capítulo 4

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Charles

— Droga! – praguejo alto numa fúria anormal. Jogo meu telefone na outra extremidade do
quarto e o vejo se espatifar em três pedaços.
Verônica não sabe com quem está brincando.
Todos esses meses eu fui paciente e honrei nosso contrato. Abri mão de beijá-la. Cedi a sua
vontade. Aceitei que tivesse outros homens, mas apenas os que eu aprovasse. Embora tenha
sido eu que coloquei aquele filho da puta em seu caminho – o que me arrependo malditamente
– eu não a queria com ele. Em hipótese nenhuma.
Eu podia senti-la escorregando pelos meus dedos. Para uma pessoa como eu, isso é
inaceitável. Sou um dominador, não um cachorrinho implorando por migalhas e atenção. Acho
que ela perdeu a noção do que eu posso fazer - caso ela se esqueça de que pertence a mim.
Assinamos um contrato e ela fez um juramento.
Um juramento que ficará marcado em minha memória. Ainda lembro-me do seu tom de voz,
quando aceitou ser minha, em nosso segundo encontro.
“— Será uma sub obediente e dedicada a mim?
— Sim, senhor.
— Ótimo, não espero menos do que isso...”
As lembranças do primeiro dia em que a possuí ficam martelando a todo instante em minha
mente. Tão linda, tão entregue... Minha, minha linda submissa.
Fecho os olhos e seus votos voltam a me atormentar...
“— Está disposta a se entregar de corpo e alma a mim? – pergunto olhando em seus
olhos assustados. Linda, de joelhos, nua, completamente minha.
— Sim – ela responde num sussurro.
— Então, me faça um juramento de fidelidade, obediência, servidão e dedicação.
Ela me olha confusa.
— Agora?
— Sim. Para que pertença a mim, é necessário – digo firme empunhando meu chicote. —
Quero que faça seu juramento de acordo com nosso contrato e como te ensinei.
Ela me olha e molha os lábios com sua língua. Seu rosto ganha um tom avermelhado.
Fica linda quando cora.
— Eu, Verônica Sandler, abdico dos meus direitos e reconheço minha servidão a ti
Senhor, a quem devo obediência total. A ti entrego meu corpo e minha alma submissa para o
seu prazer, pois sou totalmente submissa às suas vontades, aos seus desejos mais secretos,
dê-me a honra de servi-lo. Prometo honrar seu nome, prometo total fidelidade e dedicação.
Estou ciente que pode fazer o que quiser, o que quiser com meu corpo, sou sua na forma que
bem entender pois confio em ti, na sua mão pesada nos castigos e leve nos carinhos, em teu
caráter e julgamento...”.
Não vou deixar que ninguém a leve de mim. Ela sempre será minha. O pensamento de
perdê-la me consome e me deixa enlouquecido.
Deito em minha cama, agora mais calmo. Nesses lençóis, ainda sinto seu cheiro. Suapresença...
Todas as noites em que me deito, é somente nela que penso. Não sei qual o momento que
me perdi em meu próprio controle. Eu não sou um homem de uma escrava só. Nunca fui.
Sempre tive outras submissas além dela. Mas tudo passou a ficar diferente de algum tempo
para cá. Eu queria um relacionamento monogâmico. Eu queria mais. E agora, vou em busca
desse mais, a qualquer custo. Irei buscar o que me pertence. Mas desta vez, não vou deixá-la
sair e nem que tenha outros homens.
Será minha.
Apenas minha.
***
Levanto-me e caminho até as correntes. Passo as mãos suavemente por elas lembrando-me
da sensação de tê-la ali. Entregue.
Os sons que ela fazia, seus gemidos e gritos contidos, sempre deixava-me ainda mais
excitado. Adorava ouvi-la. O som de meus chicotes batendo em sua carne, as marcas em seu
corpo, minhas marcas em seu corpo, levavam-me a um nível extremo. Nunca havia me sentido
em total controle numa sessão. Eu sabia que era mais do que ela podia suportar e mesmo
assim, minha pequena não me decepcionou. Isso só me deixava ainda mais louco em testar os
seus limites.
Penso nas várias formas em que a farei se submeter a mim. Imagino-a de joelhos, nua,
sentada em suas pernas, uma enorme coleira em torno de seu lindo e delicado pescoço, e eu,
puxando sua guia pela casa de forma que fique de quatro engatinhando atrás de mim, seguindo-
me como uma felina.
Penso em quando poderei dormir e acordar ao seu lado. Em quando a excitarei apenas num
simples comando meu.
Ficarei feliz quando for apenas minha. Para me servir e me fazer feliz. Me entregar o total
controle de seu corpo e sua alma. De me entregar suas vontades.
Antes disso, serei apenas a sombra de um dominador. Sem ela, não vejo sentido para minha
vida. Quero que aceite ser minha escrava submissa por toda a vida. Que queira ser minha por
vontade própria. Mas, para isso, terei que tirar todos de seu caminho. Assim, ela irá perceber
o quanto precisa de mim. Que sou eu que sempre cuidarei dela. Que a protegerei.
E que sim, que irei castigá-la por não ter sido obediente ao seu senhor.
Caminho até o aparelho de som perto da cruz de Santo André, ligando-o e a canção The
Kill – 30 Seconds to Mars ecoa pelo enorme quarto escuro e sombrio.
Na gaveta da cômoda, ao lado de alguns brinquedos, está meu outro celular – o que uso
para coisas ilícitas.
Eu sempre tive bons contatos. Nunca fui um homem ruim. Isso não. Apenas uma pequena
mancha em meu passado. Algo que não queria que se tornasse público. Então, na época, usei
desses mesmos meios para me certificar de que ficaria seguro.
Hoje, mesmo contrariando meu juramento de que jamais voltaria a fazer tal insanidade, meu
desejo por ela é maior do que a loucura que estou prestes a cometer.
Pego o telefone e ligo.
— Paschoal! – a voz estupidamente fria, soou do outro lado.
— Paschoal, é o Charles.
Um breve silêncio quase me fez pensar que havia desligado.
— Sim, senhor Charles. Se ligou é porque está encrencado como da última vez - ele fala.
— Nem tanto. Mas preciso que faça um servicinho para mim. Ainda não sei é necessário.
Apenas fique em alerta. Caso precise, votarei a contatá-lo.
— Sem problemas, senhor. Estou à disposição – ele diz e eu finalizo a ligação.
Paschoal é um homem bruto. Bronco.
Da última vez em que precisei de seus serviços – há três anos – ele me serviu com louvor.
Foi eficaz e objetivo em sua jornada. Qualidades que eu sempre apreciei em uma pessoa – a
eficiência.
Há três anos, numa sessão com uma submissa, tudo ia muito bem. Até que resolvi prendê-la
em sua cama. Seu corpo coberto e trançado por cordas vermelhas, olhos vendados de forma
doce por uma fita de cetim preta, punhos e tornozelos imobilizados por algemas. Ela estava
linda totalmente entregue. Me excitava apenas olhá-la. Então, comecei uma sessão com wax –
velas. Havia velas acessas por todo o quarto, inclusive, em nossa cama.
Algo no meio do caminho deu muito errado.
Lembro-me do fogo. Muito fogo.
Não consegui desamarrá-la rápido o bastante. As chamas se alastraram e tornaram-se
intensas, a fumaça inalada fez-me tossir ao ponto de asfixiar. Não pude ouvir seus murmúrios
e seus lamentos, pois havia a amordaçado também. Não me esqueço de quando a olhei nos
olhos e vi o terror que continha neles.
Eu saí do quarto ignorando muitas regras. Inclusive, a de mantê-la segura. Por minha causa,
ela se foi. Porque não pude protegê-la. Não consegui. Priorizei a minha segurança.
Diante do caso, fiquei exposto. Na investigação, um dos detetives chegou até mim. Pelas
minhas práticas não convencionais, certamente seria acusado de assassinato, até mesmo por
omissão de socorro e fuga. Então, pedi para que Paschoal desse um jeito no detetive curioso.
Acho que o corpo dele ainda repousa no imenso rio. Até hoje, não foi descoberto. A polícia
deu o caso como encerrado.
Como disse, nunca fui um monstro. Mas agi em prol das minhas necessidades. E, se for
preciso usar de tal tática para conseguir a mulher que eu amo Adrian Miller certamente terá
um lugar de destaque ao lado do detetive que quase quis me ferrar.
Esse sou eu. Determinado. Não acho que isso seja cruel. Apenas luto pelos meus desejos.
Sou um Dom. E um Dom, merece ter tudo o que deseja.
Nem que seja a qualquer custo – se isso o fizer feliz – como sei que serei com ela.
Apenas eu e Verônica.
Ninguém mais.

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