2.01: bianca

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Eu acordo de um sonho estranho

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Eu acordo de um sonho estranho. Um sonho bem perturbador, com gritos e choros. Mais choro do que grito. E barulho. Motores, sirenes, e gritos e choros.

Uma dor aguda na minha têmpora me acorda em definitivo. Eu me endireito, e sinto a textura da desconfortável cadeira de acompanhante do hospital raspando nas minhas costas, por cima da minha camiseta fina. Tendo não me sentir tão aliviada por saber que tinha sido só um sonho, não ficar tão confortável na paz fria que me afundava.

Porque sei que a realidade que me espera do outro lado das minhas pálpebras é pior.

Artur abre os olhos com dificuldade. O quarto está claro demais e parece castigar suas retinas. Minha visão está embaçada, já que eu também acabo de acordar.

— Artur! - eu chamei, esperando que ele respondesse de imediato – Artur, você acordou?

Temo que seus olhos se abrindo sejam apenas um reflexo. Ou uma reação involuntária ao excesso de luz. Não me lembro de ter aberto as cortinas. Não me lembro de meu pai ou uma enfermeira abrindo as cortinas. Pela claridade do lado de fora, já passou de meio-dia. Eu devo ter apagado.

Ele usa toda sua energia para olhar para mim. Suas pupilas se dilatam enquanto a minha imagem se forma diante dele. Minha imagem cansada, descabelada, cheia de olheiras de alguém que se recusava a ir para casa enquanto o irmão não acordasse.

Artur se move com dificuldade sobre a cama. Deve estar tentando se sentar, sem sucesso. Nem as mãos dele se movem. Nem o pescoço. Ele franze o cenho com força. Com dor, na verdade.

Abro a boca para oferecer ajuda, mas ele me censura com um olhar que diz "eu consigo sozinho". Ele se concentra na mão esquerda com mais empenho, e sei que a dor aumenta na mesma proporção que seu esforço.

Ele não consegue mexer o corpo. Nem um dedinho sequer.

— Eu estou sonhando? - ele me pergunta. Melhor, me desafia.

Eu daria qualquer coisa para poder responder que sim. As lágrimas correm pelo meu rosto sem dificuldade, e Artur parece sentir a agonia se intensificar. Ele odeia chororô mais do que qualquer outra coisa – sabe lá como ele tolera a Sofia.

Dou um jeito de engolir a minha choradeira para lhe dar uma trégua. Quando eu estivesse sozinha, teria todo o tempo do mundo para prantear.

— Eu não consigo me lembrar de ontem. - ele continuou uma nota de desespero em sua voz. Sua boca estava seca, rachada, talvez por estar há muito tempo sem beber água, só tomando soro. – Nada específico. Eu fui drogado e levaram meus rins? É por isso que meu corpo inteiro está latejando?

— Artur...

— É Tamara. Tem alguma coisa a ver com Tamara. Eu saí com ela?

Não consigo responder. Não consigo lhe dar certezas, ou tirar o privilégio que era ter aquela amnésia momentânea. Eu não sei quando verei o Artur idiota e arrogante que ele sempre foi de novo, não depois que ele se lembrar.

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