1 - OS MESMOS OLHOS AZUIS

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(DEZ ANOS DEPOIS)


Respiro fundo e entro com o pé direito, pronto para enfrentar mais um dia na selva adolescente chamada, ensino médio. As mesmas pessoas de todos os dias, os atletas fortes e bonitos que não pensam em outra coisa a não ser "curtir a vida"; as líderes de torcida, lindas e sensuais desfilando pelos corredores se achando um máximo, mas aposto que nenhuma delas é capaz de soletrar a palavra paralelepípedo; os roqueiros; os talentosos; as fofoqueiras; os simpáticos; as metidas; enfim, as pessoas de todos os dias, nenhuma novidade.

Faço um grande esforço para entender a aula de química, e outro ainda maior para suportar a de cálculos. Então depois de mais algumas aulas e de um almoço com um dos meus livros favoritos, chega a tão esperada última aula.

Antes de ir para a aula de história, passo no meu armário e pego alguns livros. Encontro um papel com a programação de aulas que estarão disponíveis no próximo semestre e começo a ler a caminho da sala. Não estarei aqui no próximo semestre, pois esse é o meu último, mas estou curioso para saber se a escola evoluiu na programação.

Matérias:

Cálculo avançado

Música

Teatro

Robótica

Astronomia

Isso não é justo, só porque eu amo astronomia eles têm que colocar a matéria quando eu não vou está mais na...

Sem perceber, entretido com o papel da programação, acabou esbarrando em alguém e meus livros vão direto para o chão.

Abaixo de imediato para recolhe-los.

— Me desculpe — um garoto fala, enquanto pego os meus livros sozinho.

— Você pelo menos poderia ter me ajudado — reclamo me levantando.

Fico de frente para o garoto, meu coração dispara, ele está diferente, mais alto, mais forte, com uma barba rala, mas é o mesmo cabelo escuro, os mesmos olhos azuis.

— James? — pergunto ainda sem acreditar.

— Joe? — ele pergunta, também surpreso, abrindo um lindo sorriso.

A minha vontade é de abraça-lo e aperta-lo, ter certeza que ele realmente está aqui, mas a única coisa que eu consigo é dizer:

— Quando tempo.

Eu observo os seus olhos, apesar deles parecerem iguais, eles estão diferentes, James olha na minha direção, mas não diretamente para mim.

— Sete anos, para ser mais exato. Me desculpe de novo, foi muita burrice minha tentar andar pela escola nova sem a bengala — ele comenta.

— Bengala? — deixo escapar.

Então olho a sua mão, ele segura uma bengala dobrável e antes que eu possa concluir qualquer coisa ele me diz:

— Eu fiquei cego há três anos.

— Nossa. Sinto muito — digo quase sem voz, surpreso e triste ao mesmo tempo.

O sinal toca.

— Tudo bem. Tenho que ir para aula de história — ele diz sem jeito.

— Eu também tenho aula de história agora. Você é da minha turma?

— Sr. Sullivan? — ele me pergunta se referindo ao professor.

— É ele mesmo, você pode vir comigo se quiser — fico meio sem graça.

— Eu aceito a sua carona — ele sorri. — Posso segurar no seu braço?

— Claro — ele coloca o seu braço envolta do meu — Só por segurança, eu acho melhor você usar a bengala também, eu não sou lá a uma pessoa muito hábil.

— Um desastrado e um cego, que bela dupla formamos — ele ri e abre a bengala.É bom saber que ele ainda tem o mesmo senso de humor.

Chegamos à sala do Sr. Sullivan, e como esperava, ela já está cheia e todos os olhos observam a nossa entrada. Acompanho o James até o professor para que ele possa se apresentar e entrega o papel da diretoria, depois, sentamos nas primeiras cadeiras vagas na parte da frente.

— Pessoal? — o Sr. Sullivan chama a atenção dos alunos que estão conversando. — Este é James Cameron, ele é aluno novo, espero que sejam legais com ele.

James solta um sorriso tímido e o professor dá seguimento a sua aula. É tão estranho, eu e o James não nos vemos desde os 10 anos de idade e agora ele esta aqui na minha frente com 17 anos, totalmente diferente, mas ao mesmo tempo igual. Tem tantas coisas que eu quero perguntar pra ele.

A aula desta vez está passando rápida, mesmo sendo um tédio, o que dá indiretamente a oportunidade dos comentários sobre o assunto do momento surgirem. Não estou nem um pouco preocupado com o pensamento das pessoas, principalmente dessas pessoas, mas é inevitável ouvir de vez em quando algo como "Nossa ele é um gato" ou "Agora o viado tem namorado?".

O sinal toca indicando o final da aula. Mais um dia vencido.

— Joe, será que você pode me acompanhar até a minha antiga casa? É que minha mãe teve que sair e só vai poder me buscar mais tarde, só que eu não quero ficar aqui esperando — James explica.

— Claro — respondo sem pensar duas vezes — Mas eu estou sem o meu carro hoje.

— Sem problema, isso é bom, assim podemos colocar o papo em dia — ele responde.

Além dos seus olhosOnde histórias criam vida. Descubra agora