Enquanto Eu Puder Vou Te Proteger

85 29 79
                                    

- Você está machucado.

- Não se preocupe, não é nada demais.- Disse Hector serenamente.

- Está sentindo dor? Parece que foi...

- Eu já disse para não se preocupar.- Agora seu tom era um pouco mais áspero e o mesmo percebeu, então imediatamente corrigiu sua postura.- De verdade, não foi nada. Acredite em mim, já passei por coisas muito piores do que um funcionário esquentadinho.

Hector Andersson estava em um corredor privado da Triunfo da Humanidade, ele se encontrava em um bloco de cela praticamente do mesmo tipo do qual mantinham-se os celestiais aprisionados. Mas essa prisioneira era uma privilégiada, quer dizer, ela estava aprisionada ali por muitos anos, era uma criança quando veio ao mundo humano contra vontade, no entanto essa celestial era diferente, e ao mesmo tempo muito comum.

Tinha olhos castanhos e o cabelo da mesma cor, porém alguns tons eram de um loiro bem clarinho, porém o castanho era a cor que mais se prevalecia, era um pouco baixa, um pouco magra, mas não muito, quem a visse não pensaria que tal criatura fosse extraordinária.

- Eles descobriram a verdade, não foi?

Hector respirou fundo.

- Isso iria acontecer uma hora ou outra mesmo.- Hector engoliu em seco. - Não é esse o motivo da minha vinda.- Ele fez uma pausa. - Eu fiz um outro acordo com Bryan, no começo ele hesitou, mas acabou concordando.- Ele se levantou da cadeira na qual se encontrava e seguiu em direção ao vidro da cela. - Vou tirar você daqui... quer dizer... parcialmente. Ainda vai ter que vir até esse inferno frequentemente e fazer testes, muitos, muitos testes, mas isso, isso não importa... O que realmente importa é que vai poder sair dessa prisão, você estará sobre minha custódia, estará a salvo.

A celestial então abaixou o olhar pensativa.

- Posso fazer uma pergunta?

- Claro.- Respondeu de forma calma e talvez até carinhosa também.

Ela parecia não ter muita certeza se queria mesmo continuar com o questionamento, mas apertou bem os olhos e prosseguiu.

- Por que você luta para me proteger, Hector? Digo, não sei se realmente "luta", posso ter usado mal o jogo de palavras, mas presumo que isso lhe causa um grande desgaste, principalmente perante Bryan Matthews. - Ela fez uma pausa. - É só que, não o vejo fazendo isso para outros além de mim.

Hector ficou sem reação por um momento ou mais.

De fato agora entendia o medo da garota de fazer tal perguntar, já que nenhum dos dois sabia ao certo o que era aquilo, a relação, se é que o que existia entre eles poderia ser considerado uma relação.

A verdade era que nem o mesmo sabia a resposta, ou pelo menos escondia saber, vivia em guerra consigo mesmo pois sabia no fundo de sua alma, só não sabia ao certo como responder.

Pensou em muitas respostas lógicas para saciar a dúvida da celestial, mas lógica não existia, não quando estava perto dela.

- Porque é o certo, eu acho.

- Mas existem outros que precisam de ajuda, talvez precisem muito mais do que eu, não acha que seria o certo com eles?

O jovem baixou seu olhar por muito pouco tempo, estava evitando olhar em seus olhos, estava com medo de fraquejar, contudo, a olhou sem hesitar ignorando seus muitos pensamentos.

- Não posso salvar todos, mas os que eu posso... - Ele fez uma pausa.

- Não minta, por favor. - Falou ela baixinho, quase que como um suspiro, mas ele escutou.

Hector respirou fundo, não conseguia entender o poder que aquela criatura tinha sobre ele.

- Escute, eu não sei como era sua vida antes daqui, e sinceramente isso não me importa nenhum pouco, o que eu sei é que era praticamente um bebê quando a trouxeram, sei que te torturaram e te machucaram, ouvi dizer que te deixaram 58 dias sem comida e 33 sem água, e esses foram os dias que "contaram" na ficha técnica, só que não importou, pois mesmo assim não padeceu, não completamente, sei também sobre o tratamento de choque, sei de todas as coisas horrendas, só que isso ainda não é nada, não é nada porque ainda é jovem, nem queira saber o que fazem com os mais velhos.

Hector estava nervoso, não queria demonstrar, mas já estava demonstrando desde o início da conversa, porém por incrível que pareça, continuava firme e sem qualquer tipo de emoção na voz, causando um leve medo na garota.

Talvez fosse mais seguro ter medo dele.

- Se eu dissesse que gostaria de salvar a todos, seria mentira, não sei se quero salvar a todos e nem posso, talvez seja egoísmo, sinceramente não ligo, mas você, é diferente, não entendo a razão cósmica ou divina se é que qualquer uma das duas exista, de querer te libertar, contudo estou focado em fazer isso... e enquanto eu puder... eu o farei.

O clima que havia ficado no ar era bastante pesado.

Hector era uma pessoa um pouco fria e calculista em quase todos os aspectos de sua vida, mas não gostava de magoar aqueles com quem verdadeiramente se importava.

- Como gostaria de ser chamada?-Perguntou ele tentando fazer o ar mudar de humor e também uma tentativa de animar a própria celestial.

A atenção da garota que estava cabisbaixa foi capturada.

- Como assim? Quando nós conhecemos disse que não queria saber o meu nome, foi bem claro a respeito disso, por que a mudança repentina?

- Bem, é que você nunca me disse seu nome de fato, parte disso por minha culpa, mas depois que ficamos... amigos, ora, já nos conhecemos a quase um ano, e eu não me sentiria muito confortável te chamando de Indivíduo da Colina sul 23447 o tempo todo.

A celestial deu um sorriso tímido tentando esconder sua vontade de rir. Arqueou as sobrancelhas em provocação.

- Sim, sim de fato não seria algo muito...

- Normal? Humano?-Disse Hector em um tom brincalhão para não magoar a jovem do outro lado da cela de vidro.

- É, de fato nenhum dos dois.- Dessa vez ela deu uma risada que era mais tímida do que seu sorriso.

- Brincadeiras a parte, como gostaria de ser chamada, de verdade?

Ela ficou pensativa por um minuto.

- Sabe, no meu mundo nós recebemos dois nomes, um quando nascemos e outro quando casamos, o nome sempre está relacionado a Casa à qual pertencemos ou vamos pertencer.

Hector já sabia disso, mas não ousou interromper.

- Nunca imaginei escolher um nome novo sozinha.

- Não precisa ser novo, pode usar o que já possui.

- Não. Esse nome é a única coisa que ainda não arrancaram de mim, é a única coisa que eles, que Bryan nunca vão saber.

Ele assentiu, não ficou bravo pelo fato do não compartilhamento de seu nome, ele mesmo queria que ela o escondesse no começo, mas agora estava curioso para saber.

- Aurora. É esse o novo nome que vai me pertencer a partir de hoje.- disse sorriso com determinação fazendo uma covinha aparecer.

-Aurora. Gostei, é digno de uma princesa. - Ela pôde sentir a vermelhidão evadindo lhe o rosto.- Mas por que Aurora?

- Quem sabe um dia eu lhe conte, não é mesmo? Afinal teremos tempo, ou assim espero, e eu sei que enquanto puder, vai me proteger para que esse tempo seja muito especial e vamos torcer para que seja longo também.

- Ele será.

Um Novo Mundo Que Roubamos Para NósWhere stories live. Discover now