12.

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Tudo o que começa, em algum momento, termina. Essa é a lei da vida. Aquela madrugada foi o começo do fim. Foi o início do declínio de tudo o que eu queria que durasse para sempre.

Jonah me pediu para conhecer seus pais naquela noite. Sua mãe, Clarice, era gentil, mas constantemente repreendida por Lorenzo. Ele, outrora, não se dirigiu diretamente a mim. Jonah pediu para que eu dormisse lá e seus pais insistiram, estranhamente.

Dormimos juntos, mas de madrugada, acordei com sede. Jonah disse que podia ir tranquilamente à cozinha e eu fui. Lá, encontrei-o. Lorenzo estava lendo sob a meia luz da cozinha vestindo um roupão de seda, segurando uma taça de vinho com plenitude.

— Boa noite, Kaya. — Disse em seu ar de soberania.

— Boa noite. Já estou voltando para o quarto. Não sabia que estava aqui.

— Não, fique. Gostaria de falar com a namorada do meu filho.

Eu não devia ter ficado. Eu devia ter virado as costas para Lorenzo e voltado para debaixo das cobertas para junto do Jonah, para ficar com as pernas entrelaçadas e o corpo relaxado no sentimento de infinidade. Devia nunca ter saído do lado do homem que amava, mas eu fiquei. Fiquei para ouvir o que seu pai tinha a dizer e esse é meu maior arrependimento.

— Sabe, Kaya, o Jonah sempre foi um menino esforçado e inteligente. Ele te contou que quer estudar com a irmã na Holanda? — Disse ao fechar o livro.

— Ele me contou que se inscreveu. — Assenti.

— Também te contou que ele e Maia planejavam isso desde crianças? — Encarou-me. — Ele tem um futuro brilhante, diferente da Maia. Ou de você. Você está presa à mesmice dessa cidade, trabalhando de garçonete e tentando garantir ao menos o futuro da sua irmã brilhante.

— Eu não sou obrigada a ficar ouvindo suas ofensas.

— Não é sobre você. — Aproximou-se. — O Jonah tem tudo para ser um cientista brilhante, como ele quer ser. Ele sempre quis estudar fora e ser alguém importante. Você sabe disso.

— Eu sei.

— Mas tem uma coisa que não sabe, Kaya: que Jonah não irá embora por sua causa. Ele ficará por você e deixará o sonho de lado. Terá um futuro medíocre como o seu, de quem serve mesas pelo resto da vida. Não é inteligente, muito menos tão bonita. Não chega a ser magra o suficiente para ser modelo. Não tenho dinheiro, sobrenome e nem família. — Abriu um sorriso cínico. — E sabe o que é pior?

Eu estava humilhada e não sabia o que lhe dizer.

— O pior é que até alguns anos, ele vai achar que está fazendo certo e continuar te amando. Depois de mais alguns anos, vai começar a se frustrar por beirar a sua mediocridade. E então, no fim, vai se ressentir de você e o relacionamento termina de qualquer jeito, mas odiando e com o futuro dele destruído. Por sua causa.

Odiando Lorenzo ou não, ele parecia ter razão. Visualizei toda as suas palavras na minha cabeça e tive apenas uma confirmação daquilo que disse.
Imaginei Jonah se ressentindo de mim. Se afastando de um toque, se repelindo dos sentimentos, não mais sorrindo com os olhos ou deixando de me amar. Imaginei-o me deixando e se arrependendo de um dia ter ficado comigo. Ter trocado seu futuro por mim e depois ficar sem nada. O fardo de acabar com o possível futuro brilhante de Jonah era algo que eu não poderia carregar. Não por egoísmo.

— Pensei nisso. Pense em tudo que está colocando em risco por um amor de verão. Não é como se você fosse a mulher da vida dele. — Afirmou solenemente.

Lorenzo deixou o livro sobre a ilha de mármore branco, deu a volta e saiu sem dizer mais uma palavra sequer. Ouvi seus passos partindo na direção da sala. Compassados e pesados. Ensurdecedores.

Fiquei mais cinco minutos na cozinha encarando o nada e absorvendo o impacto irreparável das palavras daquele homem. Se eu não as tivesse ouvido, tudo teria sido diferente. Eu não teria obrigado o homem da minha vida partir, não teria assinado minha prisão a esta cidade, não teria tido uma filha com outro homem, não teria ido à colina do farol todos os sábados durante onze anos, não teria tido a vida parcialmente feliz que tive. Eu não teria sido a mulher cheia de esperanças vazias na volta de Jonah. Se eu tivesse virado as costas e decidido não ouvir suas palavras, talvez tivéssemos mais onze anos juntos. Mas então eu não teria Louisa. Quando me lembro disso, converto o arrependimento em gratidão. Não a Lorenzo, mas ao destino.

Voltei para o quarto arrastando-me. Aninhei-me à Jonah que sibilou algo inaudível e não perguntei o que era, pois não queria que ele acordasse. Abriu os olhos como se quisesse ter certeza de que era e eu e de que eu estava mesmo ali. Beijou minha testa e sorriu. Fechou os olhos novamente e se pôs a dormir.

— Eu te amo. — Eu murmurei depois que sabia que já havia adormecido.

Não consegui mais dormir depois. Passei a madrugada remoendo as palavras indigestas de Lorenzo. Tentava aceitá-las, mas não desciam. Tentava encontrar melhor forma de resolver isso, mas nada me vinha a mente, senão fazer exatamente o que eu, infelizmente, fiz.

Segurei o relicário por um instante, encarei Jonah sob e luz do sol que escapava pela breve fresta da cortina e respirei fundo. Sentia-me como uma juíza perante um caso cheio de provas que acusavam o inocente, mas que nada podia fazer além de condená-lo. Condenei nosso amor e todos os sentimentos entre nós, pois as provas de que Jonah precisava ir eram mais que o suficiente para que eu não o pedisse para ficar. 

Onde o oceano não nos alcança.Where stories live. Discover now