Armação

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Desculpa, eu acho que eu não entendi direito. - disse Letícia, olhando para Daniel como se ele tivesse enlouquecido.

Daniel se sentou no sofá ao lado de Letícia e a encarou.

– Eu tô falando sério. Poxa, Letícia, o que é que custa você me ajudar? Você só precisa fingir que é minha namorada por uns quarenta minutos, depois do jantar vamos embora e nunca mais falamos nisso. Por favor!

Letícia não podia acreditar naquilo. Ele só podia estar de brincadeira.

– Fingir ser sua namorada, Daniel? Você ficou maluco?! - ela exclamou, acertando a cara dele com uma almofada.

– Olha, agora já era. Eu já liguei pra Paula, já está tudo combinado, certo?

Letícia o fuzilou com o olhar. Aquilo parecia uma piada. E muito sem graça, por sinal.

– Daniel, eu não vou fazer parte dessa armação boba que você arranjou pra fazer ciúme na sua ex. Sem chance.

– Não é pra fazer ciúme, tá legal? É pra defender a minha honra. Há dois anos, ela me chutou dizendo que eu era "um moleque irresponsável e mimado que garota nenhuma em sã consciência poderia suportar num relacionamento". - disse Daniel, usando uma vozinha fina e afetada para tentar imitar o tom de voz da ex-namorada.

– Olha, o que ela disse até que faz sentido - provocou Letícia.

– Nossa, como você é engraçada. - ironizou o rapaz.

– Daniel, aceite: isso nunca daria certo. A vida não é um filme de comédia romântica, sabia? Mesmo que eu aceitasse participar dessa sua maluquice, é claro que essa mentira não vai colar. Se eu fosse você, ligaria pra ela desmarcando esse jantar agora mesmo.

Daniel respirou fundo. Teria que se empenhar mais, tentar fazer um drama mais convincente.

– Eu não estaria insistindo tanto se isso não fosse importante pra mim. É o meu orgulho que está em jogo! Minha dignidade como ser humano!

Letícia não pôde conter uma risada enquanto ouvia aquele discurso exageradamente dramático.

– Admita logo que você ainda gosta dela e só quer tentar impressioná-la pra fazer com que ela volte a se interessar por você. - disse Letícia, em um tom de voz implicante.

– Mas que droga, eu já disse que não gosto mais dela. Só quero provar que ela estava errada sobre mim. Só queria ter o prazer de esfregar na cara dela o fato de que eu sei muito bem como manter um relacionamento sério.

– Só que você não sabe. Nunca soube. - retrucou Letícia.

– E aí, você vai me ajudar ou não? Vai mesmo me negar um favor? Quer dizer que você ajuda criancinhas carentes da periferia e se recusa a fazer caridade para um amigo querido que você conhece desde sempre? É isso mesmo, senhorita Letícia? - pressionou Daniel, usando o último recurso argumentativo.

Aquilo estava ficando cada vez mais ridículo, pensou Letícia.

– Eu também tenho uma pergunta para você, "amigo querido". Já que você conhece todas as garotas de Brasília, porque não chama uma delas pra fingir ser a sua namoradinha no jantar? Por que é que tem que ser justamente eu a entrar nessa furada?

Daniel a olhou em silêncio por alguns segundos.

– Bem, porque... Está em cima da hora, eu não teria tempo de convencer ninguém além de você. E além disso, eu quero você. Você me conhece melhor que qualquer namorada que eu já tive, eu não ficaria à vontade com outra pessoa.

A garota ficou extremamente confusa ao ouvir o que ele dissera. O que ele queria dizer com aquilo, afinal de contas? Bem, talvez ele estivesse falando aquelas coisas pra fazê-la concordar com o plano bobo dele.

– Olha, Daniel... Eu minto muito mal e você sabe disso. Então...

– Por favor. - ele implorou, tentando reproduzir uma carinha de cachorrinho abandonado.

Letícia suspirou e finalmente cedeu:

– Está bem, mas você fica me devendo uma.

Daniel comemorou e a agradeceu animadamente, enquanto pensava que, em meio àquela montanha de dívidas, uma a mais não faria tanta diferença.

– E a gente não vai se beijar, tá legal? - advertiu Letícia.

A animação dele diminuiu um pouco.

– Mas, Letícia, isso faz parte da atuação!

– Desista.

– Se a gente não se beijar, a Paula vai achar que nós não somos um casal super apaixonado. - argumentou o rapaz.

– Não, ela vai achar que nós somos um casal educado que não fica se pegando em locais públicos. - disse Letícia.

Daniel bufou e já ia fazer algum comentário sobre o quanto ela era chata, mas conseguiu se conter. Não queria que ela se irritasse e desistisse do plano.

Sob o Mesmo TetoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora