Pequenas simples coisas.

De pôr café.

Sábado. Dia de feira na roça. São 40 minutos (de caminhada) até a feira, mas na roça existe um esquema chamado "serviço", no qual quem possui carro leva parte da população rural aos locais mais distantes, a troco de uma quantia considerável.

No dia em questão fui à feira com a minha mãe e irmã, ao passo em que na região o sábado é considerado o melhor dia da semana. Foi a primeira vez que voltei na roça depois de começar a faculdade. Estava no auge dos meus quase 20. Eu era um mito, e já estava cansada de ouvir que não tinha a idade que tinha. Mora sozinha? Coragem a sua, mãe. 

Nossa figurona estava de prontidão para usar do "serviço" da minha mãe às 9h em ponto, meio ao café da manhã. Dona Adélia é uma senhorinha viúva, forte. 76 anos de puro amor as suas terras, à sua neta-filha, plantas e bichos. Vestia uma blusa de frio arco-íris e uma touca de lã roxa bordada com flores em relevo, e mal via a hora de chegarmos a vila. Queria nos mostrar qual das barraquinhas tinha o melhor pastel de carne. 

Logo sumiu, se embaralhou entre as muitas cabeças de pessoas. Rodeamos a feira, revendo todos os encantos que a cidade grande não nos possibilita ter contato. Minha mãe comprou algumas frutas e vegetais dos produtores locais e eu logo avistei uma mulher com um carrinho de mão carregado de peças de cerâmica; sopeiras, fruteiras, vasos e mais. Todos os artefatos moldados à mão, sem torno. Coisa rústica mesmo. Me apaixonei por um bule torto. Compramos a peça e eu saí cantarolando: "Bule lindo... Bulindo! Bulindo! " por toda a feira, minha mãe rindo do jogo de palavras.

Fim de feira, nos encontramos com a Dona Adélia rumo as nossas casas. Mostrei meu Bulindo orgulhosa, feliz da vida. Dona Adélia devia ter outros 17 exatamente iguais àquele, dada sua empolgação quase nula diante do objeto de barro queimado, tosco. Não me desanimou. Passados alguns segundos, soltou uma piada com uma felicidade juvenil.

"Ocê sab a história du bulo, Anna? Pois ouça:

U bulo é di pô café, i a mulé é de pôca fé."

E explodiu em risadas que encheram todo o carro e que com facilidade me contagiaram. Rimos juntas, as quatro. 

Chegamos, Dona Adélia. Quanto é seu serviço, fia? Nada não, vai cum Deus.