar... - Axl disse, com um pouco de desespero na voz.
-Eu não quero conversar agora! - Falei depressa, antes que Axl realmente quebrasse alguma porta.
Um silêncio esquisito rolou. Aproximei meu rosto na porta, tentando, a todo custo, ouvir qualquer ruído do outro lado. Ouço soluços abafados e um suspiro pesado escapando. A respiração entrecortada denuncia uma dor desmedida. Axl chorava. A porta é como uma fronteira entre nós, mas sua angustia parecia trancender, atingindo-me do outro lado. Eu não suportaria saber que ele estava mal a ponto de fazer algo como aquilo. Eu jamais havia o visto chorar. Ouvi Carol resmungar algo acalmando-o. Ele estava em boas mãos. Carol era extremamente boa em atenuar qualquer estresse.
-Julie, por favor! - Carol choramingou e bateu mais uma vez na porta.
As lágrimas escaparam sem eu sequer pensar. Escorreguei pela porta, sentando-me bem debaixo da maçaneta. Ver Axl naquele momento não era uma opção. Alguns minutos depois ouvi os dois se afastarem com passos lentos e conversas baixas. Permaneci ali até que cansasse de olhar o mundo debaixo. A porta foi batida novamente. Uma batida leve e calma.
-Julie? Somos nós... Hugo e Oliver... - Hugo falou.
Levantei instantaneamente, com tanta pressa que senti minha cabeça zonzear e tive que apoiar-me no batente da porta antes de abri-la.
-Oi-oi - Falei, esticando-me para pegar Oliver em meus braços naquele segundo. Ele estava acordado e agitado. Os olhos grandes como jabuticabas sorriram-me, me fazendo vibrar por dentro.
-Como está? - Hugo perguntou, fechando a porta em nossas costas.
Eu o encarei séria. Que pergunta ridícula. Eu o odiava tanto. Ele chacoalhou os cabelos grisalhos e limpou a garganta. Voltei minha atenção para Oliver. Beijei-o no rosto, fazendo-lhe cócegas até ele sorrir novamente.
Oliver havia feito 4 meses há uns quatro ou cinco dias e estava gordinho como nunca. As dobradinhas dos braços e pernas me fascinavam.-Julie - Hugo aproximou-se, sentando-se ao meu lado no sofá, dizendo... - Quero dizer que você é muito bem-vinda em nossa casa, em Los Angeles...
-Hugo, por favor - Levantei-me, afastado-me dele - Se não fosse por Oliver eu jamais teria qualquer contato com você...
Ele bufou. Vi que ele pensou em argumentar, mas desistiu e permaneceu em silêncio. Ficou ali alguns instantes enquanto eu estava distraída com Oli.
-Quero ficar alguns dias com ele... - Pedi, encarando-o.
-Tenho que consultar meu advogado - Ele disse, sério.
-É sério?! - Cuspi, ríspida - É por esse e outros motivos que não te quero perto de mim... Vou conseguir a guarda dele quando notarem o projeto de pai que você é!
Hugo não expressou qualquer sentimento. Tirou o celular do bolso do jeans e distraiu-se com alguma coisa. Ele era a coisa mais desprezível e falsa que eu poderia ter contato. Abracei Oli firme. Era bom demais tê-lo em meus braços. Senti a presença de Cecília bem ali conosco naquele exato momento e tudo, por alguns segundos, pareceu bem.
-Nosso voo sai bem cedo amanhã...
Virei-me a Hugo. Meus olhos marejados não escondiam de ninguém que eu estava só os destroços. Despedir-me de Oliver era outra dor cortante.
-Ok... - Murmurei, embora ainda não quisesse o soltar de meus braços.
Beijei-o na bocheca macia e o entreguei para Hugo.
-Cuide-se, Julie... - Hugo disse-me.
-Tchau, neném, até logo... Tchau-tchau - Eu disse, direcionando-me a Oliver.
E assim como apareceu, Hugo desapareceu, deixando-me outra vez no escuro. Encarei a janela do quarto do hotel. A noite começava a cair devagar, para meu completo desespero. Troquei-me em um jeans, um camisetão estampado e meu famigerado coturno. Sair atrás de drogas em uma cidade estranha era algo que eu sabia fazer bem. Toda e qualquer rua parecia a mesma, parecia um labirinto, refletindo minha própria confusão interna. O coração pesado a cada passo. Ouço minha intuição e logo encontro o que procuro.
Dichavar maconha nas próprias mãos era algo que me irritava profundamente. Mas não havia outra opção. Enrolei-a numa ceda fina e acendi o baseado enquanto caminhava a alguns quarterões do centro histórico de Santorini. Eu não sabia onde eu estava. Sentei-me no primeiro banco solitário de madeira que me deparei depois de atravessar algumas ruas de pedras esbranquiçadas. Observo a fumaça dançando pelo ar noturno. O calor suave da cannabis contrasta com o frio que sinto dentro de mim. Cidades desconhecidas têm um jeito peculiar de amplificar a solidão. Cada tragada é um escape momentâneo, um consolo efêmero para a tristeza que se entranha. Enquanto as luzes urbanas tremeluzem ao longe, mergulho nas nuances do meu próprio desalento, encontrando um breve refúgio na névoa que se dissipa.
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Her soulmate
FanfictionO ano é 2022, Julie acaba de completar 26 anos e de conquistar seu primeiro emprego formal. Diante de tantas novas responsabilidades e possibilidades, Julie vê sua vida virar de ponta cabeça depois de o acaso colocar Axl Rose, no auge de seus 60 ano...