Jude

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Eu sou desperdiçadaMiss PromíscuaEu não preciso ser salvaMiss Desprezo, eu me importoEstou presa na chuva

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Eu sou desperdiçada
Miss Promíscua
Eu não preciso ser salva
Miss Desprezo, eu me importo
Estou presa na chuva

Miss nothing



Quantas vezes um coração aguenta ser dilacerado?

Uma pergunta banal para alguns, se tornava complexa quando era você deitando-se na sala de cirurgia sabendo que roubariam uma parte do seu corpo porque outra pessoa era mais amada.

Jude não teve medo em momento algum, porque sabia que voltaria para casa mais cedo ou mais tarde, pois não a deixariam morrer. Sua vida importava. Sem ela, não haveria Eva. Sem Eva, o mundo de muitos entrariam em colapso.

Ela estava seguindo por tempo suficiente aqueles rostos gananciosos que se vendiam facilmente por notas novas de um lugar obscuro, aceitando usar suas práticas para mutilar uma pessoa que não queria ser mutilada, alimentando a obsessão dos sortudos que comandavam o mundo de cima.

No entanto, eles acreditaram que Jude aceitaria facilmente ser levada para o inferno sem lutar contra a correnteza, pois havia concordado com tudo sem questionar, porém o limite havia chegado, e ninguém arrancaria o que restou pelo bem de Eva.

Jude sabia de tudo sobre todo mundo, porque ninguém olhava duas vezes para a garota morta viva sem os olhos. Era uma dádiva ser esquecida, e ainda assim se tornava uma maldição. Ninguém pensava em rever as decisões de terceiros, mantendo-a naquela prisão sem cor, acorrentada em mentiras sem começo ao fim, mergulhada na ambição dos próprios pais.

— Eva. – sussurrou na madrugada, esticando a mão fria até os dedos elegantes de sua irmã, sentindo os anéis de prata que ela nunca deixava de usar – Acorde, Eva!

Sua irmã mais velha era personificação de beleza. Ela era uma princesa. A suavidade de seus movimentos não foi adquiria na fase adulta, mas porque ela foi agraciada por infinitos talentos que trabalhavam o seu lado feminino. Eva também era muitíssimo criativa, suas combinações de roupas eram dignas de um blog.

Infelizmente Jude não conseguiu adquirir qualquer talento. Nasceu oca.

— Judith?

Jude aproximou-se da cama hospitalar para que fosse vista. Os olhos de Eva arregalaram-se sutilmente, e seus lábios secos abriram. Ela não tinha forças para fazer nada além de assistir, por mais assustador que fosse, porque seu coração estava morrendo. Jude colocou uma mecha do cabelo atrás da orelha, sentando-se na ponta da cama.

— Não consigo dormir. – confessou olhando para a janela fechada do quarto enfeitado de Eva, enquanto o dela era tão branco que doía a cabeça – Tive um pesadelo duas noites atrás. Sonhei que arrancavam o meu coração e o colocava em um prato. Ele não parava de bater mesmo longe do meu peito. – pressionou a mão acima do órgão, sentindo-o pulsar – Achei que morreria, mas um homem o cortou e comeu.

— Judith... – chamou-a ofegante.

— Desde então fico acordada pensando no que assistir. Uma parte minha tão preciosa sendo mastigada. A cena me fez pensar seriamente em lutar contra os malfeitores que tentam me matar por um bem maior. – virou-se para a irmã, porém não manteve o contato visual por muito tempo, pois se esticou até o travesseiro na poltrona ao lado – Meu coração é precioso, Eva.

— Podemos resolver. – prometeu com os olhos mergulhados em lágrimas.

— Sabemos que você não tem muito tempo, ao contrário de mim. Minhas paixões seguem vivas no meu coração, são poucas, mas me confortam em dias que você me assombra. Então, por favor, apenas morra.

— Ele saberá! – ergueu a mão até o pulso de Jude, tremendo.

— Espero que sim, e sofra por não poder me acusar.

Ela nunca matou ninguém, mas foi morta milhares de vezes.

Jude odiava Eva por milhares de motivos, e era a primeira vez que pensava em mata-la, mesmo sendo ela sua maior assassina. Era melhor quando agia da maneira mais desapropriada, batendo-se para culpar a irmã mais velha, ao ponto de considerar ser mais vantajoso jogar-se da escada a viver mais um segundo sendo repreendida por amar.

Acreditou que seria difícil aniquilar uma vida. Em momento algum a sombra de Eva a deixou naquele imenso mundo. Nasceu sabendo que estaria para sempre vivendo para ela. No entanto, sufoca-la até a morte com o travesseiro do namorado tão assustador fez com que Jude sorrisse genuinamente, respirando aliviada a cada batida do seu amado coração.

Eva não conseguiu lutar, e seu corpo cedeu à morte.

Jude jogou o travesseiro na poltrona e encarou passivamente o rosto corado de Eva. Mesmo morta conseguia ser uma criatura poética, digna de afeição e amor.

— Garoto nenhum vai querer namorar uma cega. – repetiu as palavras de Eva no dia em que esteve internada com um traumatismo craniano – E que homem vai querer trepar com uma morta?

As circunstâncias não acusaram a verdadeira ceifadora de Eva. Ela já estava visitando a morte com frequências, então fazia sentido que em algum momento sua alma não retornasse para o corpo que esperava pacientemente.

A notícia paralisou seus pais, principalmente a mãe. Ela amava a filha mais velha de todo o coração, e acreditava veemente que Jude não era um bom sinal. No entanto, havia seu pai, o único que realmente parecia pensar na filha alguns mais nova, dando a ela conforto por sua má sorte. Apenas um dele compareceu ao sepultamento de Eva, enquanto o outro preferiu manter seus pecados no quarto ao lado.

Dizem que a primeira morte assusta e se torna motivo para pesadelos constantes, mas nunca ocorreu com Judith. Ela ficou feliz com o fim. Na verdade, acreditava que na segunda vez que fosse protagonista de outro homicídio faria com mais facilidade. Nunca chegou a ver ou sentir o fantasma de Eva, porque talvez ela estivesse ocupada vivenciando a eternidade, longe das dores que buscou em um bisturi.

Uma parte de Jude sabia que o adeus traria de volta sua liberdade, e talvez pudesse viver como uma mulher normal naquele mundo desconhecido, porém não fazia ideia que o grande motivo da ira de Eva voltaria para se despedir com flores frescas.

Ela era um monstro escondida na pele de uma ovelha, e encontrou outro monstro sorrateiro em Charles quando ele ousou pensar que sairia ileso do jogo que moldou para a sua própria diversão.

Jude matou Eva.

Jude feriu o próprio corpo para culpar Eva.

Jude desejou que a doença fosse mais forte que o corpo de Eva.

Jude rezou para que não houvesse justiça alguma para Eva.

E em dias conflituosos, ela se perguntava quem seria capaz de enfrentar seus carcereiros.

Sentada o mais longe do Sol, eles planejaram tirar mais que seus órgãos, mas também a chance dela ter filhos algum dia, ou permanecer viva com os seus cabelos. Retirar um coração não parecia mais um ato criminoso e desumano, e sim necessário.

Eles só não imaginavam que lidavam com uma mulher que merecia ser queimada viva por religiosos.

Jude não só matou Eva, como também cativou o mais cruel dos homens.

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