O lobo e o garoto aprendiz.

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Depois de dias caminhando por florestas e campos, cheguei a um local mais quente e verde, onde encontrei um rapaz na beira de um riacho, não muito longe do vilarejo onde talvez encontrasse o meu procurado, segundo as informações em minha mente.

Enquanto observava-o de cima de uma colina pedregosa e afastada, percebi que talvez ele pudesse ser o mestiço, afinal havia um aroma de lobo nele que chegava até mim pela brisa. Desci da pedra escarpada e segui pelo bosque para me aproximar mais. Ele usava uma haste longa com um fio na ponta mergulhado na água, parecia concentrado e solitário. Segui pela margem do rio até chegar perto suficiente para poder analisa-lo melhor. O rapaz de cabelos castanhos e um dos olhos com uma cicatriz não me percebeu chegar e me deitar a cinco metros, achei que assim soaria mais amigável e não com intensão de comê-lo. Observei-o por longos minutos no silencio, era magro, usava vestes empoeiradas, carregava uma espada, tinha uma mochila ao lado e sobre os ombros um grande pedaço de pelagem escura. Levei uns instantes e umas inspirações fortes do ar para perceber que se tratava de pelo de lobo. De repente, ele moveu a vara, empolgado, e o anzol saiu da água vazio.

— Maldito! De novo! — esbravejou sozinho e então se moveu para a pequena lata ao lado, o mesmo lado em que eu estava, e o rapaz ficou imóvel. Aos poucos, levantou os olhos para mim e ao ser notado sentei-me. — NÃO! LOBO! — gritou desesperado. — Socorro! Vai embora! — tacou a lata com minhocas na minha direção e levantou-se rápido, largando a vara, agarrando a mochila e saindo correndo para o meio do bosque.

Covarde — pensei e tranquilamente fui seguindo seus passos. Desejei que aquele não fosse o mestiço ou teria muitos problemas com um medroso daquele nível que iria piorar mil vezes quando soubesse que uma alcateia inteira o procurava.

Sem pressa, caminhei pelo bosque de arvores, arbustos e um solo frio, me aproximei da entrada do vilarejo e entendi que não poderia continuar como lobo, não perto de humanos que gostam de usar nossa pele e nos temiam. Com um chacoalhar de cabeça e citando mentalmente ‘lobo-homem’ me transformei, saber fazer isso vinha daquelas informações que a feiticeira colocou em minha cabeça e depois de alguns dias eu já não me espantava.

Enquanto avançava pela estrada gasta de terra, ouvi e notei que os cachorros latiam para mim e muitos fugiam, mas eu também não gostava deles, mesmo estando na forma humana. Segui andando atrás de algum sinal do filho da feiticeira entre as casas e pequenos comércios. Acabei descartando o pescador ao considerar que o cheiro de lobo vinha daquele pedaço de pele que o cobria. Os humanos que eu via nas ruelas possuíam vestes simples e murmuravam entre si com estranheza quando eu passava, temi que talvez soubessem que eu não fosse como eles, mas segui meu objetivo, agindo o mais humano possível que eu podia imaginar.

Perto do meio dia, cansado, observei um par de cavalos galopando pela rua principal. Pareciam viajantes chegando, pois carregavam mochilas em suas montarias e vestia-se com longas capas. O que montava o cavalo branco possuía um manto azul e o do cavalo castanho um manto cor de avelã. Assim, com a poeira que passou por mim, veio o cheiro. Era ele! De alguma forma eu sabia com certeza, apesar de meu faro não ser perfeito naquela forma humana.

Segui os dois homens até uma estribaria, onde deixaram os animais para serem cuidados. Encostei-me a uma cerca de madeira e meu coração palpitou assustado. Eu podia sentir a energia de um feiticeiro completo vindo deles, ele estava ali e próximo. Era o homem de azul, ele mais que ninguém, poderia descobrir que eu era um lobo e por todos contra mim.

—... Espero que levemos anos para uma próxima viagem — comentou o mago, um homem velho e de barba quase totalmente grisalha, enquanto saiam do lugar.

— Por quê? Eu gostei — o mais novo carregava um cajado pendurado nas costas, parecia mais disposto depois da viagem. — Podíamos ir para Aghantar, ao leste, na próxima semana! Aposto que lá terá mais pessoas precisando de ajuda e livros que nunca vimos. E é uma cidade maior!

O Lobo-Homem e o Feiticeiro MestiçoWhere stories live. Discover now