Antes De Kerberos, Existia Nós Dois

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Capítulo Segundo —
Cada Pessoa É Uma Pessoa Diferente

       Dois dias após a discussão, Adam já havia voltado para casa - passou os demais dias dormindo na casa de amigos -, mas parecia que ele não estava lá realmente. Comia em nosso quarto, se recusava a ficar no mesmo cômodo que eu, se eu fosse para a sala ele ia para a cozinha. Se eu fosse para o quarto, ele se deitava no sofá da sala e dormia por lá mesmo.

       Estava me sentindo mal com aquilo.

       — Adam — falei entrando no quarto, ele trocava seu uniforme por um pijamas cinza.

       — Estou me trocando, você pode me dar licença?

               — Não, você vai me ouvir; eu passei os últimos dois dias pensando sobre o "por quê?" e eu finalmente sei o porquê.

       Ele sequer vestiu a camisa, me olhou como quem dizia chega dessa história. Parecia cansado daquele assunto, e eu também estava, mas precisávamos esclarecer tudo.

               Sentei aos pés da cama e ele fez o mesmo, cada um em uma ponta. Me senti tão distante dele, e não era só fisicamente falando.

               — Ouça, eu não estou indo para sempre, eu vou voltar, mas eu preciso fazer isso.

               — Por que precisa? — eu estava preparado para responder a pergunta, mas não havia me preparado para ouvir aquele tom. Sua voz soou tão triste quanto a de uma criança que chora a perda de um pai. Meu coração se partiu bem ali; sentia que o dele também tinha.

               — Não quero ser um peso Adam. Eu sei que você cuidaria de mim, mas eu não quero passar a vida sabendo que sou um peso nas suas costas.

               Ele ouvia em silêncio, encarando o chão e apertando a camisa.

               — Você não é um peso. Que diferença faz ir ou não para os confins do sistema?

               Ele parecia prestes a chorar, não por ser emotivo ou chorão, mas porque estava machucado. Eu o estava machucando.

               — Seu eu puder me virar em Kerberos, vou saber que, quando voltar, vou poder me virar aqui também. E, além disso, Kerberos foi a razão do meu alistamento na Patrulha — sorri, esperando que ele fizesse o mesmo.

               — Minha razão foi você.

               Terminou de falar, vestiu o pijamas e se deitou em silêncio.

               Fiquei sentado ali na beira da cama um tempo, calado, envergonhado de ser eu novamente. Eu tinha certeza que dessa vez poderia fazer as pazes com ele, mas eu errei. Me virei para vê-lo, agora ele já dormia. Levantei para ir vestir o pijamas, mas pra quê? Podia dormir só com o uniforme mesmo.

               Tirei o óculos dele e deixei sobre o criado mudo, ele sempre esquece de tira-los. Normalmente agora eu lhe daria um beijo, deitaríamos e dormiríamos juntos, mas ele está bravo comigo.

               Fui para o sofá e mandei mensagem para Matt. Ele também iria a Kerberos e também deixaria pessoas importantes para trás, como sua mãe e a irmã.

               “Não consigo falar com ele” escrevi, na esperança de que ele ajudasse de alguma forma. “Quanto mais eu insisto nesse assunto, parece que pior fica”.

               “Kate aceitou bem a viagem, ela está mais ansiosa do que eu na verdade, e eu estou passando o tempo com ela. Sabe, eu acho que seria melhor se você deixasse ele tomar essa decisão sozinho”. Sozinho ele não aceitaria, eu precisava insistir nisso. Ele não mudaria da noite pro dia. “Eu não acho que ele vai mudar de opinião só por você não mudar de assunto”.

               “Sua irmã mudou” mandei, estava escuro e tarde.

               “É, mas ele não é ela. A Kate é a Kate, o Adam é o Adam, e você tem que respeitar isso.

               Ele tinha razão, eu não estava respeitando o Adam, apenas queria que ele visse o meu lado da história, mas e o dele?

               “Já está bem tarde, eu vou dormir. Boa noite e boa sorte Shiro.

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