Capítulo 20 (Cecília)

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Acordei com a cabeça latejando. Eu estava em uma cama tão macia, que quase tive vontade de continuar deitada, até que lembrei da noite anterior. Abri os olhos, e me levantei. Vlad estava encostado na parede, ao lado da penteadeira, me encarando.

— Fiquei preocupado, encontrei você deitada no chão, suas mãos estavam levemente sujas de sangue.

— Não preciso da sua piedade, poderia ter me deixado no chão.

Ele me encarou.

— Você se lembrou de tudo, não é?

Também o encarei, e meus olhos se encheram de lágrimas.

— Eu não acredito que fez isso comigo.

— Fiz isso para te proteger....

Levantei-me abruptamente da cama, interrompendo a sua fala.

— Não ouse dizer algo assim! Nós havíamos combinado de resolver tudo juntos, como um casal, e você simplesmente resolveu tirar uma parte da minha vida e me mandar de volta para o Brasil como se nada tivesse acontecido!

— Sei que está brava, Lia...

— Eu estou magoada, Vladimir, não brava. É como se meu coração estivesse quebrado, dói mais do que se tivéssemos terminado.

Ele não respondeu, olhando para o chão. Eu continuei.

— Fiquei dois anos praticamente sozinha, achando que havia algo de errado comigo, com o fato de eu nunca conseguir me relacionar com outros caras, eu achava que era errado, agora eu sei o motivo.

— Lia....

— Eu quero ir embora.

Vlad suspirou.

— Se é o que quer.... Tem roupas limpas no baú ao lado da cama. – disse, um tanto quanto sério. – Estarei te esperando do lado de fora.

Quando ele saiu, fui em direção ao baú, abrindo-o. Lá dentro haviam diversas roupas reais e cheia de detalhes, algumas eu inclusive reconhecia da última vez que havia estado ali. Enterrei minha mão entre os tecidos, até achar um vestido mais simples, todo verde-musgo, que ia até a altura dos joelhos. Tirei o vestido vinho que ainda usava, tentando não pensar em tudo que acontecera, pois senão eu choraria novamente. Não adiantou muito. Quando eu já estava vestida e com o cabelo solto, me olhei no espelho da penteadeira. Eu nunca me senti tão perdida. Respirei fundo, e saí do quarto. Como prometido, Vlad me esperava.

Sem dizer uma palavra, ele começou a descer as escadas da torre, o segui. Na luz do dia, o castelo não era tão assustador, e a cada novo passo, eu reconhecia-o ainda mais. Quando chegamos na entrada, Vladimir sussurrou algumas palavras em romeno. Como uma mágica, as paredes de pedra sumiram, dando lugar a coloração creme do casarão. Ele abriu as portas, e saímos para a rua.

Ele então foi em direção a um carro estacionado ali perto, e abriu a porta do carona para mim. Quando eu entrei, Vlad assumiu o lado do motorista, e começou a dirigir.

— Ioan estava ocupado demais? – murmurei, com um tom sarcástico e ao mesmo tempo, ríspido.

Vladimir riu.

— Digamos que prefiro não confiar em mais ninguém. Pelo menos até você estar em segurança novamente.

Eu não o respondi, ficamos em silêncio até chegarmos na casa amarela de Eleonora. Quando o carro finalmente parou, e eu estava a ponto de descer, percebi que um homem loiro de moletom vermelho estava sentado na calçada, bem na entrada da hospedaria. Fiquei encarando por um tempo, até reconhecer quem era: Pedro. Com tudo que havia acontecido até o momento, com Vlad, o castelo, ou mesmo, os vampiros, eu havia me esquecido completamente do louco que estava me perseguindo.

— Em segurança novamente, que piada – sussurrei, saindo do carro e ignorando completamente Vladimir.

— Que engraçado, eu estava aqui justamente esperando você sair para ir ao aeroporto, e me surpreendo ao encontrá-la do lado de fora. Como está gata com esse vestido.

— O que você quer, Pedro?

O homem riu, passando a mão eu seu cabelo liso.

— Eu quero que seja minha, Cece.

Revirei os olhos.

— Isso nunca vai acontecer – respondi.

— Ótimo – ele murmurou, enquanto tirava uma faca do bolso do moletom e começava a andar na minha direção em minha direção.

Porém, Pedro nunca chegou a tempo, já que em menos de segundos, Vladimir já estava segurando sua garganta.

— Você vai se arrepender por tentar machucar a Cecília.

— Vlad – sussurrei – Não vale a pena.

Sua postura defensiva relaxou um pouco ao ouvir minha voz, e depois de alguns minutos, ele soltou a garganta de Pedro, e o segurou pelo moletom, ainda o encarando.

— Você nunca mais chegará perto da Cecília, vai se mudar para um lugar bem longe dela, viver sua vida, e nunca pensará novamente em machucar ela ou outra pessoa.

Eu demorei um tempo para perceber que Vlad não estava apenas ameaçando Pedro, mas sim, usando seu poder nele. Comecei a correr em sua direção, mas quando cheguei perto, ele já havia parado de falar. Assim que Vladimir o soltou, o loiro começou a andar para longe da casa amarela, sem dizer uma única palavra. Era como se ele não tivesse mais vontade própria.

— Você fez de novo – murmurei, passando por Vlad e entrando na hospedaria.

— Cecília.... – ele começou a dizer, mas eu não parei de andar.

Passei pelo salão onde algumas pessoas tomavam seu café da manhã, acenei para Eleonora, e depois subi as escadas até o quarto onde meus pertences estavam. Arrumei tudo o mais rápido possível.

— Já vai embora, Lia? – uma voz doce perguntou.

Virei-me e vi Anastacia parada na soleira da porta. Assenti com a cabeça. Ela suspirou.

— Bem, então posso ganhar um abraço de despedida?

— Claro – respondi, sorrindo.

Fui até ela, e nos abraçamos. Foi estranhamente bom e hospitaleiro. Ana era como uma irmãzinha mais nova. Sorri ao soltá-la.

— Obrigada por tudo, principalmente pela simpatia de você e da sua mãe.

Ela também sorriu.

— Nós que agradecemos por tudo.

Depois da nossa despedida, saí do quarto e desci as escadas. Quando voltei para o lado de fora da hospedaria, Vlad ainda estava lá. Sem dizer uma só palavra, ele abriu a porta do carro para mim. Entrei.

Após isso, seguimos para Bucareste, onde eu pegaria o voo de volta para o Brasil.

Passado Esquecido (Completo)Donde viven las historias. Descúbrelo ahora