15. Calor

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Mark ficou em silêncio durante alguns instantes. Anne havia acabado de relatar todo o acontecido na casa de Jake e ele não sabia qual era a melhor forma de reagir.

- Eu não sei o que dizer, Anne. Isso tudo foi tão rápido.

- Muito rápido - disse ela sorrindo.

- Como será que Jake lidará com isso?

- Ele virá atrás de mim. Tenho certeza. Posso esperar por isso.

- E o que você vai fazer?

- Minha decisão já foi tomada, Mark. Não vou voltar atrás. Já sofri demais por Jake. Não sou a melhor pessoa do mundo, mas sei que também não mereço isso.

Mark assentiu quase imperceptível. Anne deu um tapinha nos joelhos e sorriu.

- Acho que hoje eu vou almoçar na sua casa - disse ela colocando um ponto final no assunto.

Mark já havia até esquecido desse detalhe. Havia prometido preparar o almoço, numa tentativa horrível de render assunto e agora estava na hora de cumprir.

O relógio já marcava meio dia e dez quando Mark entrou na cozinha. Teria que se virar e preparar algo prático, rápido e que ficasse gostoso. Vasculhou a geladeira e pegou dois pedaços de costela de porco e uma embalagem de molho barbecue. Separou um pouco de arroz e colocou para cozinhar. Dois pequenos tomates foram colocados na pia para serem lavados e picados.

Durante a meia hora seguinte Mark ficou sozinho na cozinha, até que reparou que Anne havia chegado à porta e estava o observando. Tudo que estava no fogão agora parecia que ia sair errado. Ele nunca havia cozinhado com alguém olhando e a experiência para ele não parecia nada convidativa.

Então Anne andou até o fogão e abriu a panela onde estava cozinhando as costelas. Com o garfo, virou as duas peças de carne com uma agilidade totalmente feminina.

- Acho que você está precisando de ajuda - disse ela sem olhar para Mark.

Ele corou e secou as mãos no avental.

- Fique à vontade - respondeu Mark.

Ela olhou para ele e riu alto. O som ecoou na cozinha e Mark não pôde deixar de acompanhar, mesmo não sabendo o motivo, mas certamente nervoso.

- O que foi?

- Você ficou uma graça nesse avental de bolinhas.

Mark olhou para baixo um pouco surpreso, como se fosse a primeira vez que visse os detalhes do tecido.

- Ah sim, foi um presente que ganhei no último Natal.

- Belo presente.

- Bom, eu precisava de um desses. Minhas camisas viviam manchadas de molho de tomate.

Anne virou-se de frente para Mark e o encarou. O olhar dela era tão intenso que ele sentiu-se subitamente incomodado. Mark sentiu seus músculos estremecerem levemente. Seus corpos estavam tão próximos que à distância de um braço poderiam tocar um ao outro.

Mark não ousaria tocar em Anne, não sem o consentimento dela. Ele sabia que ela estava fragilizada emocionante e não se aproveitaria da situação.

Ela estendeu a mão e colocou-a no peito de Mark e como de houvesse despertado de um transe, puxou as cordinhas do avental em volta do pescoço de Mark para cima. Ele prendeu a respiração e ela sorriu.

- Francamente, você ainda não sabe arrumar essas cordinhas. Estão enroladas.

Anne colocou a outra mão do outro lado e arrumou demoradamente o avental em volta do pescoço de Mark.

- Assim está melhor.

Mark ficou parado por alguns instantes, sem saber o que faria a seguir. Ela o havia tocado tão inesperadamente que ele não sabia se aquilo era um flerte, ou se era apenas uma gentileza.

Agora ele havia percebido que os três anos de solidão tinham apenas contribuído para que ele esquecesse como agir com uma mulher. Ou então, os encantos de Anne estavam deixando-o sem ação.

- Obrigado, - disse ele - eu... eu não...

- Mark - ela interrompeu - você está confuso e eu também. Não vou forçar a barra. Nós teremos tempo para pensar em nós dois.

Ela era uma mulher decidida. Aos olhos de Mark, a mulher mais decidida que ele já vira.

O restante do preparo do almoço seguiu-se em silêncio, pontuado apenas pelos tilintar dos talheres e do som de cozimento. No final, Mark arrumou a mesa e eles serviram-se da comida.

- Está uma delícia! - exclamou Anne - Muito bom.

- Obrigado. Este é o meu prato preferido. Me aperfeiçoei de tanto repetir.

- Não acredito que este seja o único que saia bom.

- Claro que não - respondeu Mark de uma forma zombeteira - também sei fazer macarrão instantâneo, hambúrguer e batatas fritas.

- Ah, sim! - disse Anne com um sorriso - Suas veias agradecem. Espero que você não seja sedentário também.

- Não sou. - disse ele olhando para o lado - Faço caminhadas diariamente.

- Sério?

- Não. Eu parei um pouco antes de te conhecer.

- Ok. Ainda há tempo para continuar. E também consultar um cardiologista - disse ela sorrindo.

Mark franziu o cenho, falsamente decepcionado.

- Não é para tanto.

O restante do almoço foi pontuado de diálogos simples. Nenhum dos dois tocou em qualquer assunto que envolvesse algum relacionamento. Por fim, Anne consultou o relógio, que já marcava quase duas da tarde.

- Mark, eu preciso ir. Ainda tenho um dia de trabalho pela frente.

- Posso deixar você lá?

- Eu ficaria agradecida.

Eles se levantaram e Mark interrompeu Anne na tarefa de levar as louças para a pia.

- Não se preocupe. Eu faço isso - disse ele, colocando a mão no braço dela.

- Eu posso...

- Nada disso. Você é minha convidada. Eu faço.

Ele pegou as louças da mão da mulher, juntou o restante e colocou na pia. Caminharam até a porta da sala e quando Mark estendeu a mão para girar a maçaneta, Anne pousou a sua mão sobre a dele.

Estavam novamente próximos demais. Inesperadamente Anne passou de forma desajeitada as mãos pelas costas de Mark, puxando-o para um abraço apertado. Ele prendeu a respiração por um instante e deixou suas mãos repousarem levemente sobre os cabelos de Anne.

O perfume dela subia e ele se sentiu inebriado pelo cheiro de flores. Apertou-a contra seu peito na esperança de que aquele momento jamais acabasse. Seus olhos se fecharam quando recostou seu queixo na cabeça de Anne. Ele sentiu o coração da mulher pulsando contra seu peito e o seu próprio se acelerava, deixando levar-se pela emoção daquele momento.

Mark sentiu o calor do corpo de Anne se juntando com o seu e percebeu que em algum momento, naquele turbilhão de sentimentos, tudo daria certo para eles.

Um inverno entre nós (CONCLUÍDO)Onde histórias criam vida. Descubra agora