Capítulo 36 - O soar das trombetas

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— O dia está nublado. Isso não é bom. — Emese murmurou para si mesma, seus olhos fixos à frente, onde as paredes do castelo se faziam visíveis por detrás da vegetação que adquirira o aspecto seco, característico do Outono. O vento frio soprou contra seus cabelos como um mau presságio, ou talvez fosse somente o seu medo irracional por Desmond.

Apertou a mão com firmeza contra peito, sentindo o ardor reconfortante do corte que havia feito em si mesma. Um na palma de sua mão, outra na palma da mão de Desmond. E esta seria toda a sua ligação com ele durante as próximas horas, ou pelo menos durante o tempo que levaria para encontrá-lo novamente.

— Estamos no terreno dos malditos demônios — Jago resmundou — isso não é bom.

Ignorando-o, Emese apeou o cavalo até um barranco, onde o terreno era mais alto e permitia que visse com clareza o percurso da volta. O jovem Antonije a seguiu, pálido como um pergaminho de papel, e ela não podia culpá-lo. O pobre rapaz havia perdido sua família naquele lugar.

— Senhora — Ele chamou, timidamente — Gostaria de fazer um pedido.

— Sim? — Ela alteou uma sobrancelha ruiva, voltando-se para ele tão logo desmontou do cavalo.

Antonije a imitou, sem deixar de acariciar o lombo do animal. Fosse para tranqüilizar a ele ou a si mesmo, ela não sabia.

— Quando estiver lá... No castelo. — Ele engoliu em seco — Faça uma prece por Eilenah, por favor. Diga a ela que eu sinto muito.

O pedido a enterneceu, tanto ou mais quanto a expressão suplicante no olhar que havia perdido precocemente o brilho infantil. Emese se aproximou, segurando uma de suas mãos com firmeza.

— É claro, querido. Eu prometo.

— O tempo está passando. — Jago se aproximou, impaciente, parando próximo a eles. Emese bufou em resposta, apertando a mão de Antonije com carinho antes de dar a volta em seu cavalo, onde uma trouxa de couro ia pendurada.

Ela a desprendeu sem muita delicadeza, usando uma adaga para cortar a linha que a prendia.

— Aqui. Tomem isto. — Disse, atirando a trouxa em direção a Jago — Devem passar no corpo, vai ajudar a esconder o cheiro.

— Como seu bastardo nos encontrará? — Jago respondeu, com uma nota de desdém.

— Ele saberá. — Retrucou, secamente.

Como se houvesse um imã, seu olhar foi em direção à muralha cinzenta novamente. A visão enviou um calafrio até a ponta de seus dedos, sacudindo-a com as piores recordações de sua vida. Mal podia acreditar que Alex estava preso, onde ela estivera antes, e agora acabava de enviar seu filho para lá.

— Esperem onde combinamos, não se arrisquem além do necessário. — Ouviu a própria voz soar, de modo automático.

Eles assentiram, e Jago respondeu, com uma voz surpreendentemente sóbria:

— Até o pôr-do-sol, bruxa.

***

Cerca de 6 meses antes, quando rompera – o que quer que tivesse – com Sefic, Desmond havia percorrido aquele mesmo caminho. Conhecia a localização de cada torre e cada guarita, estudou cada ponto cego por onde pudesse se esgueirar sem chamar atenção até a poterna que o levaria para o outro lado dos muros que circundavam o castelo.

Liberdade, pensara, em meio à revolta que sentia por ter sido humilhado mais uma vez. Podia ser um bastardo e um mestiço, alguém que jamais teria uma cadeira ao lado de seu pai, mas era um bom guerreiro. Seu lugar não era como um soldado de base, alguém meramente decorativo, e o maldito Sefic sabia disso. Fizera de propósito para feri-lo e havia conseguido.

O Príncipe BastardoOnde histórias criam vida. Descubra agora