Capítulo 23

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 POV Michelle

- Michelle, já estou a transferir do cartão do advogado. - Avisou-me Kevin.
Soltei a respiração e sorri.
- Diego, abre outra conta nas ilhas. Estou a receber mais dados bancários do Luke.
O rapaz apenas assentiu, e continuou concentrado no seu portátil. A campainha do apartamento deles tocou e assustou-nos. Ergui uma sobrancelha ao Kevin, pois eles não estavam à espera de ninguém. Kevin levantou-se e foi ver.

Quando dei por mim já estava algemada, a entrar na CIA e ao meu lado estavam os irmãos. Já tínhamos sido revistados e passado por alguns pórticos de segurança. Apreenderam os nossos portáteis assim que chegámos lá. Eu não acreditava naquilo, Larry levava-nos por aqueles corredores brancos e com luzes fluorescentes. Outrora, via-o pelos corredores da faculdade e agora estava ali como criminosa e ele como Agente. Óbvio que ele tinha seguido a carreira do pai, raios! Sentia o meu corpo em pânico. Certo que estávamos em sarilhos dos grandes, contudo havia algo mais a aumentar a minha ansiedade interior. E eu sabia muito bem quem estava a despoletar tudo isto. Chegámos a uma espécie de átrio.
- É para ficarem separados! - Ordenou Larry aos Agentes.
O meu ex colega de faculdade, agarrou-me no braço.
- Harry, fica aqui, quando chegarem vai chamar-me.
O tal Harry assentiu, e Larry arrastou-me para dentro de uma sala com uma mesa branca e algumas cadeiras da mesma cor, era uma sala de interrogatório, lógico! Não conseguia deixar de reparar na sua expressão de puro choque; incompreensão e menosprezo. Ele costumava falar comigo sobre música e a realidade é que nos dávamos bem. Eu sentei-me e ele estava de pé à minha frente, premia os lábios e a sua respiração estava pesada. Ele premiu um gravador com o objectivo de ter o aúdio da conversa.
- Michelle, preciso que colabores comigo.
Engoli em seco e trinquei o maxilar.
- És hacker desde quando?
Sentia a garganta seca.
- 2013.
Larry ficou surpreso com a minha resposta, mas depois lá se recompôs.
- Certo, eu quero saber a tua história, entendes o que quero dizer? Porque começaste? - Questionou.
Inspirei uma grande quantidade de ar. Não queria remexer no passado, voltar a esse lugar que me esforço tanto por apagar ou esconder na minha vida actual. No entanto, eu estava de consciência limpa apesar de que eu sabia que, de alguma forma, o governo nos iria culpar. Então não valeria a pena dizer nada, eles que investigassem. Tinha noção que os irmãos agiriam da mesma forma.
- Michelle! Porque começaste? - Larry repetiu a pergunta.



POV Karla

Entrei no departamento de interrogatórios, onde vi Harry com um sorriso no rosto, o que era bom sinal. Atrás de mim estavam o rapaz e as duas miúdas algemados, com algunsAgentes por perto.
- Os outros foram colocados em celas individuais em corredores diferentes. Fazemos o mesmo com estes, certo? - Sussurrou-me.
Voltei-me para trás.
- É para ficarem separados. - Ordenei.
Vi os agentes a levarem-nos e concentrei-me em Harry.
- Onde está o Larry?
- Bom, ele disse que quando chegasses para eu o chamar. - Indicou-me.
Arqueei uma sobrancelha e bufei.
- Certo, vai chamá-lo então.
Vi Harry a ir. Fiz umas quantas festas ao Max, e resolvi tirar um café na máquina pois tão cedo não iria sair daqui. Bebi o café e alguns minutos depois vi Larry com uma expressão estranha. Harry sentou-se numa cadeira a fazer festinhas ao doberman.
- Karla, correu tudo bem?
- Sim.
Ele estava tenso, alguma coisa de errado se passava.
- Podes dizer-me que merda é que está a acontecer? - Atirei-lhe.
O rapaz premiu os lábios e engoliu em seco.
- Eu estou a interrogar uma rapariga que pertence ao grupo.
- Sim?
De facto, eu estava a perder a paciência.
- E temos um problema... grave. - Retorquiu.
Ergui uma sobrancelha. Ele coçou a barba, e inspirou uma grande quantidade de ar.
- Ela andou connosco na faculdade.
- Ok, podes parar com a merda dos rodeios e dizer o nome dela?
Os seus olhos castanhos estavam preocupados.
- Michelle. - Ele disse.
E nesse momento, o meu mundo caiu. Por alguns minutos, senti-me fraca respirei fundo algumas vezes sentindo a mão forte de Larry no meu braço. Eu tinha de me lembrar que ali eu era uma Agente, e em nada podia deixar que a minha vida pessoal prejudicasse o meu trabalho. Eu teria de lidar com ela, mesmo quando não a via há três anos e seis meses. Mesmo quando eu estou numa relação com o Chris, e eu sei que o meu coração é dela. Mas isso agora não poderia ser relevante, havia trabalho a fazer. E arranjar forças ao inferno para estar lúcida, e manter o profissionalismo.
- Karla, eu vou falar como teu amigo e não como teu colega. É preferível não a veres hoje. Deixa as coisas arrefecerem um pouco. Eu vou terminar com ela. Enquanto isso tu e o Harry, vão abrindo as fichas dos outros, pode ser?
Fechei os olhos por alguns segundos e respirei fundo, ele tinha razão. Eu não estava em condições de estar na presença dela, neste momento.
- Certo, mas eu quero o aúdio dessa conversa. - Afirmei.
O rapaz assentiu.
- Espera por mim, no nosso gabinete. - Indicou-me e desapareceu.



POV Harry

Fazia festas no Max enquanto a preocupação se erguia em mim. A Karla não estava bem, Larry estava a agarrá-la pelo braço como se lhe estivesse a devolver o equilíbrio. Assim que ele desapareceu, levantei-me e fui ter com a bela morena. Ela estava desorientada, era perceptível pelo seu olhar límpido, ela queria chorar.
- Karla, posso ajudar? - Sussurrei baixinho.
A latina abraçou-me com força, imitei-a.
- Porque é que ela tinha fazer isto, Harry? - Questionou.
Era óbvio que não estava a entender a sua pergunta. Fiz-lhe festas no cabelo e ela soluçava no seu choro.
- O que se passa?
A mulher largou-me e os seus olhos fixaram-se nos meus.
- A mulher que o Larry está a interrogar é a minha ex namorada, o amor da minha vida. - Confessou num sussurro quase inaudível.
Oh meu Deus! A linda, que mais parece a Megan Fox, de olhos verdes é a paixão da latina. Wow! Engoli em seco, pois não fazia ideia do que dizer. Ela mordeu o lábio inferior e limpou as lágrimas. Suspirou e abanou a cabeça.
- O Larry pediu para abrirmos as fichas deles.
- Certo. - Retorqui
Lá fomos, com o Max, de cela em cela retirar os dados de todos. Eu não estava concentrado e muito menos a Karla. Como é que a vida poderia ser tão irónica? Era óbvio que um furão doloroso estava a acontecer dentro dela. E eu queria tentar apaziguar o máximo que conseguisse.
- Karla, diz-me como te posso ajudar?
Ela devolveu-me um breve e carinhoso sorriso.
- Vamos combinar uma saída.
Gargalhei.
- Estou dentro! - Afirmei.
- Harry, por favor não contes a ninguém que eu ainda amo aquela ridícula. Eu estou a tentar há anos apagá-la e não consigo. Eu namoro com o Chris e até estou bem, mas...
Sorri-lhe de forma sincera.
- Eu sei, Karla. Estou numa situação idêntica. - Confessei-lhe.



POV Karla

Larry disse-me que ia a casa da Michelle buscar o Bailey. Obrigou-me a vir para casa com Max, alimentei-o e enfornei-me no quarto. Deitei-me na cama com o gravador que Larry me tinha entregue, eu estava tremer. Respirei fundo, inutilmente, e premi o play. Sentia, apesar de tudo, a minha curiosidade a chegar a um extremo que não reconhecia.
- Michelle, preciso que colabores comigo. És hacker desde quando?
- 2013.
Engoli em seco, como poderia ser? Aquela voz rouca ressoou na minha cabeça, levando-me por micro segundos a um passado que, neste momento, não era bom estar a recordar. Alguém respirou fundo.
- Certo, eu quero saber a tua história, entendes o que quero dizer? Porque começaste?
Houve um silêncio.
- Michelle! Porque começaste? - Larry, repetiu a pergunta.
- O que acontece se eu contar? - Ela sussurrou.
- Eu preciso de saber o que aconteceu para te ajudar. Escuta, eu estou a fazer o meu trabalho. Michelle, por favor, colabora. - Pediu.
Houve outro silêncio, e eu sentia-me a tremer gradativamente.
- Tudo bem! Eu vivia em Nova Iorque, com os meus pais e os meus irmãos. E tudo corria normalmente. Até que conheci a Kelly.
Kelly? Ela nunca me tinha falado de nenhuma pessoa com esse nome.
- E quem é a Kelly? - Perguntou Larry.
- Foi a minha primeira namorada, ela estava na minha turma. E aí eu entendi algumas coisas em mim. Entretanto, comecei a ter curiosidade sobre a Deep Weeb, pois sabia que era mais fácil obter coisas por lá. Eu queria ter dinheiro para fazer a faculdade, pois os meus pais não poderiam pagar. E percebi que se alterasse alguns códigos nas configurações dos sites, conseguia manipular apostas online.
Pausei o aúdio, eu não tinha noção nenhuma da vida dela. Ela nunca falou do seu passado, desviava sempre a conversa. Soltei uma gigante lufada de ar e voltei a dar play.
- E depois de terminar o 12º ano, não conseguia conter mais. E numa noite de Julho, tudo deu uma volta de 180º, eu contei aos meus pais sobre a minha sexualidade e fui expulsa de casa. Nessa noite, fui ter a casa da Vero, já era a minha melhor amiga nessa época. E os seus pais ficaram revoltados com a situação, autorizaram a Vero a vir comigo para Miami. Contei a Vero sobre as apostas online e ensinei-a a alterar os códigos. Pois o dinheiro que os pais dela nos disponibilizaram, não chegava.


O meu corpo estava a gelar com a confissão dela. Como é que era possível em pleno século XXI haver pessoas a expulsaram os próprios filhos de casa pela sua sexualidade? Agora era perceptível a forma dela ser, tão fechada e, de certa forma, altiva embora discreta.
- E quando chegaram a Miami o que aconteceu? - Perguntou Larry.
- Ficámos num quarto minúsculo, numa pensão. Até que um dia a Vero, viu um anúncio de oferta de emprego na M3 e fomos à entrevista.
A gravação parou, deve ter sido neste momento que Harry foi chamar o Larry porque eu já tinha chegado. Sentia-me horrível por dentro, e cada vez mais curiosa.
- Vamos continuar, Michelle. O que aconteceu depois de irem fazer a entrevista na M3? - Começou Larry, numa voz calma.
Eu sabia o que ele estava a fazer. Ele não queria saber inicialmente do crime, tentávamos aprofundar a vida da pessoa, e essa abordagem era a chave para haver uma boa análise.
- Eu e Vero ficámos lá a trabalhar. Eu, no departamento de edição de videoclips. E a Vero, no estúdio de fotografia.
Sim, eu lembro-me que ela trabalhava lá, como esquecer...
- E continuavas com as apostas online?
- Sim.
- Certo e isso foi em 2014 e a faculdade começou em 2016, o que fizeste durante esse tempo?
- Juntámos dinheiro e comprámos uma casa; os carros e o Bailey. - Retorquiu.
- Bailey?
Ri-me, com a confusão mental visível de Larry.
- É o meu pastor alemão.
Percebi que ele soltou a respiração numa atitude riso interno.
- Certo, prossegue. - Pediu-lhe.
- A situação dos cartões de crédito foi surgindo nessa altura. Entretanto ia estudando música, em segredo, e editava na M3. Fizemos a candidatura à faculdade e, para grande surpresa, conseguimos entrar.
- E quando a faculdade terminou?
- Tudo mudou! O novo director da M3 queria os impossíveis, então rescindimos o contrato. Passámos a viver daquilo que a internet nos proporcionava. Entretanto, conseguimos ficar no departamento de marketing da empresa em que trabalho até hoje.
- Tudo bem. Onde está a Vero?
- No Brasil com a Lucy.
Ela estava a ser sincera, quem diria que fosse uma criminosa. Sentia a terceira guerra mundial na minha cabeça.
- Talvez o melhor seja irmos todos descansar, já está tarde. Michelle, tens alguém que possa ficar com o teu cão?
- Não.
- Se concordares eu vou buscá-lo a tua casa, e ele fica aqui no canil.
- Sim, agradeço. Quando entrares em casa diz o nome dele, para ele ficar calmo.
Desenhou-se um sorriso pequeno no meu rosto. Era verdade, Bailey era desconfiado com estranhos menos que o seu nome fosse proferido ou se as donas estivessem por perto. Pousei o gravador na mesa de cabeceira e suspirei. Michelle, a mulher que me enlouqueceu de amor, era um enigma autêntico. Fiz-me o favor de tomar um calmante, e assim consegui adormecer.

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