Capítulo V (Parte III)

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Alfonso não podia ter deixado de ouvir a exclamação abafada que Anahí soltou, nem o barulho que fez ao se levantar, levada pelo orgulho.

- Parece-me que a grande desvantagem da riqueza é o medo de perdê-la – ela disse em voz baixa e calma. – Prefiro continuar como sou: pobre, mas raramente infeliz.

Os lábios másculos curvaram-se num sorriso de desprezo antes de Alfonso deixar bem claro que não acreditava em suas palavras, e que a colocava na mesma categoria das mulheres que tinham lhe escrito, oferecendo seus serviços em troca de benefícios que ele acabara de citar. E terminou, numa voz fria e zombeteira:

- Você me surpreende... Pensei que toda lagarta quisesse se transformar em uma linda borboleta!

Teria sido bem mais fácil, para Anahí, perder a calma, dizer-lhe algumas verdades e ir embora da ilha, para sempre. Alfonso estava usando a cegueira para liberar seu lado cruel, um lado que todo mundo tem, mas que a maioria dos seres humanos tenta suprimir. A ironia, o mau humor e a agressividade não eram causados pela cegueira: eram apenas partes de seu caráter, que desde o acidente se manifestavam de forma exagerada.

Quando voltou para o quarto, só um pensamento impediu-a de jogar seus poucos pertences numa mala e exigir que a levassem para Rodes: estar cega pelas lágrimas já era ruim; imagine, então, o que deveria ser ter que viver, para sempre, num mundo de escuridão total!

Anahí mal teve tempo para consertar o estrago feito pelas lágrimas, antes que Lira entrasse de supetão. Explodindo de felicidade e excitamento , a mocinha disse:

- Cris acabou de dar os retoques finais na suíte nupcial. A senhorita precisa ir ver o "sperveri". Ficou esplêndido! – E ela suspirou, juntando as mãos em frente ao peito.

- Suíte nupcial?! – Anahí repetiu bobamente, lançando um rápido olhar pelo quarto e não vendo nada de novo. – "Sperveri"... o que é isso pelo amor de deus?

Ela o viu, no momento em que pisou no quarto dominado por uma cama enorme, envolta completamente por uma cortina de seda, que caía desde o teto até o chão, de tal modo que os ocupantes da cama ficavam totalmente isolados do mundo exterior por dobras e mais dobras do tecido brilhante, inteiramente bordado à mão.

- É a cortina nupcial! – Ansiosa, Lira empurrou-a para frente. – Toda noiva grega tem uma. Geralmente, elas passam de geração a geração, mas , como a senhorita é estrangeira e, a bem dizer , o "Poncho" não tem família, as mulheres da ilha decidiram que o seu "sperveri" seria o presente delas. Desde o momento em que seu noivado foi anunciado, elas trabalharam dia e noite , revezando-se para terminá-lo a tempo. Veja – e ela puxou Anahí pela mão, enquanto a sorridente Cris afastava a cortina para o lado - , até as fronhas foram bordadas e enfeitadas com rendas!

Pasma, Anahí não conseguia dizer uma única palavra. Nunca tinha lhe passado pela cabeça a ideia de que teria que dividir um quarto com seu marido-patrão. Verdade que era uma suíte, com uma saleta, um banheiro e um quarto de vestir, além do quarto de dormir; mas a cama sobressalente que vira no quarto de vestir, alguns dias atrás, quando estava conhecendo a vila, era pequena demais para acomodar a figura alta de Alfonso. E não conseguia imaginar , de jeito nenhum aquele grego genioso oferendo de cãibras, pela má posição de dormir, sem se queixar.

Achando que seu silêncio era devido à admiração que sentia pelo presente, as duas gregas sorriam, felizes. Então Cris, soltou uma exclamação aflita, os olhos fixos no relógio.

-"Ohi"! "Entheka"! – murmurou, levantando as mãos para o ar, num gesto de desespero.

- Já são onze horas – Lira traduziu rapidamente. – Precisamos nos apressar. Ainda temos muita coisa para fazer!

Anahí gostaria de lhes dizer que dez minutos eram mais do que suficientes para ela tomar um banho, colocar o vestido e passar um pente pelos cabelos , mas nem Cris nem Lira dariam atenção às suas palavras. As duas corriam de um lado para o outro, preparando seu banho, escolhendo suas roupas de baixo e garantindo que tudo estava em ordem de se retirarem.

A Substituta (Adaptada)Where stories live. Discover now