Capítulo II

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Acordei cedo demais. Tendo em vista a cama e companhia atípica, eu não fiquei surpresa quando eu tateei pelo meu celular na escrivaninha e a hora marcava cinco da manhã. Não foi muito difícil sair dos lençóis sem acordar Cato; ele sempre teve um sono muito pesado. Envolvi-me com um xale e abri levemente a cortina, e enquanto meus dedos corriam pelo tecido afastando-o para o lado, fechei os olhos e senti uma febre se apossar de meu rosto. Abri os olhos levemente, não tinha como não sorrir. O sol despertava sobre o mar da praia, o céu em revés manifestava um róseo e púrpura do que restava da noite. Poderia muito bem ser uma releitura de uma obra impressionista.

A pior coisa de trabalhar e estudar é porque eu raramente tinha tempo o suficiente para vivenciar esses espetáculos naturais tão presentes em nossas vidas. Qual foi a última vez que eu vi um nascer do sol? Eu não consigo lembrar, respondi para mim mesma. Eu lembro de uma vez ter ido estudar de manhã e voltar ao trabalho à tarde para cobrir uma vendedora que adoecera, o que era bastante atípico, mas naquele dia eu saí às 16h da tarde. No momento em que eu coloquei os pés para fora do shopping eu fiquei exaltada com o pôr do sol. Por tanto tempo eu não tinha visto um, nem num carro, nem sem querer. Simplesmente não lembrava como era um fenômeno lindo. Naquele dia eu chorei voltando para casa e não era um choro ruim.

De relance, olhei para Cato jogado no meio da cama, torto que nem lombriga e desejei acordá-lo para apreciar aquela visão comigo, mas ele me jogaria nessa esquadria caso o despertasse antes das oito da manhã. Ri comigo mesma. Tomei nota de agradecê-lo mais uma vez por me trazer aqui, eu precisava ver mais coisas bonitas. Fechei os olhos para sentir o calor do dia em mais uma dose antes de sair do quarto.

Antes de procurar algo para comer, eu resolvi dar uma olhada no resto do segundo andar, aproveitando que estava todo mundo dormindo. Foi uma tour bastante rápida, mas de tirar o fôlego, o segundo andar não era tão grande assim como o primeiro, mas era tão incrível quanto. Um pequeno corredor separava o meu quarto do casal, eles provavelmente pegaram a vista para as outras casas –e eu duvido muito que esse quarto específico tenha uma parede de vidro. No fim do corredor havia uma entrada para uma outra sala de estar.

Apesar da decoração dar a mesma sensação de rústico, aquela sala era mais leve. Os tons eram mais claros; as paredes tinham tons de amêndoa, os pendentes de lustres tinham formatos de pequenas gotas de luz e haviam três sofás que se encontravam no meio da sala dentro de uma leve depressão. Encostei meu corpo no portal e suspirei fundo. Meu coração de artista frustrada ficou emocionada ao ver um piano de cauda preto à direita ao lado de outras portas de vidro. Inclinei minha cabeça para o lado pensando no quanto eu amava aquele instrumento.

"Eu não entendo porque você parou" levei um susto.

Olhei para o lado e um Cato com cabelo desgrenhado e cara massada sorria amarelo para mim. Voltei meu olhar alheio para o piano.

"Você sabe o porquê" repliquei, de modo afiado.

"Eu conheço uma história, mas não entendo porque você parou de tentar"

Fiz que não com a cabeça e engoli o choro que se instalava na minha garganta. Cato percebeu e tirou a mecha do cabelo que escondia o meu rosto.

"Música nunca foi para mim"

"Estamos longe da capital aqui, Iva. Ninguém te conhece por aqui, então tente. Estou do seu lado." Ele desvencilhou a minha mão da outra e a segurou com firmeza. "Só estou dizendo" olhei-o nos olhos. "Aliás, eu já te escutei uma vez" ele me deu um sorriso comprometedor.

"Eu estava bêbada. E não foi tempo o suficiente para você tirar conclusões" rebati deixando o pé da porta em direção à escada.

"Foi o suficiente para eu querer te ver de novo, não foi?"

O que Eu Gostaria de Dizer Antes do Fimحيث تعيش القصص. اكتشف الآن