5 - afundando cada vez mais

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Bernardo

Desperto com a ressaca martelando em minha cabeça e entro no banheiro sem disfarçar a carranca. Eu não devia ter bebido tanto na noite passada e assim que transei com a Carla, vesti minha roupa e voltei para casa.

Ainda tenho que ir à escola, claro.

Descarto o uniforme horrível e procuro uma roupa qualquer no guarda-roupa, vestindo-me totalmente de preto. Pego a chave da moto, minha mochila e passo pelo meu pai deitado no sofá.

Ignoro o forte cheiro de conhaque e saio de casa, mas não tranco a porta dessa vez. Bruno já está bem grandinho e sabe se cuidar, do jeito dele pelo menos.

Nossa vida virou uma merda depois que minha mãe morreu e desde então vivemos nessa casa sombria e malcheirosa; afinal de contas é o que nos restou.

— E aí — troco um cumprimento rápido com Lucas, um cara da minha classe, e sigo para meu lugar habitual. Dou uma olhada nos alunos, notando a ausência de Carla.

No intervalo, xingo o alarme estridente e deixo a sala de aula após mais um discurso monótono do professor de filosofia.

— Você tem alguma coisa pra mim hoje? — Eu me aproximo de Jefferson, parado no corredor com alguns amigos.

— Claro! — Ele sorri, olhando para os lados. Enfia a mão no bolso da calça, tirando de lá um pequeno pacote pardo, de tamanho suficiente para caber em minha mão. Ele me entrega o embrulho e eu lhe repasso a grana que trouxe, discretamente.

— Valeu. — Bato levemente em seu ombro.

— De nada. Quando precisar, é só pedir.

Eu me afasto ansioso para estrear essa belezinha. Sigo para os fundos do colégio, sentando em uma calçada qualquer. Dou uma olhada nos arredores e sorrio satisfeito. Sem plateia, ótimo.

Tiro o pacotinho de cocaína do bolso, rasgando a embalagem com pressa, revelando o pó em seu interior. Essa é a primeira vez que toco nisso e como Jefferson disse que é muito mais forte do que a maconha, decidi encomendar no dia anterior.

Sei que é perigoso, mas a minha consciência já tem erros demais para que eu me preocupe com isso; não quando a droga é uma válvula de escape para meus problemas e minha vida de merda.

Dou um jeito de enrolar o papel pardo até deixá-lo num formato bom para que eu possa usar a droga, e me permito esquecer os meus problemas por alguns minutos. Quando já estou distraído o suficiente, sinto um olhar sobre mim.

Que merda é essa?

Escondo a droga embaixo da camisa, com pressa, olhando para os lados. Estou louco pra pegar o maldito intruso.

Franzo o cenho, surpreendido, quando me deparo com ela.

A ceguinha.

O que diabos ela está fazendo aqui?!

Cecília está distraída, é óbvio, e não percebeu minha presença pela forma despreocupada como fecha os olhos. Vejo que está encostada à parede, com o uniforme do colégio e os cabelos soltos. Para minha consternação, está sem os óculos escuros e abre um sorriso suave; o vento jogando seus cabelos de volta contra o rosto.

Ignoro a sensação idiota que me percorre e meus olhos ficam imediatamente entrecerrados.

— E aí, ceguinha — digo, cínico, com um sorriso estampado no rosto quando a garota arregala os olhos, assustada. Ela não esperava por isso.

— Não me chame assim!

— Eu te chamo do jeito que me der vontade. Dá o fora daqui!

— E se eu não quiser?

Uma Luz Na EscuridãoWhere stories live. Discover now