Os Dawson

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Londres, 1920.

O ano era 1920. Na agitada cidade de Londres que ainda sofria os impactos da guerra. Pessoas desempregadas e implorando por empregos nas ruas e portas de estabelecimentos. Famílias desabrigadas e homens de família cometendo suicídio por não saberem lidar com suas saúdes emocionais. Por um outro lado, a agitação da cidade também se dava por conta dos inúmeros pubs e casas de shows que comandavam Londres à noite. Pode-se afirmar que cada um tentava continuar a vida da maneira que podia.

A família Dawson, por exemplo, pouco se importava com os acontecimentos citados a cima. Viviam muito bem em sua mansão, seus cavalos e carros luxuosos. O Sr Dawson trabalhava com a cavalaria durante a guerra. Por conta de sua idade lhe foi dado um trabalho menos braçal e ele ficava basicamente dentro de  escritório. Por conta disso, não voltou com a cabeça fora do lugar como tantos outros soldados.

Sua esposa, a Sra Dawson, era uma mulher elegante, bonita e fria. Desfrutava do riquíssimo estilo de vida que seu marido proporcionava a ela. De fato, era com o que ela mais se importava. Tornou-se esposa ainda nova e por um casamento arranjado. Sua família adquiriu uma dívida enorme por conta de seu pai e quando o velho faleceu, sua família precisava de recursos financeiros para não virarem vergonha pela cidade. Deu-se então o casamento dos dois. O casal Dawson teve duas filhas: Anya e Amélia Dawson.

No presente momento, Anya tem 11 anos e sua irmã mais nova Amélia, 8. Gerald Dawson, o pai das meninas, sempre quis ter um filho homem. E sua esposa que sempre desejou o mesmo, para a felicidade de seu marido, não conseguiu se apegar às filhas. As duas foram criadas por babás diferentes durante suas infâncias. Anya, a mais velha, tinha um gênio forte, que, apesar de não ter uma boa relação com o pai, herdou a personalidade dele. No entanto,  Amélia era mais dócil e temia os pais. As duas irmãs eram melhores amigas. Anya sempre defendia Amélia quando a via em uma situação que considerava injusta.

As garotas não podiam sair de casa para quase nada. Era uma ordem. As irmãs tinham professores particulares que eram assitidos por soldados que trabalhavam para o Sr Dawson. A função deles era estarem  certos de que as professoras não enchiam as cabeças das meninas com histórias fantasiosas sobre o mundo e de que isso não as fariam se revoltar contra a criação que lhes era dada.  Os mais de 30 guardas que rondavam a mansão se certificavam que as meninas jamais saíssem de casa sem a companhia de seu pai excepcionalmente. A regra não se estendia nem para a própria mãe. Mas a Sra Dawson na verdade não ligava para o que suas filhas achavam disso. Só queria deixar seu marido contente o tempo todo. Pois isso garantia que ele não a largasse e a deixasse pobre com duas crianças as quais nem amava para criar, era esse seu maior medo. E vivia em função disso.

Apesar de Anya tentar questionar diversas vezes com seu pai a tal regra do confinamento e receber várias ameaças de sua mãe ao ver que a menina deixara o pai irritado, não conseguia deixar a casa quase nunca e isso a irritava muito. Ela sempre gostou de ser livre. De poder olhar o mundo e fazer perguntas às pessoas sobre ele. Ela não tinha isso. Não havia diálogo com quem pudesse dar a ela essas informações. Algumas vezes, a Srta Georgia, professora que a ensinou a ler, escrevia em algumas anotações de Anya sugestões de livros em letras bem pequenas para que ninguém, além dela, notasse. Por motivos óbvios, Georgia era a professora favorita de Anya. A casa tinha uma enorme biblioteca. Mas os Dawson nem imaginavam o interesse da filha mais velha pelos livros. Anya passava horas e horas lendo diversos livros. Aprendeu línguas estrangeiras (além do francês que era ensinado às duas). Ela sabia coisas sobre a guerra e as revoluções que haviam acontecido. Lia também alguns romances apesar de não ser tão apegada a eles.

Anya lia um romance qualquer quando ouviu a porta da biblioteca ser aberta.

- Anya, vamos, seu pai já nos espera no carro. – disse sua mãe enquanto ajeitava as luvas na mão sem ao menos olhá-la ou que o que ela estava fazendo.

Naquele final de semana a família iria visitar a avó paterna que morava em uma cidade pequena no interior da cidade chamada Birmingham. A Sra Smith, avó das meninas, nunca aceitou a vida luxuosa que seu filho tentou lhe dar. Era simples e modesta. Casou-se com um homem por quem era apaixonada e quando ele morreu, não conseguiu deixar a cidade em que eles sempre moraram juntos. O filho dela, no entanto, assim que completou maior idade, foi-se embora do interior que considerava um fim de mundo e que lhe daria 0 oportunidades de ter a vida que ele queria. Logo, mudou-se para Londres deixando a mãe para trás. Quando enriqueceu, tentou trazer a velha para a cidade grande, mas como já foi dito, ela orgulhosamente recusou o convite… diversas vezes.

- Anya! - ouviu-se uma voz raivosa alta dessa vez.

A menina fechou o livro rapidamente com o susto que levou. Deixou o objeto em cima da poltrona em que estava sentada e correu para a porta da frente da mansão. Sua mãe a fuzilava com o olhar enquando sua irmã mais nova corria em sua direção  sorrindo para envolvê-la nos braços, como sempre faziam antes de saírem da casa juntas.

- Seu pai já está no carro. Nem mais um minuto aqui dentro. Vamos! – a mãe alertou as meninas.

As duas se olharam e Amélia segurava o riso enquando Anya imita a  postura da mãe enquanto chamava a sua atenção.

- Vamos visitar a vovó, finalmente! Está contente como eu? – Amélia perguntou empolgada à sua irmã.

- Sabe que adoro a vovó, Amélia. Mas odeio o fato de ela morar longe e numa cidadezinha horrorosa. Só tem fumaça e cheiro de cocô de cavalo. – disse Anya fazendo careta enquanto as duas desciam as escadas que davam acesso ao carro que já as esperava.

- Pelo menos vocês vão poder botar o papo em dia. Vocês conversam tanto quando a visitamos.

- É verdade, essa parte me faz não inventar uma doença para que não me tirem da cama.

- Minha nossa, Anya. De onde você tira tanta coragem, hein?

Anya não respondeu. Só sorriu para a irmã e as duas entraram no carro. Seu pai dava as últimas ordens para algum homem e se juntou à sua família no veículo.

- Querido, sabe que eu adoro a Sra Smith, mas não pretende demorar lá, não é? – disse a esposa forçando um sorriso sem mostrar os dentes.

- Ficaremos o tempo necessário, Ava. Não me perturbe com isso novamente. Não quero que o que aconteceu da última vez se repita.

Anya deu uma risada leve no banco de trás. Chamou a atenção do pai.

- Algum problema, Anya? – disse o Sr Dawson em um tom sério virando-se para trás.

- Não. Só me lembrei do ocorrido. – respondeu olhando pela janela não dando importância à pergunta do pai.

A Sra Dawson revirou os olhos e o homem mandou que desse  partida no carro até o porto de Londres.

Sensível como uma bomba - Jhon ShelbyWhere stories live. Discover now