A COVA DO LEÃO

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Sem olhar para trás, Derek partiu em meio aos escombros, aproveitando cada fresta entre os restos de móveis e paredes, pulando sobre o que fosse possível. Nenhum dos itens largados pelo caminho representou um empecilho para a saída, uma vez que ser acossado por um rosnado grave e uma onda de entulho deslocado pelo avançar do leão era uma ótima motivação para seguir em frente e não olhar para trás.

No jardim, não foi diferente. Ele correu pelo gramado, passando longe da piscina, percorreu parte da estradinha de paralelepípedos e entrou por entre as árvores, a vegetação atrasando Atlas e dando vantagem para o primeiro colocado, que, no caso, era a nuvem de moedas que escapara da mansão junto com o mago.

As peças se infiltravam com violência por entre as folhagens, mas Derek não tinha um segundo sequer a perder com o receio de que galhos decepados caíssem em sua cabeça. Continuou com a marcha pela floresta obstinadamente, tomando cuidado para não se desviar da direção certa e se perder da fonte.

Ele se permitiu um suspiro um pouco mais aliviado quando avistou as ruínas das arquibancadas e, depois, a fonte com suas estátuas quebradas, todas espalhadas em volta da lacuna outrora ocupada por Georgius, cuja ausência não era mais sentida que a da água.

O piso, sedento, servia apenas para pavimentar a corrida do mago pela bacia seca rumo às rochas maiores. "Continua lá", dissera Maciel antes de ser devorado. Se não quisesse ter o mesmo destino, tinha que estar certo sobre a ideia em sua cabeça.

Não encontrando nada que se assemelhasse a um ralo, cano ou escoadouro aos pés da elevação rochosa, o rapaz se concentrou à procura de outro ponto no pavimento. Correspondido pelo brilho dourado, o colocou no bolso rapidamente e escalou as pedras, ouvindo o triturar do leão se desvencilhando das árvores não muito longe, o animal esmagando troncos e galhos tombados com o peso de uma montanha ambulante.

Derek não pediu licença a nenhuma das figuras ali e duvidava que qualquer uma delas se importasse com sua presença. Na verdade, se as estátuas teriam alguma preocupação, seria com a aproximação do verdadeiro responsável pelas rachaduras e fissuras que acometiam seus corpos e membros mutilados.

O mago se virou para observar um velho conhecido chegar para mais estragos.

Pisando a pé enxuto sobre a fonte, Atlas flexionava as patas dianteiras para o bote final, o impulso sendo abortado pelas estrelas dispersas no céu que se uniram em uma constelação cortante. O fluxo prateado raspou pelas rochas do pescoço, liberando poeira e faíscas conforme as moedas atuavam como a dentição de uma serra elétrica. O animal recuou um pouco, distribuindo mordidas no ar, mas conseguindo apanhar apenas uma ou outra peça metálica que voava em sua órbita.

– Está com fome? – gritou Derek. Sem a mínima pretensão de fuga, nem ele, nem as estátuas remanescentes se deixavam abalar pelas pisadas nervosas do leão. – Considere-se servido.

Não havia bandeja para a refeição que o rapaz oferecia, tampouco era necessário. Os pedaços de metal tinham autonomia para se lançarem rumo à fera em torrentes afiadas que arranhavam profundamente a casca grossa. Elas ergueram-se e se uniram no alto em uma formação parecida com a das águas de um chafariz antes de descerem feito um soco nas costas do animal.

As já combalidas patas se quebraram e o rasgo na base da juba fez a cabeça se separar do resto do corpo imediatamente após o golpe. Moedas se misturavam às rochas no desmoronamento, voltando a flutuar e a brilhar em seguida como se comemorassem a vitória fugaz. O triunfo durou só o bastante para dar tempo de a maioria das peças monetárias se afastarem dos destroços que se colavam em uma movimentação ruidosa na qual tomava para si pedaços da fonte.

Derek Campbell contra a EfígieWhere stories live. Discover now