O MONSTRO

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Alane

Os dias têm passado depressa, como sempre estou lotada de trabalho. Desde que a dona Fernanda resolveu contratar a nova contadora, estou cheia de afazeres.

 Agora tudo que ela faz é ficar trancada dentro daquela sala com aquela mulher, as duas já estão super amigas, almoçando juntas e tudo.

"Alane me traga mais relatórios", "Alane me traga tais documentos", "Alane, traga um café pra senhorita Pitel" - só de lembrar ela me mandando fazer essas coisas, fico estressada.

Às vezes ela volta a ser a megera de antes, voltou a me dar patadas, às vezes está tão estressada que mal troca meias palavras comigo, já em outros momentos é super educada, gentil e receptiva. Não consigo entender essa mulher.

Agora mesmo estou preparando o terceiro café do dia para a "senhorita Pitel", hoje quando cheguei ela já estava aqui, segundo ela havia algo muito importante para tratar com a senhora Fernanda, mas não sei sobre o que se trata.

A senhora Fernanda também chegou com uma cara de quem mataria qualquer um que olhasse torto para ela, não trocou uma palavra se quer comigo e as duas entraram na sala.

- Com licença - peço antes de entrar em sua sala.

- Obrigada - agradece a mulher assim que entrego o café pra ela, Fernanda quis apenas uma água.

Ouço ela falar algo ao telefone em sua mesa, solicita que alguém chame Nizam até sua sala imediatamente - dá ênfase na última palavra. Ela parece bem brava, sua postura é fria e está pensativa, seja lá o que for, vem chumbo grosso por aí.

Adoraria ficar para saber do que se trata, mas infelizmente ela nos pede que os deixem a sós.

Então me retiro da sala junto com a senhorita Pitel, pela sua cara, ela sabia o que estava por vir, e não era coisa boa.


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Fernanda Bande

Hoje o meu humor está dos diabos, na verdade tem estado assim há alguns dias,  desde que a senhora Pitel começou a analisar os balancetes algo não está certo.

Ela atendeu meu pedido e direcionou sua atenção totalmente a isso nos últimos dias. Estava tudo indo muito bem até ela perceber que haviam desfalques. Vários deles.

Os balancetes dos últimos três anos estavam sendo feitos de forma diferente, e não um diferente do tipo feito por uma pessoa diferente e com os resultados iguais, mas sim, diferente do tipo feito por uma pessoa diferente e com os resultados diferentes.

Alguns números não batiam com o dinheiro que entrava na empresa no mês correspondente. Estavam "mascarados", quase que imperceptíveis.

Ou seja, Nizam estava fazendo caixa dois, ou ajudando alguém a fazer.

Mal pude conter o ódio que me tomou quando descobri, mas tive que agir com calma e apurar todos os detalhes antes de explodir essa bomba. Infelizmente não podia acusá-lo sem provas ou ele poderia simplesmente colocar a culpa em outra pessoa e se safar. Por isso decidi que seria melhor não contar nada a ninguém, quantos menos pessoas soubessem, melhor, acionei apenas meu melhor advogado.

Comecei então uma investigação pessoal, desde os amigos mais próximos até os mais distantes. Não foi difícil descobrir algumas coisas, o desgraçado é um imbecil e deixou muitas pontas soltas. Possuía alguns antecedentes de seu passado sujo, tinha passagens por assédio e receptação.

Então foi só instalar uma escuta em sua sala e bingo. Peguei uma conversa sua com o Rodrigo, meu antigo gerente. Os dois desviavam tudo para uma conta no exterior.

Mas eu ainda precisava de uma confissão, por isso não podia simplesmente demiti-lo, por mais que eu quisesse ter feito isso desde o dia do bar quando ele tentou se aproveitar da minha secretária em estado completamente vulnerável. Havia se tornado pessoal.

Decidi instalar uma micro câmera com som na minha sala, aquele desgraçado me paga. Sempre acreditei que vingança é um prato que se come frio, faria então um banquete e ele seria o prato principal. Pedi ajuda de Matheus, meu amigo delegado, o deixando apostos.

Ouço batidas na porta e peço que entre já imaginando quem seria.

Mandou me chamar? - Nizam balbucia parado em frente a porta. Sua postura denuncia sua falta de paciência.

- Mandei, sente-se - indico umas das cadeiras em frente minha mesa.

Ele se senta, mas sua postura parece de tédio, como se qualquer coisa que eu falasse fosse completamente irrelevante.

- Aceita um whisky? - ofereço me servindo de uma dose, sem gelo, sinto o líquido descendo amargo e forte, me ajudando a engolir todo o ódio que sinto.

Ele me olha confuso, tentando decifrar o que está acontecendo, recusa a bebida.

- Não costumo beber enquanto estou trabalhando - ajeita seu terno e se acomoda melhor.

- Ah, claro. Um profissional exemplar, correto, culto, honesto. Tem algo sobre você que eu ainda não saiba? - digo ironicamente e o encaro profundamente, ele recua o olhar.

- Sabe o que eu admiro nas pessoas, Nizam? A coragem - digo observando os prédios lá fora.

- A coragem é uma dádiva - penso alto - mas sabe o que pode ser confundido com coragem? A burrice.

- Ele me olha confuso antes de se levantar.

- Não estou entendendo onde você quer chegar - se levanta - mas não tenho tempo pra isso.

-  já vai? - minha voz é carregada de ironia - vamos ouvir uma música, hum?

Dou o play na gravação de sua conversa com Rodrigo.

"A filha da puta fechou um negócio milionário, 50 milhões, se eu conseguir desviar isso a gente tá feito"

"Essa é a nossa chance, faz as coisas direito e a gente fica milionário" - a voz de Nizam e Rodriguinho ecoam pela sala.

Ele que estava quase chegando a porta, agora está parado, estático.

- É isso que você faz no trabalho? Ilude meninas inocentes e desvia dinheiro? - meus dedos tateiam a borda do copo agora vazio. Ele agora se vira e me olha perdido, sua postura agora está tensa.

- Eu não sei do que você está falando - é a única coisa que sai da sua boca. Tem alguma frase mais cínica do que essa?

- Você não tem nem a decência de confessar? seja homem ao menos a porra de uma única vez - rosno entre dentes cara a cara com ele.

- VOCÊ É UM CÍNICO DE MERDA, EU SEI QUE VOCÊ DESVIOU DINHEIRO DA EMPRESA DO MEU PAI, SEU DESGRAÇADO  - sinto o ódio tomando conta do meu corpo, minha vontade é de esmurrá-lo.

- Você tá louca? Você não pode me acusar de nada, isso não prova nada, vai se tratar - rosna para mim como um cão raivoso.

- Ah não? Você é um imbecil, achou mesmo que eu nunca iria descobrir? - graças aos meus saltos consigo olhar em seu olhos agora carregados de raiva.

- Você quer saber? eu cansei, CANSEI. - Me encara - Roubei, ROUBEI SIM - grita - Eu quero que vocês se fodam, que você se foda, sua megera desgraçada, você não tem noção de tudo que eu aguentei daquele imbecil do seu pai - sua voz é cortada quando minha mão atinge seu rosto.





















O Diabo veste Preto (Ferlane)Onde histórias criam vida. Descubra agora