Presentes de Aniversário

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O outono passou tão rápido quanto uma chuva de poucas nuvens. Um inverno pouco rigoroso chegou, e meu posto de comandante perdurava sem muitas aflições.

Nos primeiros dias eu mal dormia, mal comia e mal sorria. O medo do erro, das más escolhas e da insatisfação dos homens me fez ser cauteloso até com o pé que eu colocava primeiro para fora da cama.

Na tentativa de me mostrar eficaz, passei a relembrar o possível de tudo o que aprendi com meu pai, estabelecendo minhas prioridades. Pensei nas reuniões do conselho que participei e no que era discutido, nas poucas viagens que fiz e como meu pai se comportava perante os problemas, sempre buscando imita-lo, como se eu fosse o próprio Jarl.

Convencido das minhas responsabilidades, fiz o que se espera de um comandante: o comando. Juntei-me a batedores para tomar conhecimento da região; busquei alternativas de rotas de acesso e saída do forte; analisei o acampamento de Falkirk ao norte, retornando a cada oito dias com mais dois homens para notar alterações; e organizei as tropas em sentinelas, batedores, espiões, emissários, caçadores e pelotões táticos para futuros confrontos.

Nenhuma dessas escolhas veio de súbito. À medida que a necessidade surgia, eu conseguia contorna-la, sempre contando com a ajuda de Cenwulf, Haesten ou Althes. Tudo corria bem, pois assim fiz como meu pai dissera: "o pior líder é aquele que usa os olhos dos outros para ver, a boca dos outros para falar, os ouvidos dos outros para ouvir, a mão dos outros para atacar e a bunda dos outros para cagar; se quer algo do seu jeito, faça você mesmo."

Óbvio que a confiança nos homens é necessária. Porém, é incompetente o líder que dá ordens atrás de uma mesa com uma coxa de frango na mão e uma prostituta no colo. E percebi que as tropas respeitavam a minha participação e interesse nos afazeres. Eles se sentiam mais valorizados por me ter ao lado, trabalhando e estando atento, pronto para orienta-los.

Cenwulf e Haesten eram de ótima serventia, e me auxiliavam a manter a ordem. Visitaram comigo cada pedra daquela construção, concordando, no fim, com a invencibilidade do lugar: Pedras de setenta centímetros de largura; portão duplo de ferro bruto; e muro com espaço de três homens lado a lado, sem esquecer as torres e suas ameias.

O castelo possuía uma antecâmara na entrada, um salão de audiências sem trono e com dois grossos pilares de sustentação quadrados, cozinhas anexadas, quatro torreões nas angulações, dois níveis acima com aposentos e acesso ao teto, e um nível abaixo com celas escuras e húmidas; tudo feito de pedras lisas, cinzas e desprovidas de adornos. Questionei a Althes sobre o estado em que encontraram o lugar, e ele respondeu que fora do mesmo jeito que meus olhos viam.

Fiquei apaixonado pelo lugar, e imensamente curioso com sua história. Como os demônios lutaram contra homens com defesas formidáveis? Por que não há sinais de destruição? Por que não há nada além das paredes frias?

Segredos que jamais seriam revelados, e que o tempo levaria ao esquecimento.


No quinto dia de inverno, um pelotão vindo do Baldur chegara com provisões para a estação. Estavam atrasados e traziam animais para o abate, carne seca, massa, fermento, grãos, cevada, vinho e água; muita água. Estávamos longe e sem contato com qualquer fonte, lago ou rio para nos abastecermos: um problema que me preocupou bastante.

"Como falei antes: temos que derrotar Falkirk," disse Cenwulf. "Na floresta além deles há uma nascente que desce das montanhas, transforma-se em cachoeira e cria um lago ao redor. É bem provável que era de lá, que este forte se mantinha abastecido."

Ele estava certo, e cedo ou tarde seu aviso seria atendido.

Depois que os homens do Baldur se estabeleceram, subi para os meus aposentos para jantar; sempre isolado, pois precisava remover a máscara que ocultava minha face. Olhei pela abertura a leste, e vi a neve que caía dentro. Pensei em Kirt, meu lar, e em como meu pai e meu mestre estavam indo, tentando esconder minha existência. Talvez eu nunca voltasse a vê-los, dependendo do tempo que eu levaria para acabar com aquela guerra sonolenta. Aliás, se eu acabar.

Confissões de um Rei - ExílioOpowieści tętniące życiem. Odkryj je teraz