Capítulo III (Parte V)

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Espantada com a percepção daquele homem, Anahí lutou para dominar suas emoções enquanto o observava servir a bebida, segurando o copo com um dos dedos dobrados sobre a borda, de modo a sentir o nível do liquido com a ponta e não derramar. Deu para sentir a satisfação dele, quando colocou o copo cheio na mesinha ao lado de sua poltrona, e pegou outro, que encheu até o mesmo nível, só que desta vez sem usar o dedo como indicador.

- Consegui colocar a mesma quantidade nos dois? – Alfonso perguntou, levantando os dois copos para que Anahí visse.

Ela concordou com um gesto de cabeça, admirada. Então, lembrando-se de que ele não podia ver, disse:

- Conseguiu sim!

- Ótimo!

O coração dela quase parou quando ele sorriu.

- Sabe, está ficando cada vez mais fácil julgar o nível da bebida pelo som e pelo peso do copo.

Pegando um dos copos, Anahí não pôde deixar de admirar a força de vontade daquele homem, que estava decidido a caminhar, sem medo, pelo mundo da escuridão. Ao mesmo tempo, a cada minuto que passava ficava mais fácil entender o medo que Belinda sentia dele.

- Fale-me sobre o novo noivo de Belinda – ele pediu. E com ironia continuou, antes que ela pudesse responder: - Sem dúvida, além de ser rico e poder enxergar, ele deve ser também muito bem relacionado.

Anahí respirou fundo.

- Bem, é, mas tenho certeza de que isso não teve nenhuma influência na decisão de minha irmã.

- E eu estou mais do que certo que teve.

- Belinda não é interesseira! Ela...

- Todas as mulheres são interesseiras! A riqueza é, para vocês, o que a pérola é para a ostra: uma coisa muito desejada, conseguida a duras penas e, depois de conseguida, guardada com unhas e dentes, de tal modo que só a morte pode separá-las.

-Você tem uma opinião muito ruim da garota que diz amar – Anahí comentou com voz rouca, espantada como grau de cinismo do grego.

- E que também dizia me amar! – ele lembrou com voz áspera. – Será que não tenho o direito de sentir desiludido, quando a mulher que dizia estar tão ansiosa para me amar, honrar e obedecer nem pôde esperar que eu saísse do hospital antes de me escrever declarando que, do seu ponto de vista, a minha cegueira a livrava de todas as obrigações que pudesse ter em relação a mim? Tive que consolar a enfermeira que leu aquela carta – continuou, com simplicidade. – Ela ficou tão deprimida, que fui acusado, por sua chefe, de fazê-la chorar.

- Oh, não! – Anahí estava agoniada de tanta vergonha. – Eu não sabia! Por favor, acredite em mim. Não pode imaginar quanto sinto que minha irmã tenha feito isso...

- Piedade de novo, Srta. Puente? – Alfonso voltou à zombaria. – Você á tão instável, emocionalmente, quanto a sua irmã, ao demonstrar que é incapaz de enfrentar as dificuldades.

- Não sou, não! – ela se defendeu, enxugando as lágrimas de vergonha que tinham subido a seus olhos.

- Então prove! – ele desafiou, num tom de voz incrivelmente suave.- A pior coisa da cegueira é o tédio. Não posso admirar a paisagem, não posso ler, e nem mesmo escrever uma carta. Eu não estou sozinho aqui, mas passo muito tempo só. As cartas que recebo são geralmente escritas em inglês, e Nikos não consegue lê-las, apesar de falar a sua língua relativamente bem. Se você é mesmo tão diferente de sua irmã, e deseja reparar o mal que ela me fez, fique aqui em Karios e seja os olhos através dos quais poderei ver, e as mãos através das quais poderei escrever!

Quando ele terminou de falar, levantou-se e apertou a campainha para chamar Nikos. Vendo que sua presença não era mais desejada, Anahí caminhou para a porta , deprimida demais para falar. Mas a voz dele a deteve, quando chegou à soleira:

- Pense a esse respeito, Srta. Puente, e me dê a sua resposta amanhã. E se achar que a sua presença aqui na minha casa pode dar motivos a falatórios desagradáveis, para a filha de um reverendo – Alfonso concluiu, com inacreditável pouco caso - não faço nenhuma objeção a que nos casemos.

A Substituta (Adaptada)Donde viven las historias. Descúbrelo ahora