𝘁𝘄𝗲𝗻𝘁𝘆-𝗼𝗻𝗲

46 5 0
                                    

— 𝗕𝗶𝗻 𝘀𝗼𝗿𝗿𝗶 𝗽𝗮𝗿𝗮 𝗲𝗹𝗲𝘀. — Se precisarem de alguma coisa, é só me avisar. — ele diz.

O sino dos ventos toca de novo, trazendo outro cliente. É sempre ótimo ver pessoas entrando na loja, mesmo que não comprem nada. Depois de um instante de silêncio, sinto o cheiro de sálvia e folhas de chá. Uma energia calma envolve a loja. Eu me viro para ver a porta aberta da sala dos fundos e o sr. Lucas parado ao lado de Bin, com a mão no ombro dele. Ele tem uma tendência a aparecer do nada.

— Boa tarde, Vanessa.

— Sr. Lucas... — é tudo que consigo dizer. Eu estava esperando que ele estivesse aqui hoje. Sinto uma pontada de culpa no peito por não ter entrado em contato antes, mas sei que ele entende.

Ninguém sabe disso, mas o sr. Lucas estava comigo no dia em que descobri que Gio havia morrido. Na verdade, foi bem aqui na loja que recebi aquela ligação da Isabelle pela manhã. O sr. Lucas me tirou do chão, fechou a livraria mais cedo, me levou até o hospital e ficou esperando para me levar para casa.

Ele sempre amou ter Giovanna por perto. O sr. Lucas sempre dizia que ela "trazia boa sorte"

— E o que eu trouxe? — perguntei certa vez.

— Você trouxe a Giovanna.

— Os livros sentiram sua falta — o sr. Lucas diz, levantando a mão.

Embora outra pessoa possa estranhar as palavras dele, eu já me acostumei com o jeito com que ele atribui personalidade aos livros da loja, dando vida a eles. Por exemplo, quando um livro novo chegava, ele dizia: "Precisamos encontrar um lar para esse aqui." Isso sempre me faz sorrir.

— Eles não saíram da minha cabeça — respondo.

Ele faz sinal de sim com a cabeça.

— Tive um pressentimento de que você passaria aqui — ele diz. Timing perfeito. Queria que você visse uma coisa.

Deixamos Bin com os clientes e nos dirigimos para o escritório. A sala fica atrás de uma estante secreta.
Toda vez que entro nela e sigo o cordão de luzes piscantes e os enfeites de papel pelo teto, me sinto Alice atravessando o espelho.

A sala está cheia de pilhas de caixas de papelão, cada uma delas ocupada por vários livros para os quais ainda não temos lugar ou que simplesmente não separamos. O sr. Lucas me pede para esperar aqui enquanto ele some dentro de uma salinha no canto.
Quando volta, está segurando um livro que não reconheço logo de cara.

— Encontrei isso na caixa de doações semana passada. Dê uma olhada. — Ele entrega o livro para mim.

Passo a mão pela capa. É um lindo tecido marrom encadernado, macio ao toque, com padrões florais bordados que surgem salpicados de ouro, e não há nada escrito em cima. Talvez esteja faltando a sobrecapa. Folheio algumas páginas em busca do título.

Mas está tudo em branco.

— É um caderno — o sr. Lucas diz. — Bem bonito, não concorda?

— É mesmo... — sussurro, admirando a qualidade das páginas. — Não acredito que alguém doou isso. Não chegou nem a ser usado.

— Pensei em você na mesma hora — ele diz e aponta para o velho computador na mesa dos fundos. — Já reparei que você roubou papel da impressora para escrever. Então, imaginei que poderia gostar desse presente. Quem sabe... Talvez se você mudar o meio em que escreve, isso pode te dar alguma inspiração.

— Eu só estava pegando o papel emprestado — respondo.

O sr. Lucas dá uma risadinha e desconsidera.

Eu olho para o caderno.

— Posso ficar com ele?

— Contanto que faça bom uso — o sr. Lucas responde com um aceno de cabeça. — Eu penso nisso como um investimento.

— Como assim?

— Veja bem... Quando você terminar seu livro, nós podemos colocá-lo nas prateleiras, bem na frente da loja — ele explica. — E eu posso dizer aos clientes que ela escreveu o livro aqui, sabe? No diário que eu dei a ela.

Eu sorrio enquanto abraço o diário. O sr. Lucas sempre me encoraja a escrever mais. "Use seu tempo na loja. Converse com os livros para se inspirar. Eles estão cheios de ideias."

Às vezes, compartilho minhas histórias com ele para saber sua opinião. Ao contrário dos meus professores de inglês na escola, o sr. Lucas é bem versado no mundo da literatura e sempre encontra beleza nas minhas palavras. Ele entende o que estou tentando dizer mesmo quando eu mesma não tenho muita certeza.

— Mas não sei se conseguiria escrever um livro inteiro — admito. — Estou tendo dificuldade só de pensar ultimamente. Não tenho mais certeza sobre o que escrever.

— No que você tem pensado? — ele pergunta.

Passo a mão pela lombada do diário.

— Em tudo, eu acho. Na minha vida. No que está acontecendo nela. — E na Giovanna, é claro.

— Então anota isso. Escreve sobre o que está acontecendo.

Olho para ele.

— Sr. Lucas, ninguém quer ler sobre minha vida.

— Para quem você está escrevendo mesmo? — o sr. Lucas pergunta, arqueando uma sobrancelha.

Ele já me perguntou isso antes. Eu sei a resposta que ele quer ouvir. Escrevo para mim mesma. Mas não tenho certeza do que isso realmente significa. Não consigo não me importar com o que as pessoas pensam, especialmente em relação à minha escrita.

— Nós temos muitas vozes dentro da cabeça. Você precisa selecionar aquelas que significam alguma coisa para você. Que história você quer contar?

Fico olhando para o diário enquanto penso a respeito.

— Vou tentar, sr. Lucas. Obrigada por isso. E desculpa por não avisar quando saí...

O sr. Lucas levanta o dedo para me impedir.

— Não precisa se desculpar. — Ele abre a porta da estante e gesticula na direção da loja. — Os livros lhe dão as boas-vindas de volta.

Sempre me sinto em casa quando estou na livraria. Eu poderia passar horas e horas aqui. Sinto um conforto em estar rodeada por paredes de livros. Mas, por mais que seja bom estar de volta, Giovanna está esperando por mim. Nós combinamos de fazer outra ligação hoje. Mas, desta vez, ela me pediu para encontrá-la num lugar novo para que pudéssemos conversar.

Ela disse que queria me mostrar algo.

Não esqueçam de votar! Até o próximo beijos beijos💋

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

Não esqueçam de votar! Até o próximo beijos beijos💋

remember the stars, 𝗴𝗶𝗻𝗲𝘀𝘀𝗮.Onde histórias criam vida. Descubra agora