16. Lágrimas

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As palavras saíram de sua boca e me acertaram diretamente no peito. As palavras ecoavam dentro da minha cabeça como se subitamente eu estivesse completamente vazio. Como se aquelas 5 palavras tivessem tirado tudo de mim. Jamia era o amor da minha vida e essa era uma das poucas certezas que eu tinha. Nós estávamos juntos há tanto tempo. Nós nascemos um para o outro. Como ela poderia querer o divórcio? Aquilo não fazia sentido. Eu estava perdido. Eu estava zonzo. Eu precisava entender aquilo melhor. Talvez fosse brincadeira. Só poderia ser brincadeira.

— Que brincadeira é essa, Jam? - Eu parei em sua frente com os braços abertos.

— Eu não estou brincando. - Ela andou até a janela e continuava olhando para o jardim.

— Como assim? Como? Por que? - Eu estava atrás dela e começava a levantar a voz um pouco.

— A gente não funciona mais, Frank. Você não percebe? - Ela se virou para olhar nos meus olhos e eu pude perceber que os seus olhos estavam cheios de lágrimas.

— Perceber o que, Jam? - Eu continuava olhando pra ela perdido e conseguia sentir as lágrimas vindo.

— Que nós não nos amamos mais como antes, Frank. Nós dois estamos apaixonados por outras pessoas e continuamos nesse relacionamento por conveniência. - As lágrimas escorriam por sua face e ela soluçava.

— Você está falando do Gerard? Você sabe que eu posso ficar com ele, mas eu sempre vou voltar pra você, meu bem. - Eu disse enquanto limpava a sua bochecha com a manga da minha blusa.

— Você sabe que não é isso, Frank. Você sempre amou ele e continua amando. Quando eu te dei o ultimato mais de 10 anos atrás e a gente se casou, eu fiz aquilo porque eu sabia que ia acabar te perdendo pra ele. Você muda completamente perto dele. Só você não percebe isso. Comigo você vive a sua vida no automático, mas com ele, você realmente vive cada momento. Até o brilho dos seus olhos muda! Isso não me incomodava mais porque vocês não estavam se falando. Mas agora você tem o caminho livre... E ele parece querer tanto também. Ele organizou toda a sua festa. Eu nem pensei em fazer nada, ele fez tudo. Ainda me deu a ideia de comprar a sua passagem pra te segurar em Nova York e fazer a surpresa. Ele pensou em cada detalhe que você ia gostar, em cada amigo que você não via há muito tempo pra chamar. E eu fiz o que? Comprei doces pro halloween e só. Você não vê a diferença? Ele é a pessoa certa pra você, não eu! - Ela soluçava, chorava e gesticulava enquanto falava.

— Hey, hey, mas foi VOCÊ que eu escolhi pra viver a minha vida, não foi? - Eu disse logo após abraçá-la.

— Não é disso que eu tô falando. - Sua voz saiu abafada porque o seu rosto estava enterrado no meu pescoço.

— Você quer que eu me afaste do Gee de novo? Eu me afasto. Eu bloqueio ele. A gente só ensaia. Ou melhor, a gente cancela tudo. Eu tenho poder pra isso. Foda-se o Gerard, foda-se o My Chemical! Eu ligo pro Brian agora! - Eu me afastei um pouquinho pra poder olhar pra ela, mas ainda estávamos abraçados enquanto eu falava.

— Você não está pensando no que você está falando, Frank! O My Chemical é a sua vida! Para com isso! Eu jamais iria te pedir algo assim! E não é só o Gerard. Eu também conheci alguém... - Ela soltou o abraço e andou para o outro lado do quarto.

— Isso eu já imaginava, eu só não imaginava que você fosse me trocar assim... - Eu olhei pra baixo em uma tentativa frustrada de esconder as lágrimas.

— Frank, não foi algo que eu controlei. Ele surgiu e parece o certo, sabe? Você merece viver o seu amor com o Gerard e eu quero tentar. Pode ser que nada disso dê certo e eu esteja completamente errada, mas nesse momento eu estou tão infeliz com tudo. A gente não merece isso, a gente não merece um divórcio com nós dois brigando pela guarda das crianças e pelo nosso dinheiro. Eu quero poder continuar sendo a sua melhor amiga. - Ela se aproximou e pegou as minhas mãos para juntar com as dela.

— Eu entendo, eu só não estava preparado. Eu achava que a gente ia morrer junto. - Agora quem soluçava era eu.

— Eu também achava, Frankie. Mas nós nunca vamos ficar distantes um do outro. Nunca, eu prometo! - Ela me abraçou e eu chorei por tanto tempo que, quando percebi, já era de noite.

As crianças estavam na casa de amigos e Jamia foi buscá-los. Pedi para ela que não contasse nada para eles ainda. Eu fui para o porão ficar sozinho e digerir tudo que havia acontecido. Eu repassava cada palavra de Jamia na minha cabeça e sempre chorava com a lembrança. Escrevi muito para tirar todo aquele sentimento de dentro de mim, mas parecia que nada era suficiente, a dor não passava. Virei a noite tentando escrever qualquer coisa que fosse, testando riffs, tirando guitarras antigas de caixas para manter a cabeça ocupada com algo que não fosse a lembrança de Jamia falando que queria a separação.

Quando dei por mim, já estava amanhecendo. Aproveitei para ir até a minha cafeteria favorita pegar o meu café preferido. Quando voltei, as crianças estavam colocando a mesa do café da manhã. Sentei e lembrei que não seria bom chorar na frente deles. Então juntei todas as minhas forças para isso. Enquanto as crianças falavam com Jamia, eu me dei conta de que aquela era uma das últimas vezes que eu veria aquela cena e que eu teria aquele café em família. Eu amava os nossos cafés em família e aquilo seria tirado de mim. Droga, eu ia chorar de novo. Levantei, fui até o banheiro lavar o rosto. Respirei fundo 10 vezes. O choro voltou. Chorei por 5 minutos. Lavei o rosto. Respirei fundo. Eu precisava, pelo menos, aproveitar os últimos momentos em família e eu estava dentro do banheiro chorando escondido. Que covarde! Lavei o rosto mais uma vez. Respirei fundo mais uma vez. Saí do banheiro. Olhei para a mesa, meus olhos cheios de lágrimas novamente. Subi direto para o quarto.

— Tá tudo bem? - Disse Jamia quando entrou no quarto.

— Tirando a parte que a minha esposa quer o divórcio depois de 11 anos de casamento, tá tudo bem sim. - Eu disse olhando pro chão enquanto engolia o choro.

— Frank, nós já conversamos... - Ela sentou do meu lado na cama e passava a mão nas minhas costas.

— Eu sei, Jam. Mas eu não sei lidar com isso. Não sei lidar com as crianças. Só de saber que nós não vamos mais tomar café da manhã juntos todos os dias, eu já quero deitar em posição fetal e chorar o resto do dia.

— Eu entendo, Frank. Mas eu também tô mal! Você acha que eu queria isso? Que eu estou feliz? Eu estou tão triste quanto você. E lidar com as crianças sozinha tá sendo muito doloroso pra mim também. - Ela parecia um pouco irritada.

— Mas você teve tempo para pensar nisso, tomar essa decisão, digerir tudo isso dentro de você, eu fui pego de surpresa. - Eu realmente não tinha controle algum sobre as lágrimas que rolavam no meu rosto,

— Eu sei que isso foi um pouco injusto contigo, mas eu também não sabia como falar. Não tinha como eu chegar em você e falar "daqui duas semanas eu vou pedir o divórcio, vai se preparando" - Ela continuava o carinho em minhas costas.

— Me dá um dia? Eu vou tentar dormir, sei lá. - Eu pedi olhando em seus olhos.

— Tá bem, mas amanhã você faz as panquecas do café. - Ele disse com um leve sorriso nos lábios.

— Combinado. - Eu devolvi o sorriso, deitei e chorei até dormir.

Broken Clock [FRERARD]Where stories live. Discover now