Capítulo 4

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Nenhuma missão especial do fim de semana necessitou de sua participação direta, mas mensagens com coordenadas de andamento de investigações chegaram vez ou outra no seu telefone corporativo.
May não o perturbou mais no fim de semana, mas, na segunda, enviou mensagem por sábado, domingo e segunda. Ela não desistiria disso, Wiliam pensou resignado. Uma das mensagens: "A angústia de ter perdido não supera a alegria de um dia ter possuído, fazia alusão ao que conversaram no sábado sobre a mãe dele, Lisandra. "
Eugenio entrou em sua sala e surpreendeu-o distraído com as mensagens.
‒E aê, chefe, a isca entrou em contato? ‒ bisbilhotou e atacou os doces sobre a mesa. Wiliam enrijeceu-se tenso com o modo como Eugenio a chamou.
‒ Não ‒ mentiu. Iniciou o notebook e procurou arquivos inexistentes. Eugenio o observou.
Droga, não podia levar isso adiante, repetiu Wiliam para si. A garota não merecia ser usada assim.
‒ Ah, que pena ‒ Eugenio lamentou. O chefe ignorou seu comentário e continuou abstraído, indisposto a dar assunto.
A rotina semanal sucedeu-se normalmente: denúncias, flagrantes, papéis para assinar, investigações, insônias, pesadelos, mensagens.
Sábado, May foi novamente a sua casa, fez o almoço e repetiu os enfadonhos exercícios que ele só fazia para não contrariá-la. Queria que ela parasse de vir por conta própria.
‒ Vou te ensinar outro exercício para você adicionar à sua rotina ‒ avisou depois que fizeram a sessão de relaxamento por dez minutos. ‒ Fique em pé, afaste as pernas e flexione um joelho. Essa é a posição dos guerreiros ‒ indicou. Ele fez.
Ela vestia uma blusinha de alça lilás que expunha parte da barriga ao movimentar-se. A atenção dele claudicou ali. Engoliu em seco.

‒ Agora abra os braços e mantenha-os na mesma altura dos ombros, de olhos fechados ‒ exibiu a posição. ‒ Esquece tudo. Ouça o toque do seu próprio coração ‒ posicionou-se atrás dele e segurou seus braços no ar. ‒ Direcione seu pensamento a si, ao seu pulmão, às reações do seu corpo ‒ instruiu baixinho. Seu fôlego fez um arrepio inexplicável correr da nuca à coluna de Wiliam. ‒ Esse exercício é indicado para desenvolver determinação e autoconfiança ‒ explicou atenciosa. Ele inspirou longamente. A respiração e cheiro dela tornou o ar denso. Essas reações lhe eram estranhas. ‒ Agora faça com a outra perna ‒ pediu. Ele fez. Após a sessão de exercícios, ela explicou sua teoria para a recuperação dele.
‒ Seres humanos habituam-se por repetição, por isso vamos repetir exercícios para equilíbrio da mente e condicionar seu corpo a necessitar até que já faça parte de sua rotina.
Ele não respondeu. Sentou-se no carpete. Hoje estava particularmente introspectivo.
‒ Eu trouxe um livro para você ‒ ela abriu a bolsinha e lhe entregou. ‒ Treinando a emoção para ser feliz.
Ele alternou o olhar do livro a ela, confuso.
‒ Por que você acha que eu preciso de um livro de motivação?
‒ Não é que você precise. O mundo precisa ‒ ajoelhou-se ao seu lado, pegou o livro da mão dele e contou as páginas. ‒ Faz assim: leia dois capítulos. Se não te chamar a atenção, abandone ‒ sugeriu amistosa, olhou no relógio e fez uma careta. ‒ Tenho que ir ‒ deu-lhe um beijo gentil no rosto e caminhou para porta.
Ele seguiu para seu quarto e desabou na cama. Depois de uma semana sem dormir direito, iria compensar.

Acordou no fim da tarde quando um pesadelo se iniciava. Levantou-se tenso, preparou leite com cereais e sentou-se no sofá. O livro que ela deixou estava no chão, desafiando-o a ler. Abriu a primeira página. A introdução falava sobre a busca da felicidade pela humanidade. Leu criticamente até o momento em que a autor citou sobre gerenciar pensamentos. Rejeitou o argumento com um esgar cético, jogou-o sobre o sofá e voltou ao quarto. Não precisava de livro de autoajuda. Dividir a emoção multiplica a felicidade. Cada uma!
Terça-feira seguinte, após uma reunião com o Coordenador Gabriel Soto e todos os líderes da DEA da Califórnia, recebeu um telefonema preocupado do juiz Carlos falando sobre o vazamento de uma investigação em cima de antigões da Narcóticos de Los Angeles.
‒ Para mim são só especulações. A minha unidade é honesta ‒ defendeu.
‒ Em horas como essa repito que você era muito inexperiente para assumir a Agência ‒ retrucou. ‒ Fique de olhos abertos.
‒ Você sempre vai jogar na minha cara que estou aqui por sua influência? ‒ acusou ofendido. ‒ Pode deixar que irei observá-los ‒ e desligou hostilmente. Eram desgastantes as críticas do seu pai ao seu trabalho.
Passou a observar mais os agentes no decorrer dos dias. Analisou que carro usavam, roupas que vestiam. Procurou diferenças exorbitantes entre os bens que tinham e o que o salário poderia pagar. Nada lhe chamou a atenção.
Sexta-feira, nove da manhã, após treinar no stand de tiro, Wiliam encontrou Eugenio na academia de musculação e seguiram juntos pelo corredor para sala de Wiliam. A maioria dos agentes treinava àquela hora. Nadavam, malhavam na academia, corriam no campo de futebol.
Ao entrar na sala, Eugenio confidenciou, ansioso. ‒ Peguei uma gravação sobre uma negociação de cocaína pura...
Eugenio explicou que o material seria entregue domingo, cem quilos, mas que teriam que montar guarda para vigiar o suspeito até descobrir o local. Wiliam instruiu a equipe Alfa e Delta a revezar na vigilância ao suspeito durante o fim de semana.

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