Right Now

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Abbie respirou fundo contemplando a casa dos pais do Liam. Há meses que ao passar por aquela casa a ruiva ignorava totalmente o facto de lá ter vivido o seu melhor amigo e de ter passado com ele toda a sua vida. Tudo estava exatamente igual, pelo menos no exterior.

Abbie? – o pai de Liam perguntou ao ver a rapariga parada em frente da porta de entrada, enquanto descalçava as luvas que usava e que estavam sujas de terra por causa da jardinagem, um dos seus passatempos favoritos.

— Eu mesma – a rapariga pousou a caixa que carregava numa das três escadas e dirigiu-se a Geoff para o abraçar como tantas vezes o tinha feito.

— Há muito tempo que não vinhas aqui. Pensavas que te tinhas esquecido de nós – o homem falou com um sorriso. É claro que estava feliz por ver Abbie novamente dentro dos muros daquela casa mas não podia negar que a rapariga o fazia lembrar do filho.

— Nunca – garantiu-lhe. Olhou em volta preparando-se mentalmente e continuou — Eu preciso de um favor.

— Claro!

— Eu queria ir ao quarto de Liam – um nó começava a formar-se na garganta dela. Imaginava o quarto do melhor amigo com tudo empacotado, um sinal de que os seus pais tinham seguido em frente.

Geoff arregalou os olhos e apenas imitou um "oh" como sinal de surpresa. Passou por Abbie e fez um sinal para que ela o seguisse. Pegou na caixa que a rapariga tinha levado e conduziu-a até às traseiras onde entraram pela porta da cozinha. Karen estava à volta de alguns ingredientes a tentar fazer uma nova receita se sobremesa gelada.

— Querida – o pai de Liam chamou a mulher que, no momento em que viu Abbie, correi para a abraçar.

— Tive tantas saudades Abbie! Nem imaginas as saudades que fazes para a alegria desta casa! – a mulher falou. De repente, a ruiva percebeu que ensinou Liam a dar abraços porque os da sua mãe eram tão reconfortantes como os dele.

— É – a rapariga limitou-se a responder. Nunca foi dela ser tímida com os pais de Liam, mas agora, ali, tudo o que ela estava a tentar esquecer estava a voltar rápido demais.

Mas era isso mesmo. Liam iria querer que ela seguisse em frente, não que se esquecesse dela, mas que continuasse a viver e alcançasse os seus objetivos. Agora ela tinha a certeza disso. Liam tinha-se transformado num anjo lindo e algum dia, no futuro, Abbie iria juntar-se a ele.

— Karen, a Abbie quer ver o quarto de Liam – Geoff olhou para a mulher de olhos quase fechados, a pesarem de tanta dor.

Karen tremeu e ficou a olhar para a ruiva por momentos enquanto algumas lágrimas se formavam no canto dos seus olhos. Ela logo tratou de as limpar e depois fungou sorrindo. Deu a mão a Abbie e puxou-a escadas a cima. Geoff seguia-as devagar.

Segunda porta à esquerda, era esse o quarto do moreno. O lugar onde ambos os amigos se refugiavam, brincavam, contavam um ao outro as suas vidas. O lugar onde nasceu o amor deles.

— Está tudo igual, não tivemos coragem de mexer em nada. Afinal de contas, ele continua a ser o nosso Liam – Karen lançou um meio sorriso à mais nova e destrancou a porta do quarto — Fica à vontade.

A ruiva estava sozinha no espaço. Os pais de Liam não tinham mentido, tudo estava exatamente igual, afinal, há mais de seis meses que o quarto permanecia fechado. A dor de olhar para o lugar onde outrora o nosso filho dormia devia ser arrebatadora. Apesar de Abbie não ter reparado antes, Geoff tinha deixado a sua pequena caixa em cima da cama.

Pegou nela e pô-la no seu colo, sentando-se no chão e encostando-se aos pés da cama. A sua velha caixa de recordações. Nela estavam guardadas todas as coisas que fizera com o seu melhor amigo, alguns objetos, cartas que tinham escrito um para o outro, pequenas mensagens, aviõezinhos de papel.

A janela do quarto estava fechada. Abbie levantou-se e ligou o candeeiro de lava que estava pousado na mesa de cabeceira, desligando a luz geral do quarto em seguida. Voltou a deitar-se na cama e abraçou-se ao boneco do super homem que tinha oferecido ao Liam quando ele fez dez anos. Ao inspirar fundo ainda podia sentir o cheiro do perfume que ele usava. O seu aroma favorito.

Sem dar conta disso o rosto de Abbie já estava molhado e ela soluçava alto. O seu choro era desesperado e quanto mais ela sentia que chorava, mais de abraçava ao ao boneco de tamanho médio. De alguma maneira sentia-se mais perto de Liam se o fizesse. Mas ela tinha que se despedir, por mais que não o quisesse, ela tinha de se afastar daquela estranho obsessão.

Pegou numa folha e na sua fiel caneta que trouxe junto com a caixa de recordações e começou a escrever aquela que ela prometera ser a ultima vez que falava com o seu melhor amigo. A sua última carta.

"20 de Fevereiro de 2014

As pessoas dizem que nunca é tarde demais. Pois elas não sabem o quanto estão erradas. Eu sei que este é um horrível começo de carta, mas é a mais pura das verdades. Elas parecem esquecer-se de como a vida é curta. Eu esqueci-me e vivi presa ao passado todo este tempo, como se tivesse uma venda a impedir-me de ver, tal e qual como no jogo da cabra cega que ambos jogávamos quando eramos crianças. O tempo passa e o medo sempre fica. É ele que nos trama sabes? Sabemos que é tarde demais quando as pessoas que amamos desaparecem e nós não temos coragem sequer para lhes dizer o quanto significam para nós. Sabemos que é tarde demais quando o nosso interior nos diz que a insegurança é a coisa mais idiota de se sentir. Eu soube que era tarde demais quando toda a mina família e amigos estavam reunidos na sala de estar para me dar aquela notícia. Em parte chorei por não te ir ver nunca mais, mas chorei principalmente por não ter tido coragem de dizer que te amava. Agora chegou o momento de deixar tudo para trás, guardar todas as lágrimas e sofrimento e seguir com a minha vida como tu terias desejado. Não te vou esquecer. Aliás, como o poderia fazer? Foste tu que me tornas-te na pessoa que sou hoje. És tu que me vais tornar na mulher que serei no futuro, porque quando as pessoas estão aí, no Céu, as coisas tornam-se mais fáceis. Tu vais ajudar-me. Eu sei que vais. Eu vou crescer, seguir os meus sonhos e mudar o mundo. Eu vou fazer a diferença assim como tu fizeste. Eu amei-te, amo-te e sempre vou amar-te. Todos os grãos de areia da nossa praia favorita multiplicado por todas as estrelas que contamos do telhado da minha casa. Uma vez disseram-me que somos feitos de pó de estrelas, mas eu sei que há estrelas que brilham mais que outras. Porque eu sou uma estrela azul, nunca vou parar de brilhar para ti. Nunca me esqueças. Um dia vamos estar juntos. Um dia vamos ser estrelas alcançáveis ao olhar de todos, mas inalcançáveis ao toque"

Abbie selou o último envelope e colocou-o junto às outras cartas. Pousou-as em cima da secretária de Liam, ao lado de uma fotografia dos dois tirada na rua onde moravam e deixou a caixa aos pés da cama. Apagou o candeeiro de lava e deixou-se caminhar no escuro até sair do quarto. Olhou para ele uma última vez e fecho-o à chave. Sabia que podia voltar lá quantas vezes ela quisesse. Karen e Geoff iriam apoiar as suas decisões. Agora, estava na hora de brilhar.

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