Capítulo 4

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Aurora

Ao longe escuto um barulho que incomoda meus ouvidos, rasgando o silêncio de onde eu estava. Abro os olhos sendo contemplada pelas luzes dançantes de chamas em tochas presas nas paredes escuras de pedra. Olho ao redor e vejo que estou em uma caverna, sobre uma pedra lisa e fria. Como se fosse um altar de sacrifício e eu a oferenda.

Acima da minha cabeça, estalactites se projetam afiadas como facas prontas a cair sobre a minha cabeça. Como se esperassem as ordens de alguém para se desprenderem e cair encima de mim.

Viro de uma vez, em um movimento brusco, saindo de cima da pedra. Olho para meu vestido rosa intacto, nem mesmo um grão de areia. Como vim parar nesse lugar? E que lugar é esse?

Sigo as tochas e o som de água que pinga em algum lugar. Caminho apoiando minha mão na parede de pedras ásperas, ao contrário da cama, as paredes não são frias e sim quentes. Provavelmente pela tocha que está iluminando o caminho.

Respiro fundo e prendo o ar, quando me deparo com a visão de uma lagoa imensa, escondida no coração da caverna. Uma cachoeira derrama suas águas, e a névoa se eleva. Hesitante, toco a superfície da água com o pé, e um arrepio percorre minha espinha, ela é gelada, um choque de realidade em meio ao calor das chamas, que sentia das paredes daquele lugar.

Escuto novamente o som que outrora me despertou de meu sono, um arranhar como de garras de uma fera nas paredes de pedra, e o barulho de um bater, em um ritmo sinistro bem baixo, como se algo batesse nas paredes da caverna, me arrepiando por inteiro.

Meu coração dispara de medo, olho em volta e nada, então lentamente ergo meu olhar, vendo logo acima da minha cabeça, o que eu pensei que nunca veria na minha vida. Um monstro alado.

Suas asas imensas se desdobram na escuridão, e sua cauda marca o tempo em um toque lento contra a pedra. Seus olhos, esmeraldas vivas, fixam-se em mim, e suas garras desenham na rocha, como se a pedra não fosse nada. Um sorriso se revela ao perceber que o encontrei, e os caninos brilham, afiados como espetos. Sem pensar duas vezes, corro o mais rápido que posso. Enquanto escuto uma risada não muito longe de mim.

Sigo as tochas que iluminam o caminho, vendo que a caverna se abre como um castelo escupido dentro da rocha, chego em um salão com um trono de pedra alto que se ergue do chão, imponente e solene. Colunas enormes de pedras retorcidas parecem enfeitar o local. Vejo a luz do sol, sorrio esperançosa, corro em direção a luz, e quando saio da caverna me deparo com um penhasco gigantesco, tão alto que posso até tocar as nuvens.

— Aonde pensa que vai princesa. — Escuto sua voz, um tom grave que me amedronta.

— Se você se aproximar, eu pulo. — Ameaço com a voz trêmula.

— Então pule. Quero ver se tem coragem. — Fala de forma cruel, me desafiando.

Me viro em direção a caverna e vejo a presença de um homem, mas ele não é um homem. É muito mais alto do que qualquer um que já tenha visto, sua pele um tom marrom escuro, com preto e vermelho, como escamas, dois chifres pretos que se projetam na parte da frente de sua testa e viram para trás. As garras nas mãos, e nos pés, as asas negras adornadas de vermelho, as escamas que descem por seu pescoço, desenham seu corpo, que se esconde debaixo de uma calça humana, e logo vejo sua cauda balançar, como de um lagarto, porém a ponta tem um triângulo fino, que bate em um compasso ritmado no chão.

— Quem, ou o que é você? — Pergunto em um fio de voz, misturada com a curiosidade e o medo.

— Não me conhece princesa? Nunca falaram de mim?

— Eu me lembraria se alguém tivesse me falado sobre um monstro.

— Um monstro! — Ele diz e sorri, deixando escapar um som roco. — Não sou um monstro, sou um Dragão.

Ele da um passo a frente e eu dou um para trás, ficando na beira do abismo.

— Não se aproxime. — Peço com a mão em sua direção, um gesto inútil de defesa. — O que quer de mim?

— Seu pai me entregou você princesa. Para eu fazer o que quiser. — Diz com um sorriso cruel.

— Meu pai nunca faria isso.

— Ele fez, a mais de 10 anos atrás. Trocou você, pelas terras do lado leste. E eu esperei, até seu décimo oitavo aniversário. Agora você me servira, em tudo que eu desejar.

— Não. — A palavra escapa de mim como um último fôlego, meu pé escorrega, e o céu se distancia.

Começo a cair da montanha, e eu sei meu destino é a morte. Porque meu pai não me contou o meu destino cruel? Porque escondeu de mim todo esse tempo? Me pergunto. Por um segundo um sorriso se fez em meus lábios, eu morreria e aquele monstro não colocaria as mãos em mim. Mas meu sorriso se desfaz ao ve-lo saltar se transformando em um dragão enorme no ar, e com uma facilidade me segurar em suas garras.

— Me solta, me solta. — Luto me debatendo, contra o inevitável, conforme ele bate as asas.

Porém nada consigo, ele volta para o topo comigo, e me lança para dentro da caverna, voltando a forma híbrida que eu tinha visto antes. Ergo-me trêmula, escorando em uma parede, quando ele para em minha frente, respirando fundo como um predador.

— Agora eu sei o seu cheiro princesa. Não tem como fugir de mim. Só sairá dessa montanha, dessa caverna se eu permitir. — Ele sorri.

Vejo em sua mão o cordão que ganhei em meu aniversário, ele segura o medalhão e sopra um fio de fogo, meu coração se aperta pelo medo, então ele pega meu pulso e encosta o medalhão na palma da minha mão, a queimando, a marcando.

— Haaaaaaa! — Grito pela dor da queimadura, e parece que isso o estiga, pois ele sorri mais largo ainda, parece que meu sofrimento o excita.

— Agora você é minha princesa, até o resto de sua pequena vida. — Fala removendo o medalhão.

Olho para minha mão e vejo a marca da queimadura, meus olhos se enchem de água, porem não derramo uma lágrima.

— Está proibida de tentar contra a sua vida princesa. — Dita como uma ordem e meu corpo se arrepia.

— O que foi isso? — Pergunto e ele sorri.

— Uma ordem dada pelo macho, não pode ser descumprida, pela fêmea escrava.

Pisco várias vezes sentindo que as lágrimas ficam mais pesadas.

— Escrava? — Sussurro.

— O que pensou que seria? Para mim, é apenas isso. Uma escrava vai fazer o que eu quero, na hora que eu quiser.

Ele fala virando de costas, entrando na escuridão da caverna. Eu volto a me aproximar do abismo, olho para o longe e levo meu pé para me jogar, porém a queimadura em minha mão arde e meu corpo recua no mesmo instante como se não tivesse mais controle dele.

Caio de joelhos, olhando para o chão, derramando as lágrimas que agora saem, eu estava presa naquele lugar. Eu havia sido enfeitiçada pelo Dragão.

Enfeitiçada pelo DragãoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora