CAPÍTULO 23

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O colchão macio sob mim não ajuda a cessar a minha dor, não ajuda a expulsar a minha autopiedade, não ajuda a levar para longe a vontade de encher uma fonte dos desejos apenas com lágrimas, transbordar cada gota para fora de meu ser.

Meus olhos ardem, meu nariz está tampado, meu peito dói, tudo dói.

A sensação de guerra interna continua aqui, ela não me deixa, ela não me dá férias, ela não me permite respirar e muito menos ver o lindo dia que está lá fora, ela não permite que eu ame a mim mesma outra vez ou que pense em coisas boas como o cheiro das flores na primavera.

Minha cabeça só pensa em dor, em perda, em solidão e sofrimento. Vou ser abandonada outra vez, desta vez é ainda pior, desta vez não teremos escolha, desta vez vai sangrar e vai doer, não como da primeira vez, pois eu era só um bebê e nunca tinha tido uma família de verdade, eu não sabia o que eu estava perdendo, eu não sabia o que estava me faltando apesar de saber que faltava algo. Agora sei o que eu estava perdendo, agora sei o que faltava em mim, agora sei o que vou perder de novo.

Estou perdida, estou sem rumo, tudo que eu acreditava ruiu, tudo que eu pensava era falso, tudo que construí era fachada. Estar em guerra é tão complicado, você tem que observar o que está perdendo, dar baixa nos mortos e continuar treinando os vivos, continuar os mandando para uma batalha incerta. Cada célula do meu corpo me impede de levantar pela dor que sinto, mas o maldito coração, esse órgão idiota e que só me fez sofrer dia após dia, ele quer que eu levante desta cama, saia deste quarto, me recomponha e vá até a casa da única pessoa que poderia dar a cartada final para destruí-lo.

Estou desajeitada sobre a cama, um rabo de cavalo todo esfarrapado acima da minha cabeça, roupas de ontem, de quando Sang Sabe me levou para ver o que realmente aconteceu dentro daquele homem frio. Me sinto destroçada, eu preciso tanto dele agora, preciso tanto que ele me abrace, preciso tanto que ele me deixe sentir seu calor, preciso tanto que ele me ame outra vez.

Uma silhueta se esgueira pela abertura da porta do quarto e não consigo levantar a cabeça, sinto o cheiro inconfundível de Ralph Lauren's Notorious, o cheiro do meu pai.

- Achei que não estaria aqui. - A voz dele colide com meus ouvidos e fico aliviada por estar ouvindo uma voz qualquer depois de um dia inteiro com lágrimas e sem sono - Achei que estaria fazendo compras ou procurando Kang no escritório.

- Você devia estar lá, no escritório. - Ricocheteio.

- O doutor Kim me proibiu, ele disse que se eu fizer esforço vou piorar gradativamente. - Ele não sente o peso do que está falando, sua voz está calma e como se não estivesse doendo a cada dia como dói em mim - Ele não poderá me socorrer se algo acontecer esta noite, acho que ele vai a um tipo de formatura ou algo assim.

- Ah. - Silêncio. Silêncio entre pai e filha, silêncio entre família, silêncio interno, silêncio em meu choro baixo.

- Yoon Ho disse que você o expulsou ontem, que não quis a presença dele aqui.

- Eu só queria ficar sozinha. - Esclareço.

- Você nunca ficou sozinha sem ele, sempre que pediu para ficar sozinha se referiu a todos no espaço, mas nunca a ele.

Eu nunca percebi o que fiz, eu nunca notei o quão submetida ao conforto de Kang eu estava, nossas conversas, nossas brincadeiras, nossas risadas, ele sempre estava lá, eu nunca passei mais que um dia longe dele, eu nunca o perdi de vista completamente e agora eu o pedi para se perder, eu literalmente pedi para que ele fosse se perder em outro lugar, eu fui fria ontem, eu fui grossa e pior ainda, usei minha dor contra ele, como se aqueles olhinhos tivessem culpa de estar sempre presenciando a minha vida conturbada.

GOOD EVENING ✿ JJK (Livro 2)Onde histórias criam vida. Descubra agora