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[Kim Taehyung]

Todos os dias, meu pequeno despertador toca às cinco da manhã, sem falhar. Sonolento, se levanta da cama, pisando no chão frio sem qualquer delicadeza, e desata a chorar, indicando que mais um longo dia havia começado.

Eu poderia muito bem lhes afirmar que o som é melódico e lindo, pois estamos falando do meu filho, porém é horrível. Seu choro é tão irritante, que não se contenta em me despertar somente, o demônio dentro de mim também foi convidado a se levantar de seu sono profundo. São nestes incríveis momentos em que me pergunto: aonde estava com a cabeça?

- Papai - chamou, manhoso, da maneira mais fofa que conseguia fazer : carinha de gato abandonado enquanto coça os olhinhos. Sou apaixonado nesse menino! Como não poderia me derreter por um bichinho desses? Ele estendia suas pequenas mãozinhas, pedindo colo, e como o pai babão que sou, o segurei contra meu corpo. Min Hyuk é a coisa mais extraordinária que já aconteceu na minha vida, e eu o amo demais, apesar de me tirar do sério.

- Sua prima já acordou? - perguntei, recebendo um denso vácuo como resposta.

O projeto de ser humano havia adormecido novamente, pela primeira vez em muitas manhãs. Ele deveria estar realmente cansado... Será que passou a noite em claro com medo, novamente? Ultimamente, Min Hyuk anda tendo problemas com "monstros em baixo da cama" e todo o tipo de coisa, mas acho que na verdade são só as suas inseguranças e mágoas, projetadas, ganhando forma de monstros imaginários. A cabeça de uma criança é uma fábrica em constante produção, e como sua criatividade não possui limites, é comum que transformem situações do cotidiano em cenários irreais a fantasiosos.

Às vezes queria esta inocência e criatividade. Quando se é adulto, sua mente se corrompe e aprende que não se vivem somente de sonhos.

Com o maior cuidado do mundo, o deitei na enorme cama, ao lado de meu esposo. Ao olhar os dois juntos, sinto como se houvesse arame farpado em volta do meu pescoço, a sensação é horrível. Min Hyuk não é filho de Jungkook, e sim consequência de uma das minhas escapadas. O tive com alguma mulher sem rosto, sem nome e sem essência, em uma época onde tudo entre mim e meu esposo estava ruindo na velocidade da luz. Não fui o único a trair, ele também me traiu, com mais de sete homens- para ser exato - mas nenhum deles o deu um filho. Homens não engravidam, mulheres sim. Jungkook não se relaciona com moças, ele está aprisionado em um rótulo (mesmo já tendo admitido a mim que adoraria transar com algumas). Enquanto eu sou o vadio liberal que beija todo tipo de ser humano, além de engravidar uma ninguém. Ele fazia questão de esfregar na minha cara que eu havia ultrapassado os limites, como se eu tivesse planejado cada detalhe de um plano cruel para lhe machucar.

Em contrapartida, sua sobrinha mora conosco há mais de cinco anos. Hae-jin é um doce de menina, mas se deixou levar pelas paranoias do tio e se recusa a falar comigo, a não ser em caso de extrema urgência, mesmo eu a tratando como minha própria filha.

Nem ela, nem Jungkook se dão o trabalho de interagir com a minha criança, mas o que posso fazer? Os nossos laços familiares estão se rompendo pouco a pouco, e devido a culpa que me consome, não consigo fazer nada, alem de alimentar os oceanos com minhas lágrimas. É a sensação do arame farpado na garganta, é impossível não achar desconfortável, mas não posso me deixar vencer. Preciso criar Min Hyuk, me assegurar que o meu filho cresça bem e se torne o homem digno que nunca pude ser. Se esse homem existir, é claro.

Encaro o relógio, são sete da manhã, o que justifica o meu cansaço. Nunca fui uma pessoa diurna, a luz solar não funciona comigo, não me alegra, não me motiva, não me move e poderia muito bem viver sem.

Para ser sincero, o maior motivo pelo qual odiava o dia - principalmente os ensolarados, diga-se de passagem - é como ele afeta o comportamento das pessoas. Na claridade, todos possuem vidas milimetricamente perfeitas, feitas sob medida pelos céus, onde tudo, até mesmo deus, é lindo e justo, um conto de fadas incrivelmente viciante. Porém é tudo uma farsa sem fim. Como posso provar isso? Espere a noite cair. O homem esquece de amar o próximo, seus valores são descartáveis e não existem depois da hora do jantar. Todos são sinceros demais, sujos demais, corrompidos demais, obscuros demais. 

Cold SheetsOnde histórias criam vida. Descubra agora