Prólogo

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Trilogia O Círculo dos Imortais

Do Éden à Luxúria

Vol. I

Prólogo

LONDRES, 1898.

Onde você está?

Uma brisa invernal irrompia através da janela aberta, sibilante e calma. As cortinas de seda fina agitavam-se sob sua ação, assim como os longos fios do cabelo dourado e cintilante da jovem sentada defronte ao espelho. Penteava as madeixas com delicadeza, o som áspero da escova ecoando baixo. Os fios delicados pareciam reluzir como ouro em reflexo à luz quente produzida pelas velas de chamas inconstantes. A jovem tremeu delicadamente, o frio penetrando em sua carne até lamber os ossos. Trajando apenas um quimono oriental branco que ganhara de seu pai — um aristocrata de uma notável família — ela abraçou seu corpo delgado com ambos os braços.

De fato, não compartilhavam da mesma linhagem sanguínea nobre, mas ambos jamais se tornariam conscientes deste fato.

Numa ação carregada de frustração, ergueu-se para fechar a janela. Seu amante não viria essa noite? Sentia-se ferida, solitária em um quarto inteiramente vazio, úmido e desolado. Sua expressão ficou amarga, as lágrimas finas turvando sua visão. Mas, quando se virou, contemplou a figura austera postada atrás de si.

Não qualquer homem: era alto, um belo rapaz de pele macia, cabelos escuros e lisos que pendiam em seus ombros, roçando na lapela de seu paletó negro de bom corte. Ela resfolegou, sua mão tocando o peito em função da surpresa. Sentiu no interior de sua palma o desencadear de uma série de batimentos frenéticos. O sujeito sorriu, uma mescla entre paixão e desejo que era deliciosa de se ver. Ela sentiu seu corpo febril — estava queimando, de forma sublime. As maçãs do rosto, bem como o pescoço, ardiam, entorpecidos pelo sangue fervente.

Incapaz de conter a euforia que a consumia, ela sorriu. Em resposta, o homem inclinou amplamente seus fortes braços, convidando-a para o interior de seu abraço. O cabelo da jovem, que pendia em sua cintura fina, agitou-se enquanto ela flutuava em direção ao seu amante. Ele beijou seus cabelos, a bochecha dela esmagada contra os botões frios de sua camisa, sentindo a maciez do tecido. Imaginou se a carne de seu peitoral seria tão suave quanto.

— Senti sua falta — murmurou, sua voz de soprano soando frágil, infantil. — Me desesperei ao pensar que não viria essa noite.

O homem uniu suas mãos às dela, que eram pequenas, frágeis. Removeu sua cartola, pondo-a sobre a penteadeira de mogno, ao lado de um pequeno porta-joias de onde pendiam colares de pérola, pedrarias valiosas de todos os tipos, tamanhos e cores. Sentaram-se na cama em seguida, a jovem em puro deleite, sofrendo por antecipação enquanto os olhos claros do homem à sua frente vacilavam entre seu rosto e a cama. Iria ele tomá-la em seus braços da maneira que sua governanta Gertrude dissera que jamais deveria admitir que um homem o fizesse enquanto não pusesse um anel em seu dedo? Seu coração deu solavancos no interior de seu peito; ela mal podia respirar.

— Essa é uma noite especial — o rapaz de voz rouca disse, aplicando um beijo nas costas de sua mão. — Não há melhor lugar em toda Inglaterra além deste no qual me encontro.

A jovem sorriu, orgulhosa de si. Ele se aproximou ainda mais, seus dedos frios invadindo o interior do seu quimono, abaixando as mangas até a dobra de seus cotovelos. Um frêmito súbito tomou seus músculos. Os lábios do homem encontraram seu ombro, fazendo com que calafrios surgissem em sua nuca, o braço pontilhando por causa dos pelos eriçados.

— Oh, querido, eu...

— ... — sibilou ele, posicionando um dedo contra seus lábios. — Não diga nada.

Ela obedeceu prontamente, fechando os olhos com força quando ele pressionou seus lábios contra os dela.

— Eu te amo — ele disse. Sua voz carregava toda paixão que ela só encontrava nos livros que roubava dos criados, e que mantinha sob o forro de sua cama, lendo-os apenas no silêncio das madrugadas. Ele era o seu amante proibido, um belo Romeu de cabelos negros. O termo lhe causava arrebatadora felicidade, paixão que lhe roubava o fôlego. — Você é a coisa mais preciosa que possuo.

— Suas palavras são tão doces — ela sussurrou, tremendo. Deitou-se sobre os lençóis, a lua derramando um feixe de luz prateada sobre seu corpo nu. Ela queria pertencer a ele inteiramente, intimamente, com cada célula de seu corpo.

Os olhos do amante, aquelas chamas ardentes, esquadrinharam seu corpo, cheios de fome. Pareciam mais claros essa noite, num tom que lembrava algum tipo de metal derretido, talvez argento. O efeito da lua, talvez? Ela não se preocupou com esse fato em particular, uma vez que seu amor posicionava a mão em seu queixo, tombando sua cabeça para trás de forma que pudesse aplicar um beijo em seu pescoço. A jovem respirava em chiados breves, incapaz de ocultar seu desejo.

— Por que essa noite é tão especial? — questionou, sua voz entrecortada.

Ela sentiu o hálito quente soprando em seus ouvidos antes mesmo de ouvir suas palavras. Seu corpo magro se retorcia, ondas de prazer norteando seus membros.

A jovem garota jamais se esqueceria das seguintes palavras que foram sussurradas de maneira intensa, fria e cruel. Jamais esqueceria a imagem bestial que retorceu as feições de seu amante; fez-lhe pensar nas gravuras de um livro pavoroso repleto de diabruras que, certa vez, encontrara na biblioteca de seu pai. O demônio do velho mundo legendava uma das imagens. O grito sufocado em sua garganta jamais seria ouvido.

— Porque,minha querida, essa noite — ele apertou seu rosto entre seus dedos. — Você irámorrer.

Onomatopeias em itálico por adequação à norma culta e ao padrão da editora. Mas, se preferir, manterei a forma original.

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[DEGUSTAÇÃO APENAS] Do Éden à Luxúria - Trilogia O Círculo dos Imortais Vol.IWhere stories live. Discover now