Capítulo 05 - Lately you've been on my mind

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Naquele primeira noite com O Peixe, O Garoto Peculiar foi comprar comida de peixe na mercearia ali perto. Ele chegou com um sorriso tão resplandecente na mercearia por estar tão feliz por finalmente não estar mais sozinho que o vendedor se assustou e acabou dando de graça todas as comidas que O Garoto escolheu. Ele só queria que ele fosse embora logo antes que o cegasse com tanta luz.  Quando O Garoto voltou para casa, reparou que nem tinha usado o capacete e percebeu que não queria mais usá-lo, pois sentia vontade que todos vissem o quanto O Peixe o fazia feliz, o fazia se sentir livre.

Enfim, quando chegou em casa, O Peixe estava assistindo atentamente ao noticiário que falava sobre a migração de cardumes de peixes da Ilha dos Sonhos para Eroda e dava para perceber o olhar tristonho do Peixe ao assisti aquela notícia.

— Eles não sabem do que vão ter que abrir mão, não é, Louis? — Comentou O Garoto — Eu nasci aqui, mas quando estava dentro da barriga da minha mãe, ela morava na Ilha dos Sonhos. Acho que todos em algum momento já tiveram lá. Acontece que minha mãe se mudou para cá antes que eu nacesse, pois o sonho dela era exatamente que eu ficasse bem, feliz e realizasse os meus próprios sonhos. Então, como ela queria realizar esse sonho dela, se mudou para cá, mas para que tudo fosse do jeito que ela sonhava, por alguma razão ela teve que abrir mão de mim. 

O Peixe assistia atentamente O Garoto contar toda aquela história ao mesmo tempo que ele o alimentava. Em algum momento, O Garoto até provou a comida do Peixe, mas achou terrível, fazendo O Peixe se encolher como se tivesse rindo dele. 

— Você tem vontade de ir para a Ilha da Liberdade, Louis? — Perguntou O Garoto, assistindo O Peixe arregalar os olhos como se tivesse medo de falar sobre aquilo — Eu sei, eu também tenho medo. Todos dizem que se você sair de Eroda para lá, você vai ser esquecido por todos. Eu não quero ser esquecido. Eu queria que existisse um lugar em que pudéssemos realizar nossos sonhos sem perder a liberdade de sermos quem somos, mas acho que esse lugar não existe.

O Peixe desceu até o fundo do jarro, como se sentisse tristeza por concordar com aquilo que O Garoto estava dizendo. Ele também não acreditava que aquele lugar existisse. 

— Pelo menos agora temos um ao outro. Podemos ser livres enquanto estivermos um com o outro e sobreviver a seja lá o que exigirem da gente lá fora. — Afirmou O Garoto, dando mais comida para O Peixe, fazendo ele voltar a nadar feliz com o sorriso que ele direcionou para ele, fazendo O Peixe sentir todo aquele amor e cumplicidade que estava nascendo entre eles. Nenhum dos dois nunca sentiu aquilo. Definitivamente era especial.

Assim, naquela noite O Garoto dormiu depois de horas apenas admirando seu parceiro ali, sendo ele mesmo naquela água, nadando para lá e para cá sem se preocupar com nada, assim como ele mais cedo não tinha se preocupado se estava com o capacete ou não. Nenhuma máscara existia entre eles, suas luzes não os assustavam, ao contrário, era como se pela primeira vez a vontade de brilhar mais forte nacesse dentro deles, já que havia amor ali, alimentando aquela segurança deles de serem quem eles são. Alguém amava eles daquele jeito e isso os fazia acreditar que podiam amar a eles mesmo também.

Mas algo que nem O Peixe e nem O Garoto sabiam era que ele poderia crescer do dia para noite. Era algo que todos ao redor do Peixe sabiam e escondiam dele. Eles sabiam o quanto O Peixe era destinado a crescer ao se sentir capaz e amado e essa era também uma das razões para eles o machucarem. A grandeza dele os assustava e ao mesmo tempo os deixava com inveja.

Mas óbvio que aquilo não incomodava O Garoto. Ele amava O Peixe do jeito que ele era e o quanto maior ele fosse, mais brilho emanava dele, mais livre de suas próprias amarras ele parecia e cada vez menores ficavam suas cicatrizes. Porém, o problema que assustou O Garoto foi que O Peixe não estava mais cabendo naquela jarra minúscula. Ele não ia sobreviver por muito tempo daquela forma. Então, O Garoto se levantou rapidamente e saiu correndo de casa, de pijama, pés descalços e com a jarra com O Peixe empacado na mão. 

— Aguente firme, Louis. Vamos achar um lugar que faça jus a sua grandeza. — Dizia O Garoto, correndo feito um louco, olhando para todos os lados, procurando por uma solução até que avistou o mesmo garoto que tinha dado o livro para ele, andando de bicicleta com sua característica mochila transparente — Hey, você! — Gritou, fazendo o menino frear a bicicleta, assustado. 

— Quem é você? 

Primeiro a pergunta deixou O Garoto confuso, mas depois ele logo lembrou que quando falou com aquele menino pela primeira vez, estava usando seu capacete, aquele que ele havia abandonado desde que conheceu O Peixe. 

— Eu não estou mais usando o capacete de mergulho. 

— Ah, você é O Garoto do livro. 

— Sim! E eu preciso da sua mochila ou o Louis vai morrer. — Praticamente implorou, deixando escapar dos seus olhos verdes algo que ele nunca tinha visto, parecia chuva, mas era salgado. "Será que chuva é salgada?", pensou O Garoto. 

O menino em sua frente também não sabia o que era aquela água toda saindo dos olhos do Garoto em sua frente e por isso se assustou e se apressou a esvaziar a mochila e dá para O Garoto. Depois, os dois caminharam até uma torneira que tinha ali perto, colocaram a quantidade perfeita de água dentro da mochila e depois colocaram O Peixe nela que aliviado, se rebateu todo dentro da água, como um cachorro que volta da água e se balança todo para secar os pelos. O Garoto e o menino riram juntos daquilo. O menino até se assustou um pouco com a própria risada. Sua mãe o condenaria por aquele "ato tão exagerado", como ela possivelmente ia chamar. 

— Obrigado. Eu não tenho nada para te dá em troca. — Informou O Garoto, enxugando aquela água estranha dos seus olhos, mas que ele descobriu ser aliviante. Ele se sentia até mais leve. 

— Tudo bem. Pelo menos você parou de vazar aquele líquido estranho dos seus olhos. 

— Isso nunca aconteceu com você?

— Acho que não aconteceu com ninguém aqui em Eroda. A gente sempre tem que está fazendo aquilo com os dentes e só. 

— Você diz, isso? — sorriu O Garoto, fazendo o menino fechar os olhos por causa da luz — Desculpa. 

— Era por isso que você usava o capacete? Isso dói nos olhos. Por que parou de usar?

— É que Louis gosta do meu sorriso. — Confessou, apontando para O Peixe que estava batendo as nadadeiras como uma foca, feliz por aquele sorriso, mostrando que O Garoto estava certo, ele gosta mesmo. 

— Vocês são estranhos. O que mantém vocês aqui?

— Creio que a minha voz e o brilho dele. Mas o que mantém a gente junto é algo bem mais especial e complexo. 

— O que?

— A gente ama a "estranheza" um do outro. — Revelou, pondo a mochila com O Peixe nas costas e saindo dali de volta para casa, agora caminhando calmamente, O Garoto sorrindo e O Peixe reluzindo suas escamas douradas, iluminando o caminho, como se fossem o Sol daquela ilha sempre nebulosa. 

 

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