Poço da Esmeralda

16 1 0
                                    


— Nunca pensei que conheceria um lugar assim — Janaína falou próximo ao ouvido de Maria, já que o barulho alto de música e conversas tornava o que ela tentava dizer quase que inaudível.

— Você nunca viajou?

— Não para tão longe...— E sentiu um frio e tristeza no estômago.

— As coisas mudam uma hora, não é? — Maria sorriu, tentando mudar o assunto.

A kombi ficou há alguns metros de onde a festa acontecia. Ao lado direito de onde todos estavam dançando, havia um rio com água verde claro, podendo-se observar o fundo. Muitas árvores cercava o local. Tantos pensamentos circundavam a mente de Janaína que ela nem poderia organizá-los, algo parecido acontecia com Maria, mas todas as questões que envolviam-na, era a respeito de Janaína.

— Poço da Esmeralda, nome interessante... Mas isso é um rio, não um poço.

— Você gosta mesmo de histórias, não é? — sorriu.

— Sempre gostei de histórias, não pelos personagens, mas pelos lugares onde eles nos levam, entende? — Janaína enrubesceu, acreditando que estava sendo inconveniente com todas as suas perguntas.

— Entendo, entendo... Mas não precisa ter vergonha não — disse dando dois tapinhas leves no ombro de Jana. — Se quiser eu te conto onde é o poço, te levo pra ver, mas só mais tarde, agora vamos curtir um pouco. Amanhã nós vamos pro festival na ilha, mas hoje isso aqui... — Maria abriu os braços e fechou os olhos enquanto falava — ... é tudo nosso!

— E é só um aperitivo do que vem amanhã, pelo jeito. — completou.

As duas foram até onde estava o grupo que acompanhou elas até ali, e começaram a dançar. Para Janaína todo o ineditismo de tudo que a cercava soava como mágica, para Maria olhar para os olhos de Jana enquanto dançava, que era mágico.

A noite logo apareceu, o sol começou a colorir o horizonte em tons laranjas e rosa. A sensação que dava naquele momento é de que a música começava a deixar todos em transe, juntamente com as luzes que tomaram forma com o escurecer. As pessoas dançavam como se esquecem o significado de cansaço, tristeza ou qualquer outro sentimento ou estado físico que as tirassem dali. Algumas pessoas dançavam na beira do rio, outros estavam sentados distante da música conversando sobre a vida, outros armavam as barracas para poderem dormir.

— Eu estou amando dançar aqui com você. — Janaína gritou para que Maria pudesse escutar, mas como se o destino irônico tivesse perseguido ela até ali, o som teve um pequeno defeito naquele exato momento, fazendo com que a voz dela ecoasse. As pessoas envolta viraram o rosto para ela, que se pudesse, cavava um buraco para se enfiar, envergonhada.

— Não precisava gritar, eu sei que você está gostando. — Maria sussurrou, em tom de deboche, tentando através dos sorrisos, manter Janaína calma. O som voltou logo em seguida e ouviu-se o DJ ao microfone pedir desculpas pela falha técnica. Todos voltaram a dançar, conversar ou qualquer outra coisa, como se nada tivesse acontecido. Já era tarde naquele momento, Maria chamou Janaína para ir para outro lugar.

As duas começaram a caminhar, a trilha por onde andavam começou a se estreitar e a floresta ficar mais densa. Jana olhava para os lados, observando cada detalhe. As cores das folhas, a lua clareando entre as árvores, o som dos pássaros e da água que ficava mais evidente a medida que se afastavam da música.

— Para onde vamos, afinal? — finalmente a voz dela podia soar naturalmente.

— Vou te contar a história. O que você achou que poderia significar Poço da Esmeralda, quando leu no panfleto?

— Um poço... verde? — riu.

— Acho que todos pensam isso — Maria sorriu de volta — Mas não é tão curta essa história...

— Eu ainda quero saber. — insistiu.

— Dizem que há muitos anos, uma mulher que morava em um sítio nas redondezas, fugiu de seu casamento, após sofrer abusos do seu marido. Mas o que ela não esperava, é que mesmo saindo de madrugada, sem nenhum barulho, ou ao menos ela imaginava que não havia feito... Bem, mesmo assim, o homem viu ela sair. Enfurecido ele perseguiu ela pela floresta até o poço. A mulher olhou o reflexo da lua na água e começou a chorar. Ela estava cansada de correr, e o homem já havia a alcançado. Ele a segurou pelo braço e disse que ela voltaria com ele... Em um ato de desespero ela se jogou no poço e se afogou. O que se conta é que nenhum dos dois sabiam nadar, por isso ela morreu e também por isso ele não a tirou de lá. — Maria respirou profundamente, passou a mão pelos fios curtos e depois olhou para Janaína, percebendo que ela enxugava uma lágrima sorrateira do canto do olho. — Eu sabia que a história era triste e por isso não quis te contar antes, mas não pensei que te atingiria dessa forma.

— Tudo bem... — engoliu a seco — eu vou ficar bem, só sou muito emotiva. — esboçou um sorriso amarelo — Bom, e o nome dela era Esmeralda, não é?

— Sim, é isso mesmo. Olha ali, chegamos.

— É lindo aqui, e talvez um pouco assustador. — janaína olhou para o céu, a lua estava linda, era lua cheia, seu brilho parecia se acentuar naquele lugar, refletindo na água de maneira única.

— Maria olhou para ela e sorriu — É lindo mesmo, não precisa ter medo.

As duas se sentaram na beira do poço, tiraram os sapatos e colocaram os pés na água, por alguns minutos ficaram em silêncio apenas sentindo tudo que aquele lugar transmitia. Apesar de tudo, era um local calmo e passava coisas boas, não coisas ruins como a história dizia. Maria encostou a cabeça no ombro de Janaína, e as duas deram um abraço, ali sentadas, sentiam como se conhecessem há muitos anos.

— Ai caramba! — Janaína arregalou os olhos.

— O que foi? Algo te mordeu?

— Não, que droga.

— Mas o que foi? — Maria começou a ficar preocupada com o tom de voz de Jana.

— Eu não tenho onde dormir, não tenho barraca, não tenho nada... Eu nem pensei nisso quando resolvi vir aqui do nada.

— Calma, você pode dormir comigo. — Maria sussurrou como se fosse um segredo o que dizia, e sorriu.

Instantâneo ⚢Where stories live. Discover now