Capítulo 18

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— Bia.

Ela acordou com alguém balançando seu ombro de leve e começou a se espreguiçar quando a sensação de déjà vu a fez dar um pulo e olhar em volta. A visão familiar do seu quarto e o rosto do Fred afastaram o susto.

— Calma! — Ele deu uma risada. — Desculpa ter entrado, mas já são uma e meia e você nunca dorme até tarde.

— Eu cheguei de madrugada e custei a dormir. — A Bia passou a mão nos olhos, espantando o restinho do sono.

— A mamãe e o papai foram almoçar na casa do doutor Macedo, eles falaram que você pode ir pra lá, se quiser.

O doutor Macedo era o sócio do seu pai na clínica. Ele e a esposa eram uns amores, mas os almoços na casa deles eram um tédio. Só gente velha e conversa sobre trabalho.

— Você vai? — Ela examinou o irmão que segurava a chave do carro dele.

— Não, eu vou num restaurante qualquer aqui por perto mesmo. Você quer vir comigo? Ou eu posso trazer comida pra você, preguiçosa.

— Me dá quinze minutos?

— Eu te espero lá embaixo.

A Bia se arrumou em tempo recorde. Depois de usar o banheiro, ela fez um rabo de cavalo, porque dormir com o cabelo molhado tinha as suas consequências, colocou um vestido, sapatilhas e passou um batom.

— Cadê o seu carro? — o Fred perguntou, assim que eles puseram o pé fora da porta.

— Tá com o Diego. E antes de você perguntar, não, nós não voltamos. — A Bia pôs os óculos escuros, incomodada com a claridade e uma leve dor de cabeça.

— Mas, pelo jeito, é uma questão de tempo se vocês estão voltando aos velhos hábitos.

— A gente estava na mesma festa ontem e ele não tinha carona. Foi só.

— Onde você quer ir? — O Fred parou o carro na saída do condomínio e esperou.

— Qualquer lugar que tenha massa, pra mim tá bom.

— Sim, senhorita. — Ele arrancou e deu uma olhadinha de lado. — Pra você ter esquecido o Diego tão rápido, só pode ter outro cara na parada. Alguém que eu conheço?

— Não e nem vai conhecer.

— Você tá muito mal-humorada hoje, sabia?

— Desculpa. É que acabou antes de ter começado. — Ela massageou as têmporas, arrependida pela má resposta, mas conversar sobre o Lourenço era a última coisa que ela queria. — Será que a gente podia mudar de assunto?

— Tudo bem. — Ele não pressionou, talvez percebendo que o assunto era mais delicado que o normal.

O restaurante estava cheio e barulhento, mas na metade do prato de fetucine com molho branco, a Bia começou a se sentir humana outra vez. Carboidratos e calorias melhoram o humor de qualquer um. Depois, era só escolher alguma sobremesa com chocolate e deixar as endorfinas cuidarem do resto.

— Fica de boa e não fala nada — o Fred pediu, deslizando o braço por trás da cadeira, apoiando a mão no ombro dela.

Três moças passaram pela mesa deles, e pelo olhar mortal que uma delas lançou na direção do irmão, ele tinha aprontado.

— Sério que você acabou de fingir que eu sou sua namorada? — a Bia perguntou, com uma risada, depois que elas se afastaram.

— Ela vai pensar o que quiser. — O Fred tirou o braço e continuou a comer normalmente. — Não é minha culpa se ela achou que eu ia pedir ela em casamento por causa de uma noite.

A Bia largou os talheres, perdendo o apetite.

— Como é que os homens conseguem passar por uma experiência tão pessoal como o sexo de maneira tão impessoal?

— Essa acusação além de injusta, não podia estar mais ultrapassada. — O Fred balançou a cabeça. — Já era o tempo em que vocês eram criadas pra casar virgem e se sentirem culpadas por transar fora de um relacionamento sério. A Dani não pensa assim porque é mulher, ela pensa assim porque é a personalidade dela. E por incrível que pareça, já aconteceu de eu querer continuar a ver a menina e levar um fora porque ela não estava a fim de mais do que sexo.

O Lourenço tinha lhe feito um convite no dia seguinte à primeira primeira vez deles, mas ele foi motivado pela culpa de ter tirado a virgindade de uma menina bêbada e não porque se importava com ela. E o pedido do telefone no outro dia foi com a única intenção de acrescentá-la na lista de contatinhos dele. A descoberta da noite anterior confirmava tudo aquilo.

A Bia até concordava que homens e mulheres se tornavam cada vez mais iguais, mas se apegar não tinha nada a ver com criação. Toda mulher tinha o instinto de querer cuidar e ficar perto, afinal elas eram mães. E os homens, desde os tempos das cavernas, precisavam ser fortes e desapegados para largar a família e sair para caçar. Independente do estado da evolução humana, as mulheres sempre iam se importar mais do que os homens, mesmo que não dessem o braço a torcer.

— E o que você fez? Quando você quis continuar e ela não? — Ela brincou com a comida no prato.

— Arrumei outra. Nada como um novo amor pra ajudar a superar o antigo.

A brincadeira do irmão não lhe arrancou um sorriso, como ele provavelmente esperava. Colocar uma variável extra naquela equação não iria resolver o problema da Bia, e seria melhor seguir com o plano de ficar sozinha por um tempo.

— Se você quiser, eu posso ir lá tirar satisfações com ele pra você — o irmão ofereceu.

— Por quê? Porque eu sou a Dani dele, e ele é o meu Fred? — Sua franqueza fez os olhos dele se arregalarem. — Eu não esperava um pedido de casamento, ele foi honesto e eu sabia o que eu estava fazendo, e nem é arrependimento, é só que eu queria... mais.

O Fred puxou a irmã para um abraço e ela deitou a cabeça no ombro dele.

— Se ele não conseguiu ver que você é uma menina que merece muito mais, você tá melhor sem ele.

— Olha quem tá cheio de frases feitas hoje. — A Bia deu uma risada seca.

— Eu tô lendo uma porção de livros de autoajuda pra impressionar a estudante de psicologia que eu tô paquerando — o irmão brincou e daquela vez consegui fazê-la sorrir. — E nesse caso é verdade. Você já reparou como os seus ex-namorados sempre correm atrás de você depois que você termina com eles? É porque eles não se conformam em te perder.

A Bia se separou do abraço, revirando os olhos.

— Não exagera.

— Eu não tô exagerando. O Diego mesmo, tem mais de um mês que vocês terminaram e ele não ficou com o seu carro ontem porque estava sem carona. — O Fred levantou as sobrancelhas a desafiando a contradizê-lo. A Bia foi obrigada a morder os lábios e ficar calada por culpa da porcaria do beijo do ex-namorado na despedida. — Ele é um cara legal, Bia, por que você não dá outra chance pra ele?

— E se eu te dissesse que a Dani também me pareceu uma menina super legal?

— Eu ia responder que é uma merda como o nosso coração não gosta de obedecer à gente.

— Me empresta seu livro? Ele tem resposta pra tudo. — A Bia deu uma risada.

— Vai debochando, vai. — Ele se fingiu de ofendido. — Mas a minha filosofia barata fez você se sentir melhor.

Era verdade, a conversa com o Fred tinha consolado um pouco a Bia, mas não por causa da filosofia barata, mas pela maneira com que ele sempre se preocupava e cuidava dela.

Como todo bom irmão mais velho, ele era implicante e chato, mas bastava alguém ameaçar sua irmãzinha que ele vestia a capa de super-herói, pronto para defendê-la de todos os vilões.

A Bia quase disse aquilo, mas ficou calada. Ele já era metido demais.

Mau Amor [Concluído]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora