Capítulo 14

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Nada poderia tirar a paz daquele instante. Ninguém dormia, mas o silêncio no quarto era absoluto, sendo interrompido somente pela repercussão do som de pingos de chuva que gotejavam harmonicamente na janela de vidro.
May encontrava-se deitada de bruços, com um lençol cobrindo o quadril, enquanto Wiliam seguia com a cabeça descansando em suas costas, os dedos deslizando em sua cintura.
A realização enchia o coração da adolescente, onde um sorriso contente enfeitava seus lábios, ao passo que sua mente vagueava na reprodução dos detalhes gráficos da nova experiência.
Já Wiliam, após ter a necessidade fisiológica satisfeita, mergulhou em si, com a razão subvertendo a emoção, e deparou-se com o frio sentimento de acusação. A análise do modo que a tratou antes, catapultava sentimentos aflitivos de culpa e repugnância, deixando sua consciência à beira do caos emocional.
Bastava acariciar a delicada pele embaixo de seus dedos para que recordasse sua idade e condição. E, embora, seus sentimentos e decisões anteriores permanecessem inalterados independente da nova situação, haviam responsabilidades suscitadas a serem reavaliadas. Por isso, precisavam conversar.
"Acho que você precisa de um banho." Ele sussurrou com a voz vazia de emoção.
"U-hum." Exaurida, não teve forças de abrir os olhos. Todavia, quando menos esperou, sentiu o corpo ser erguido da cama. "Hei, eu consigo andar!" Resmungou, mas apoiou com langor a cabeça em seu peito.
Ele caminhou com o pequeno corpo nos braços como se não pesasse nada.
"Essa é a primeira vez que eu te vejo em uma posição dependente. Deixe-me cumprir meu papel de homem por aqui." Deu-lhe um beijo na testa, sentou-a na borda da banheira e ligou as torneiras. Ela encostou a cabeça na parede, indolente, e esperou-o adicionar meticulosamente sais à água de banho. A seguir, colocou-a delicadamente na água.
"Está me tratando como uma criança." Resmungou e encostou a cabeça na borda da luxuosa banheira.
"Deixe-me cuidar de você." Passou o polegar em sua bochecha. "Não está acostumada a que façam isso, não é?"
"Não."

"Acostume-se. Fique aqui um pouquinho, enquanto eu organizo as toalhas e troco os lençóis da cama."
Deixou-a lá, voltou para o quarto e deparou-se com a prova de horas de sexo. Os lençois desfeitos, úmidos, e a mancha de sangue no local onde May deitou antes. Balançou a cabeça para sua estupidez e cegueira, convicto de que suas obrigações se duplicaram, recolheu os lençóis e seguiu o caminho da lavanderia. Não iria deixar provas ali para que dona Kebi suspeitasse do que tinha feito. Não iria expor sua intimidade.
Após repor os lençóis, voltou para o banheiro e May encontrava-se quase imersa até o pescoço por espuma e água. Desligou as torneiras, pôs as toalhas no pegador e entrou, aconchegando-se atrás dela, que ainda jazia tórpida. Sentou-a entre suas pernas, apoiou as costas na boda, deitou-a em seu peito e esperou uns segundos antes de ressuscitar assuntos procastinados.
"Por que usa anticoncepcional, se não tinha uma vida sexual ativa?" Acariciou-a displicentemente na lateral do seio, tentando mostrar-se tranquilo.
Ela suspirou e preparou-se mentalmente para a série de perguntas que, finalmente, não precisaria mais evadir. Não agiria mais como uma adolescente insegura que usou de artifícios para ludibriar e prender um homem. Ele esperava uma conversa sincera e adulta. Era assim que seria.
"Por que desde quando fiquei mocinha, não era regular. Tinha ciclos duas vezes no mês, depois ficava três meses sem nada, para então vir de um jeito que me passava vergonha na escola. Por isso o médico me receitou hormônios que eu só tivesse ciclo de seis em seis meses. Muito mais tarde fiz mais exames e descobri que tenho ovários policísticos. Por isso essa disfunção."
Pensativo, ele derramou um pouco de loção de banho na mão, espalhou uma na outra e passou a esfregar as mãos nos braços da menina, massageando. Depois dirigiu-se aos seus ombros. Ela mudou o corpo e passou a beijar devagar o seu peito, acariciando nesse tempo o peitoral com a ponta dos dedos.

"Explique-me de novo tudo que aconteceu quando foi morar com Sebastian. Detalhadamente para que eu possa entender porque eu não consegui ver antes o papel de Peter na sua vida." Buscou ocultar na voz a irritação interna em não ter examinado minuciosamente o fato. Estava tão preocupado em meter-se em suas calcinhas que nem cogitou deliberar impedimentos. E é lógico que ela supostamente ser mãe era somente um incentivo mental a seguir em frente... Cego.
"Hmmm, repetindo, quando minha tia procurou para Sebastian, dizendo o que minha mãe queria fazer, imediatamente ele me buscou e eu fui morar na casa que ele tinha na Zona Sul."
Wiliam assentiu, trazendo imediatamente o cubículo que Sebastian morava à memória. Apesar que, Sebastian praticamente morava em sua casa, não na Zona Sul.
"...Bom, Sebastian quase não vinha em casa. Às vezes só uma vez por dia, às vezes dormia, muito raramente. Ele tinha uma vida muito agitada. Estudava, trabalhava..."
Wiliam fez os cálculos mentais da data e anotou que essa época já estudava na Virginia.
"...Eu acostumei a ficar sozinha. Um mês depois, Sebastian conseguiu mudar meu nome e arrumar uma escola para eu estudar. Só que neste mesmo ano Peter veio para mim, então o ano escolar foi praticamente perdido, já que eu tinha que cuidar dele. "Mas cuidou dele sozinha?"
"Não. Uma vizinha me ajudava de vez em quando."
"De quem Peter é filho?" Sua voz saiu mais dura do que desejava.
"Meu." Respondeu indiscutivelmente.
Ele suspirou buscando paciência, o mau humor querendo sobressair.
"Quem é a mãe biológica de Peter? Você a conheceu?"
May negou balançando a cabeça, sentindo-se tensa como cordas de violino ao vê-lo distanciar-se. "Não. Não a conheci. Só sei que era alguém que Sebastian gostava muito."
"Por que ela não ficou com Peter?"
"Não sei. Sebastian não fala." Defendeu-se já um pouco nervosa. Não entendia porque ele ficava mais gélido quando falavam de Sebastian. Antes entendia que tinha ciúme. Agora havia uma antipatia injustíficável que não conseguia classificar motivos.

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