Capítulo 34

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UM CAPÍTULO SOFT PARA ESSASS POBRES CRIANÇAS ÓRFÃO DE VERONITA




NO DIA SEGUINTE

Verônica acomodou-se melhor no sofá enquanto segurava uma xícara de café, encarando Anita com um olhar penetrante, mas repleto de gentileza. O silêncio do ambiente parecia preparar o cenário para uma conversa de corações abertos.

"Você tem muito para me contar..." - Verônica disse, sua voz suave quebrando o silêncio entre elas, enquanto ainda permaneciam sentadas lado a lado, envoltas na intimidade do momento compartilhado.

"Certo..." - Anita hesitou por um instante, a complexidade de suas emoções refletindo-se em seu olhar. Ela sabia que o momento de abrir as comportas de suas memórias havia chegado. "O que você quer saber?" - Perguntou então, sua voz um misto de apreensão e vontade de se abrir para Verônica, de revelar as camadas que compunham sua essência.

"Quero saber quem foi Karina e quem é Anita." - Verônica falou com firmeza, mas sua voz carregava uma suavidade que acolhia. Seus olhos encontraram os de Anita, um olhar que buscava entender, não julgar. "Se você se sentir bem em falar, claro." - adicionou, deixando claro que respeitaria os limites de Anita, que aquela era uma oferta de ouvir sem pressão, apenas com o desejo de compreender e se conectar.

Anita sentiu um nó se formar em sua garganta. A menção de Karina evocava um turbilhão de emoções, uma vida que parecia distante, mas que ainda ecoava em seu peito com batidas dolorosas e memórias. Respirou fundo, buscando naquele fôlego a coragem de desnudar sua alma, de atravessar a ponte entre seu passado e seu presente. Era um convite para adentrar em um território que poucos conheciam, uma oportunidade de reconciliação de sua própria história. Com o coração batendo forte, Anita começou a falar, pronta para traçar a jornada de quem foi Karina e quem ela, Anita, estava se tornando.

"O nome Karina foi escolhido por minha mãe no dia em que nasci, e o sobrenome Berlinger é o meu materno. Quando decidi mudar meu nome aos 18 anos, optei por manter o sobrenome, pois era a única lembrança que restava dela" - Anita explicou. "Fui deixada no Orfanato de Matias aos 14 anos, alguns meses após perder minha mãe para uma doença. Anos depois, compreendi que meu pai me abandonou lá, mesmo tendo condições de me criar, simplesmente porque achou mais fácil se livrar de mim" - acrescentou, pausando para respirar profundamente. "Entre meus 14 e 18 anos, o orfanato foi meu lar. Para muitos, quatro anos podem parecer pouco, mas para mim, foram palco do período mais turbulento da minha vida. Foi lá que, aos 14, conheci Olga. Um ano mais velha, ela se tornou a primeira pessoa a despertar em mim algo que talvez fosse paixão, já que também foi com ela que tive meu primeiro beijo." - Anita narrava, com a voz serena, enquanto Verônica acompanhava cada palavra com atenção. "E foi aí que os abusos de Matias começaram. Confiei nele ao revelar minha orientação sexual, e ele, usando a tal 'cura', tentou me mudar." - Anita fez uma pausa, respirando fundo. "Aos 17 anos, ele me apresentou ao seu pai, Júlio. Inicialmente, a ideia era que Júlio me adotasse após meus 18 anos, mas preferi continuar no orfanato, conciliando trabalho, moradia e estudos. Júlio concordou. Nessa época, Olga saiu do orfanato e nunca mais a vi." - revelou. "Aos 18, me tornei Anita e ingressei no DHPP como estagiária. Lá, a máscara de Júlio caiu: ele era casado, com uma família escondida. A raiva me consumiu quando, com a sua entrada no departamento, descobri que você era filha daquele monstro." - Anita apertou os lábios, a raiva colorindo sua voz. "Você o idolatrava, sem nem saber sobre a vida dupla que ele levava, tão diferente da imagem que você pregava. Meu coração se despedaçou e a raiva se transformou em repulsa." - O semblante de Anita se abalou. "A partir daquele momento, não consegui mais te suportar, mesmo sabendo que você talvez não soubesse da verdadeira natureza do seu pai."

Sombra da Verdade - VeronitaWhere stories live. Discover now