Dia dois: Leão

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Lance se lembrava com exatidão do jardim da casa de Keith por memórias feitas antes mesmo de o conhecer. Conhecia de cor as arvores grandes, as flores de cores fortes que, se não fosse na primavera ou verão, eram um emaranhado assustador de galhos marrons perigosos, a estrada de pedra branca que levava a enorme garagem e a grande porta de vidro da mansão...

Naquele momento ele tinha as mãos no bolso olhando para a estrada da garagem e por um segundo podia se visualizar com cerca de oito anos com o rosto pintado de palhaço correndo pelo lugar ouvindo Adam gritar com ele que não devia andar tão longe, que era desrespeitoso andar por ai sem permissão do dono da casa. Podia ouvir a risada de Zarkon por esse comentário.

Naquela época a casa parecia apenas mágica para ele, praticamente um castelo, uma vez que morava em um trailer com Adam, Hunk, Katie, Matt e o sr. e sra Holt. Mal tinham espaço para fazerem as refeições juntos dentro daquela lata de sardinha com rodas e quando viu a casa, ele sentiu quase como se fosse a própria cinderela.

Ele se lembrava de ter corrido bastante por ali quando foi devidamente "apresentado" a Zarkon e recebeu permissão, levando Katie pela mão que ria e tropeçava no vestido porque ainda era pequena demais para o acompanhar, mas tentava mesmo assim, com as bochechas rosadas e um sorriso banguela. Matt dizia que Lance foi o primeiro amor de Pidge pelo jeito que ela era apegada a ele, mas os dois negavam veemente! Mas naquela primeira vez, Lance admitia, sentiu que era um príncipe levando sua princesa pelas pedras brancas brilhantes em direção ao grande castelo que tinha praticamente a frente toda feita de vidro.

Ele se lembrava de Zarkon com muita clareza naqueles dias, sentado em um banco em meio às roseiras, sempre com um terno, mesmo no calor e o observando com os olhos amarelos. Lance pensava nos primeiros anos que o homem era um gorila que perdeu parte do pelo por seu tamanho e que havia começado a falar e, se fosse franco, se perguntassem hoje em dia, ele diria que ainda achava que aquilo podia ser possível. Mas independentemente de suas teorias, mesmo depois de quase dez anos, o homem continuava o mesmo. As mesmas feições, as mesmas rugas, a mesma crueldade fria para com todos, reservando o mínimo de afeto apenas a sua família.

Mas o motivo de se lembrar de tantos detalhes de Zarkon era porque, além de assustador, ele sempre estava com Adam de pé ao seu lado, o mantendo sempre em posições duras com as mãos cruzadas nas costas, em posição de soldado, mesmo que fosse apenas um adolescente de 14 anos na época.

Hoje lance sabia que idade para Zarkon não era absolutamente nada se a cabeça chegava a altura de seus cotovelos. Em sua lógica, se conseguia erguer as mãos até seu rosto e o alcançar, poderia segurar uma arma e o servir. Infelizmente ou felizmente, o cubano aos 12 havia tido um surto de crescimento.

Lance se lembrava de olhar com admiração para Adam naqueles dias há tantos anos, quando desconhecia qualquer coisa, achava incrível sua capacidade de manter sua postura por tanto tempo e a forma séria com que ele encarava fixamente a frente, como se estivesse em alerta e pudesse lidar com qualquer coisa que aparecesse usando apenas os punhos. Na visão de Lance de oito anos, ele era como um cavaleiro do castelo e pensar aquilo na época fazia suas bochechas corarem. Talvez naquele tempo ele tivesse uma queda por Adam.

O Cubano respirou fundo e balançou a cabeça, distanciando as memorias, ao ver Keith chegando com a moto.

Ele não usava o capacete e sim o seu boné. Lance riu ao se aproximar e Keith parou a moto tirando algo do colo e esticou para que Lance o pegasse.

— Você vai sentir frio no caminho. — Disse Keith e Lance pegou a jaqueta vermelha para vestir olhando confuso para ela.

— Onde está a minha jaqueta? — Questionou subindo na moto e Keith ergueu os ombros virando o boné e colocando o capacete.

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